Acórdão Nº 5001002-93.2023.8.24.0025 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 07-03-2024

Número do processo5001002-93.2023.8.24.0025
Data07 Março 2024
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001002-93.2023.8.24.0025/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: LUBIANE DA COSTA FERREIRA CAPISTRANO (AUTOR) APELADO: BANCO J. SAFRA S.A (RÉU)


RELATÓRIO



1.1) Da inicial.
LUBIANE DA COSTA FERREIRA CAPISTRANO ajuizou Ação de Revisão de Contrato em face do BANCO J. SAFRA S.A, alegando em síntese, que firmou contrato de financiamento do veículo Chevrolet Celta, placas HGI9B59, a ser pago em 48 parcelas mensais de R$ 809,52.
Aduziu a ocorrência de onerosidade excessiva da obrigação, pois as cobranças ilegais e abusivas tornaram as prestações incertas e ilíquidas, e portanto, inexigíveis.
Quanto ao mérito, pugnou pela: I) limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN à época da contratação; II) afastar as tarifas administrativas; III) determinar a repetição de indébito dos valores pagos indevidamente, em dobro, determinando a compensação dos créditos/débitos.
Ao final, pugnou pela condenação do requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios e a concessão da Justiça Gratuita.
Atribuiu valor à causa e juntou documentos (evento 1, docs. 2/6).
1.2) Da contestação.
Devidamente citado, o requerido apresentou resposta, em forma de contestação, sustentando, preliminarmente, a inépcia da inicial, a impugnação à justiça gratuita, a retificação do polo passivo, a impossibilidade da inversão do ônus da prova.
No mérito, a licitude do contrato, a legalidade dos juros e das demais tarifas pactuadas. Pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais, com a condenação da autora nas verbas sucumbenciais.
1.3) Do encadernamento processual.
Em decisão do evento 9, foi deferido o pedido de concessão de Justiça Gratuita.
Impugnação à contestação ofertada (evento 22).
1.4) Da sentença.
Prestando a tutela jurisdicional, o Dr. ROMANO JOSE ENZWEILER prolatou sentença resolutiva de mérito para julgar:
Isso posto, com resolução do mérito, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos desta ação n. 50010029320238240025, ajuizado por LUBIANE DA COSTA FERREIRA CAPISTRANO contra BANCO SAFRA S.A.
CONDENO a parte autora ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios a serem pagos aos advogados da parte ré, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, não podendo ser inferior a R$ 3.000,00 (art. 86 do CPC). Suspensa por ter sido deferida justiça gratuita à parte autora.
Promova-se a retirada do polo passivo do Banco J. Safra e a inclusão do Banco Safra S.A., devendo haver a alteração no Eproc pelo cartório.
1.5) Do recurso.
Inconformado com a prestação jurisdicional, a parte autora interpôs o presente recurso de Apelação Cível, aduzindo a ilegalidade da cobrança do seguro, tarifa de registro e avaliação, bem como, da tarifa de cadastro, requerendo a restituição em dobro. Aduziu sobre a inaplicabilidade do pacta sunt servanda,
Ao final, pugna pelo provimento do recurso e pela inversão da sucumbência.
1.6) Das contrarrazões
Contrarrazões aportadas (evento 36).
Este é o relatório

VOTO



2.1) Do objeto recursal.
Compulsando os anseios recursais, observa-se que o cerne da celeuma em comento está atrelado à análise das tarifas administrativas, repetição em dobro e sucumbência.
2.2) Do juízo de admissibilidade.
Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, dispensaddo o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.
2.3) Do mérito
2.3.1) O pacta sunt servanda.
A tese defendida pela parte apelante se esteia no fato da inaplicabilidade do pacta sunt servanda aos contratos de adesão.
Entendido como aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor, fica valendo aqui a regra prevista no art. 6º, V, do CDC que prevê como direito básico do consumidor "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas".
Comentando a proteção contratual do CDC, Nelson Nery Júnior aponta:
No que respeita aos aspectos contratuais da proteção do consumidor, o CDC rompe com a tradição do Direito Privado, cujas bases estão assentadas no liberalismo que reinava na época das grandes codificações européias do século XIX, para: a) relativizar o princípio da intangibilidade do conteúdo do contrato, alterando sobremodo a regra milenar expressa pelo brocardo pacta sunt servanda, e enfatizar o princípio da conservação do contrato (art. 6º, n. V). (GRINOVER, Ada Pellegrini, et al. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 444).
Entendido que o "pacta sunt servanda" não deve prevalecer em todas as situações indiscriminadamente e, no caso, tratando-se de relação de consumo, possível a análise das cláusulas contratuais, revisando-se-as no que forem abusivas, tornando dispensável a discussão sobre sua natureza adesiva ou não.
Em razão disso, a revisão contratual se presta com fulcro nos princípios expostos nos art. 6º, V, do CDC e arts. 421 e 422 do Código Civil, posto que o contrato deve pautar-se de acordo com a boa-fé, probidade e atendendo sua função social, visando o relativo equilíbrio das prestações durante a execução e sua conclusão.
A respeito, já decidiu esta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE E DEMAIS OPERAÇÕES ATRELADAS - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - RECURSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO CONTRATUAL - POSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO "PACTA SUNT SERVANDA" - INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À BOA-FÉ OBJETIVA - INSURGÊNCIA INACOLHIDA NESTE ASPECTO. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." (Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça). Estando a relação negocial salvaguardada pelos ditames desta norma, mitiga-se a aplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda, viabilizando a revisão dos termos pactuados, uma vez que a alteração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT