Acórdão Nº 5000978-74.2023.8.24.0022 do Terceira Câmara Criminal, 04-04-2023

Número do processo5000978-74.2023.8.24.0022
Data04 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 5000978-74.2023.8.24.0022/SC



RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA


RECORRENTE: EVERSON RIBEIRO CAMARGO (RECORRENTE) ADVOGADO(A): LUDMILA GRADICI CARVALHO DRUMOND (DPE) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)


RELATÓRIO


Na Comarca de Curitibanos, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Everson Ribeiro Camargo, com 21 (vinte e um) anos de idade, pela suposta prática da conduta criminosa disposta no art. 121, § 2º, IV, c/c art. 14, II, do Código Penal, e de Henrique Junio Lisboa Rocha, com 20 (vinte) anos, como incurso, em tese, nas sanções do art. 348, caput, do Código Penal, diante dos fatos assim narrados (evento 41):
[...] No dia 31 de outubro de 2017, por volta das 10h00min, na Rua Walter Schmidt, n. 106, bairro São Luiz, nesta urbe, mais precisamente na "Borracharia Três Irmãos", situada nos fundos do Posto Tomazzoni, o denunciado EVERSON RIBEIRO CAMARGO, imbuído de evidente animus necandi, tentou matar a vítima José Augusto Souza Ribeiro.
Para tanto, o denunciado EVERSON RIBEIRO CAMARGO, munido com um revólver calibre .32, chegou ao local, aproximou-se da vítima e, de inopino, efetuou 03 (três) disparos de arma de fogo em sua direção, não logrando êxito em seu intento homicida por circunstâncias alheias à sua vontade, notadamente em razão de sua má pontaria.
Após os disparos da arma de fogo efetuados em desfavor da vítima, o denunciado EVERSON RIBEIRO CAMARGO correu fugido do local, ingressando no veículo VW/Gol, placas MIR-0932, conduzido pelo denunciado HENRIQUE JUNIO LISBOA ROCHA que estava em espera estacionado na frente do estabelecimento Armazém Construções, na Rua Walter Schmidt, evadindo-se do local em disparada.
Desta forma, o denunciado HENRIQUE JUNIO LISBOA ROCHA auxiliou o comparsa EVERSON RIBEIRO CAMARGO a subtrair-se da ação da Autoridade Policial, evitando que o autor dos disparos fosse contido e preso em flagrante delito.
O denunciado EVERSON RIBEIRO CAMARGO praticou o crime de tentativa de homicídio mediante recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido José Augusto Souza Ribeiro, na medida em que chegou ao local, sacou a arma de fogo e, de inopino, efetuou os disparos estando a vítima deitada em um banco na frente da "Borracharia Três Irmãos", não tendo, a vítima, tempo suficiente de esboçar reação de defesa ou repelir a injusta agressão.
Sobreveio decisão em que a peça acusatória foi parcialmente admitida, em cuja parte dispositiva assim constou (evento 194):
1) julgo admissível a denúncia para o fim de pronunciar o acusado Everson Ribeiro Camargo, já qualificado nos autos, como incurso na sanção do art. 121, § 2.º, IV (recurso que dificultou a defesa da vítima), c/c artigo 14, inciso II, do Código Penal;
Considerando que o acusado Everson respondeu o processo solto e que até aqui a instrução correu dentro da normalidade, concedo ao denunciado o direito de recorrer em liberdade [...]
2) julgo extinta a punibilidade do acusado Henrique Junio Lisboa Rocha, já qualificado nos autos, em relação ao crime previsto no artigo 348, do Código Penal, considerando a prescrição da pretensão punitiva em abstrata do delito, nos termos dos arts. 109, VI e 107, IV, ambos do Código Penal.
A defesa de Everson Ribeiro Camargo interpôs recurso em sentido estrito, em que pugnou pela impronúncia, nos termos do art. 414 do Código de Processo Penal. De forma subsidiária, requereu o decote da qualificadora do emprego de recurso que dificultou a defesa do ofendido (evento 217).
Henrique Junio Lisboa Rocha, ao ser intimado, manifestou desejo em recorrer (evento 212).
Em juízo de retratação, a decisão foi mantida (evento 223).
Contrarrazões no evento 221.
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Kátia Helena Scheidt Dal Pizzol, em que opinou pela conversão do feito em diligência para intimar Henrique Junio Lisboa Rocha para constituir novo defensor e, em caso de inércia, para determinar a remessa dos autos à Defensoria Pública para oferecimento das razões recursais (evento 10)

VOTO


O recurso de Everson Ribeiro Camargo preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.
Quanto à Henrique Junio Lisboa Rocha, embora tenha manifestado desejo em recorrer ao ser intimado, vislumbra-se que se declarou a extinção da punibilidade acerca da prática do crime previsto no art. 348, caput, do Código Penal, o que, por se equiparar a absolvição, afasta o interesse recursal em manejar recurso de apelação e torna desnecessária a sua intimação para constituir defensor a fim de que apresente as respectivas razões recursais.
A defesa de Everson Ribeiro Camargo pugnou pela impronúncia, nos termos do art. 414 do Código de Processo Penal e, de forma subsidiária, requereu o decote da qualificadora do emprego de recurso que dificultou a defesa do ofendido, nos termos do art. 121, § 2º, IV, do Código Penal.
No entanto sem razão.
Inicialmente, cumpre ressaltar que a decisão de pronúncia se traduz em um mero juízo de admissibilidade da peça acusatória, por meio do qual se restringe a analisar provas da materialidade e presença de indícios suficientes de autoria, a fim de remeter o processo a julgamento pelo Tribunal do Júri (CPP, art. 413). Logo, dispensa-se a cognição exauriente de todos os elementos de prova, encargo que incumbe ao Conselho de Sentença.
Nesse sentido, Renato Brasileiro de Lima (Manual de Processo Penal, 8ª ed., Salvador: Ed. Juspodivm, 2020, p. 1468) discorre que:
[...] a pronúncia encerra um juízo de admissibilidade da acusação de crime doloso contra a vida, permitindo o julgamento pelo Tribunal do Júri apenas quando houver alguma viabilidade de haver a condenação do acusado. Sobre ela, o art. 413 do CPP, dispõe que, estando convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve o juiz sumariante pronunciar o acusado fundamentadamente. Há um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o jus accusationis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni juris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência [...].
No entanto, caso os elementos colhidos nos autos não sejam suficientes a demonstrar a materialidade e a presença de elementos mínimos de autoria ou de participação, o agente deve ser impronunciado (CPP, art. 415), sem prejuízo de ser novamente denunciado se sobrevierem novas provas. Por outro lado, caso os elementos colhidos permitam a conclusão exauriente no sentido da inocorrência dos fatos, negativa de autoria, o fato não constituir infração penal ou que restou comprovada uma das causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade (CPP, art. 414), o agente deve ser absolvido sumariamente.
Por fim, caso se entenda pela ausência de elementos suficientes da materialidade e autoria do crime doloso contra a vida, proceder-se-á a declaração da incompetência do juízo (CPP, art. 419).
Pelo que se infere dos autos, no dia 31 de outubro de 2017, na rua Walter Schmidt, 106, bairro São Luiz, na cidade de Curitibanos, por volta das 10h, nas dependências da Borracharia Três Irmãos, localizada nos fundos do Posto Tomazzoni, o recorrente teria tentado ceifar a vida de José Augusto Souza Ribeiro, de inopino, inviabilizando, em tese, a possibilidade de defesa, mediante 3 (três) disparos de revólver calibre .32, os quais somente não acarretaram na morte em virtude de erro na execução.
A materialidade delitiva emerge do Auto de Prisão em Flagrante (fl. 4 do evento 1), Boletim de Ocorrência (fls. 5-6 do evento 1), Informação Policial (fls. 27-28 do evento 1), Relatório de Informação (fls. 51-58 do evento 1), Termo de Reconhecimento Fotográfico (fl. 134 do evento 11 e fl. 192 do evento 36), Termo de Exibição e Apreensão (fl. 139 do evento 11), Laudos Periciais (eventos 29 e 129) e depoimentos colhidos em ambas as fases da persecução penal.
Os indicativos de autoria também foram evidenciados.
O recorrente, na fase indiciária, conforme resumido na decisão de pronúncia (evento 194), narrou que:
"Delegada: o que aconteceu hoje? Quando a PM chegou você estava aonde? Réu: eu estava deitado em casa. Delegada: que horas que você chegou em casa? Réu: ah, foi umas dez e pouco. Delegada: estava aonde antes? Réu: estava la no bar com o pai. Delegada: que horas você chegou lá no bar? Réu: já era umas nove e pouquinho, por ai. Delegada: foi umas nove e pouco da manhã... Réu: não, não hoje. Delegada: de ontem? Réu: sim. Delegada: de ontem à noite? Réu: sim. Delegada: o seu pai esta trabalhando em um bar, e isso? E você foi ajudar o seu pai? Réu: e, ajudar. Delegada: e isso você foi umas nove e pouco ontem lá no bar? E que horas você voltou pra casa? Réu: umas dez e pouco, a hora que eles fecharam. Delegada: ai você foi pra casa? Réu: sim, daí eu dormi. Delegada: e hoje de manhã, você saiu? Réu: não. Eu estava dormindo ainda. Delegada: você estava dormindo quando a PM chegou? Réu: sim. Delegada: e dai te trouxeram pra delegacia? Réu: trouxeram. Delegada: você não saiu antes de manha? Réu: não. Delegada: você não saiu com um gol branco? Réu: não. Delegada: quem você conhece que tem um gol branco? Réu: pior que isso eu não sei. Delegada: e os teus irmãos ? Réu: também não sei, porque eles estão morando pra cá, dai eu não vim mais ali. Eu briguei com o meu cunhado, dai não apareci mais. Delegada: e você conhece o Jose Augusto Souza Ribeiro? O Guga que você falou, você o conhece? Réu: conheço, mas de vista, né? Delegada: há quantos anos você o conhece? Réu: não conheço muito ele, só porque uma vez ele apareceu querendo comprar uma bateria, daí eu falei que ia arrumar pra ele, dai ele me arrumou um dinheiro, e não consegui arrumar, aí...

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