Acórdão Nº 5001044-09.2021.8.24.0092 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 26-07-2022

Número do processo5001044-09.2021.8.24.0092
Data26 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001044-09.2021.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador TULIO PINHEIRO

APELANTE: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU) APELADO: THALITA NUNES GOMERCINDO (AUTOR)

RELATÓRIO

No Juízo da 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis, THALITA NUNES GOMERCINDO ajuizou ação revisional em desfavor de AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., objetivando a revisão do "contrato de crédito direto ao consumidor (CDC) - veículos" registrado sob o n. 370536436 (evento 1).

Recebida a inicial, Sua Excelência deferiu o benefício da justiça gratuita (evento 15) e determinou a citação do réu.

Sobreveio contestação (evento 22).

Houve réplica (evento 27).

Após, a MM.ª Juíza Ana Luisa Schmidt Ramos sentenciou o feito, de modo a julgar parcialmente procedente a demanda (evento 29), o que fez nos seguintes termos:

(...) ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:

a) limitar os juros remuneratórios às taxas médias de mercado divulgadas pelo Banco Central do Brasil para o contrato revisado, nos termos da fundamentação;

b) afastar a cobrança da tarifa de avaliação do bem e de registro de contrato;

c) determinar a repetição simples de eventual indébito ou compensação pela instituição financeira, desde que verificado pagamento a maior, a ser apurado por simples cálculo aritmético, corrigidos pelo índice da CGJ e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data da citação.

Diante da sucumbência mínima, condeno a parte ré ao pagamento integral das custas e dos honorários, estes fixados em R$ 4.0000 (art. 86, par. ún., do CPC). (...) (destaques do original).

Irresignada, a financeira ré apelou. Nas razões do seu recurso, sustentou, de início, a impossibilidade de revisão contratual. No mais, postulou a manutenção dos juros remuneratórios e dos encargos moratórios pactuados. Além disso, alegou a legalidade das tarifas de cadastro e de avaliação de bem. Por fim, sustentou a impropriedade da condenação à repetição do indébito e a possibilidade de compensação dos valores devidos, além de postular a redução do montante arbitrado a título de honorários advocatícios, assim como a modificação da distribuição dos ônus sucumbenciais (evento 38).

Com as contrarrazões (evento 45), subiram os autos a esta Corte.

VOTO

O recurso, adianta-se, será examinado por tópicos.

Do exame de admissibilidade.

De início, não se conhece do recurso quanto ao pleito de mantença do encargos moratórios ajustados (multa de 2% e juros de mora de 1% a.m), na medida que não houve pedido para exclusão dos referidos encargos na petição inicial e a sentença não afastou a incidência dos referidos encargos no contrato em debate, de sorte que ausente o interesse recursal do banco no ponto.

Passa-se, então, à análise do reclamo quanto aos seus demais pontos.

Da revisão das cláusulas contratuais.

Alega o banco apelante a impossibilidade de revisão do contrato pois a "Referida contratação entabulada, foi lícita e isenta de vícios, onde o Banco Réu disponibilizou o crédito à parte autora e este se comprometeu a pagar", bem como porque "o crédito fora liberado de acordo com o interesse único e exclusivo da parte autora, nas condições por ela indicadas, pois quando firmou tal pacto, ficou ciente da cobrança de todos os encargos previstos no mesmo" ofendendo o princípio da pacta sunt servanda e o art. 46 do CDC, razão por que, não identificado defeito no negócio jurídico, deve ser conservado.

Entretanto, em que pesem os argumentos despendidos pela casa bancária, não proceder à análise revisional significa afastar da apreciação do Poder Judiciário o exame da abusividades praticadas em desfavor do consumidor, implicando não só a violação aos direitos fundamentais de acesso à justiça (art. 5º, inc. XXXV, CF), como também à proteção ao consumidor (art. 5º, XXXII, CF).

Ademais, cumpre recordar que o advento do Código de Defesa do Consumidor, promulgado com espeque no art. 5º, inc. XXXII, da Constituição Federal, inseriu no ordenamento exceções ao princípio do pacta sunt servanda no intuito de oportunizar o reequilíbrio contratual entre consumidor e fornecedor.

Neste trilhar, preconiza o art. 6º, inc. V, do mencionado estatuto:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

A aplicação do dispositivo supra afasta a aplicação geral do art. 46 da norma consumerista.

No caso, cediço que os contratos bancários são tipicamente de adesão, sendo o consumidor obrigado a pactuar nos termos preestabelecidos pela instituição financeira se quiser usufruir dos serviços bancários. Bem por isso, referendou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a tese de que a intangibilidade contratual deve ser mitigada em cotejo aos princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do dirigismo contratual, inclusive para as avenças bancárias (Confira-se: AgRg no AREsp 32.884, rel. Min. Raul Araújo).

Neste quadro, todo e qualquer contrato caracterizado pela relação de consumo pode ser modificado pelo juiz, desde que as cláusulas avençadas estejam em confronto com as normas protetivas arroladas no Estatuto Consumerista.

Por oportuno, frisa-se que não há violação a direito adquirido ou ato jurídico perfeito perante a revisão de cláusulas abusivas ou ilegais, pois, "conforme a norma do art. 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor e a teoria moderna, devem ser relativizados para possibilitar a alteração ou declaração de nulidade das cláusulas contratuais abusivas ou ilegais que submetam alguma das partes ou que tenham sido impostas ao livre arbítrio do hipersuficiente sem a manifestação de vontade do adverso." (Apelação Cível n. 2010.012256-5, rel. Des. José Carlos Carstens Köhler).

Portanto, não há qualquer óbice à revisão judicial ora pleiteada.

Dos juros remuneratórios.

Assevera a parte apelante que não há limitação legal à convenção dos juros remuneratórios, de sorte que devem ser mantidos tais como ajustados.

Com efeito, a jurisprudência vem admitindo variação acima da taxa média de...

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