Acórdão Nº 5001077-53.2020.8.24.0053 do Quinta Câmara Criminal, 18-03-2021

Número do processo5001077-53.2020.8.24.0053
Data18 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5001077-53.2020.8.24.0053/SC



RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER


APELANTE: CLEITON DE LIMA QUADRA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofertou denúncia em face de Eduardo Ferreira e Cleiton de Lima Quadra, imputando-lhes a prática do crime previsto no art. 147 do Código Penal (Fato 1) e no art. 16, § 1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/2003 (Fato 2), conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (evento 1 da ação penal):
Fato 1 - Art. 147 do Código Penal
Na madrugada do dia 14 de agosto de 2020, por volta das 00h16min, no estabelecimento denominado "Boate Sedução", situado às margensda Rodovia SC-157, próximo à entrada do Bairro Santa Inês, no município de Quilombo-SC, os denunciados EDUARDO FERREIRA e CLEITON DE LIMA QUADRA, atuando em nítida comunhão de esforços e vontades, sob inegável elo subjetivo e conversão para a mesma diretiva, projetando-se a conduta de ambos para idêntico fim e no mesmo contexto, agindo em flagrante demonstração de ofensa à liberdade individual, ameaçaram as vítimas Júnior de Sousa, Loraine Cristina de Freitas Ribeiro, Natacha de Jesus Oliveira e Maiara Aparecida Oliveira, de lhes causar mal injusto e grave, dizendo que "ateariam fogo na boate e matariam a todos", "a polícia podia levá-los, mas que no dia seguinte o dinheiro da fiança iria estar na conta, e iriam matar a todos", "quando saíssem da cadeia fariam com que (as vítimas) pagassem por tudo o que estava passando", e , ainda, por meio de gestos, uma vez que EDUARDO FERREIRA mostrou munições de arma de fogo às vítimas, afirmando que "veio fazer o trabalho completo".
Fato 2 - Art. 16, § 1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/2003
Nas mesmas condições de tempo e local, os denunciados EDUARDO FERREIRA e CLEITON DE LIMA QUADRA, atuando em nítida comunhão de esforços e vontades, sob inegável elo subjetivo e conversão para a mesma diretiva, projetando-se a conduta de ambos para idêntico fim e no mesmo contexto, agindo em flagrante demonstração de ofensa à incolumidade e segurança alheia, traziam consigo, portavam, transportavam, guardavam, mantinham sob sua posse e detenção, buscaram ocultar e ocultaram nas adjacências internas e externas do estabelecimento supramencionado, uma arma de fogo com o número de série suprimido, consistente em "rifle, de marca CBC, calibre nominal .22, cano forjado em aço, medindo 310,00mm, de alma lisa, com coronha reta, de madeira lisa, telha de madeira e soleira de polímetro, com acabamento niquelado", além de "dezesseis cartuchos intactos, marca CBC, calibre .22, com espoleta circular" (Laudo Pericial constante no evento 34, p. 5-8, do Inquérito Policial), das quais 14 (catorze) munições se encontravam próximo à arma de fogo no interior do estabelecimento e 2 (duas) munições no interior do veículo VW Gol, placa BNX-1149, de Dois Vizinhos-PR, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Por fim, os policiais militares conduziram os denunciados EDUARDO FERREIRA e CLEITON DE LIMA QUADRA à repartição policial em situação de flagrante delito para as providências de estilo.
A denúncia foi recebida (evento 5 da ação penal), os réus foram citados (eventos 32 e 33 da ação penal) e apresentaram defesa (eventos 17 e 39 da ação penal).
A defesa foi recebida e, não sendo o caso de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução e julgamento (evento 42 da ação penal).
Na instrução foram inquiridas as testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, bem como os réus foram interrogados (evento 104 da ação penal).
Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais (eventos 112, 122 e 124 da ação penal), sobreveio a sentença (evento 126 da ação penal) com o seguinte dispositivo:
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados na denúncia e, em consequência:
a) CONDENO o acusado EDUARDO FERREIRA, qualificado nos autos, incurso no artigo artigo 147 do Código Penal (em concurso formal - 4 vezes) e no artigo 16, § 1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/03, na forma do artigo 69 do Código Penal, a cumprir a pena de 3 (três) anos de reclusão, e 1 (um) mês e 15 (quinze) dias de detenção, inciando-se pela de reclusão (art. 76 do CP), em regime inicial aberto, e a pagar e 11 (onze) dias-multa, cada qual no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente na data do fato;
b) CONDENO o acusado CLEITON DE LIMA QUADRA, qualificado nos autos, incurso no artigo artigo 147 do Código Penal (em concurso formal - 4 vezes) e no artigo 16, § 1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/03, na forma do artigo 69 do Código Penal, a cumprir a pena de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, e 2 (dois) meses e 9 (nove) dias de detenção, inciando-se pela de reclusão (art. 76 do CP), em regime inicial fechado, e a pagar e 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente na data do fato.
Inconformado o réu Cleiton interpôs recurso de apelação (evento 137 da ação penal). Em suas razões alega que a prova colhida não é segura para amparar um decreto condenatório, não se demonstrando, a autoria dos crimes, devendo, pois, ser aplicado o consagrado princípio in dubio pro reo. Requer, ainda, a revogação da prisão preventiva e fixação de honorários ao seu defensor (evento 147 da ação penal).
Apresentadas as contrarrazões (evento 153 da ação penal), os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Carlos Henrique Fernandes, o qual se manifestou pelo não conhecimento do recurso, eis que não atendidos seus requisitos de admissibilidade. Caso conhecido, porém seja então improvido para a finalidade de manter-se a sentença penal condenatória (evento 19)

VOTO


Como sumariado, trata-se de recurso de apelação criminal interposto por Cleiton de Lima Quadra, o qual busca a reforma da sentença proferida pela MM. Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Quilombo que condenou-o a cumprir pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, e 2 (dois) meses e 9 (nove) dias de detenção, inciando-se pela de reclusão, em regime inicial fechado, e a pagar e 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor de um trigésimo do salário mínimo vigente na data do fato, por infração ao artigo 147 do Código Penal (em concurso formal - 4 vezes) e no artigo 16, § 1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/2003, na forma do artigo 69 do Código Penal.
Aduziu a defesa falta de comprovação de autoria, razão pela qual pugna pela absolvição, pois, deve ser aplicado o consagrado princípio in dubio pro reo (evento 147 da ação penal).
A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo não conhecimento do recurso, porque "[...] a maneira como arguida as tese de defesa fere o princípio da dialeticidade recursal, uma vez que não houve contraposição ao entendimento adotado pelo Juízo aquo na prolação da sentença penal condenatória, tratando-se as razões recursais de mera menção aos argumentos expedidos em alegações finais (evento 124), desprovida de qualquer incursão no posicionamento adotado pelo julgador no caso concreto. Ou seja, em nenhum trecho das razões recursais a defesa confrontou de fato os fundamentos apontados pelo Juízo aquo para a condenação do apelante" (evento 19).
O Código de Processo Penal, prevê em seu art. 599, que: "as apelações poderão ser interpostas quer em relação a todo o julgado, quer em relação a parte dele", ou seja, cabe a parte recorrente delimitar a matéria a ser objeto de reapreciação e de nova decisão pelo órgão jurisdicional competente.
Sobre o tema discorre Renato Brasileiro de Lima:
De fato, é possível que a parte esteja satisfeita com parte do julgado e não concorde com o restante. Daí a regra do tantum devolutum quantum appelatum, ou seja, a matéria a ser conhecida (devolutum) pelo Juízo ad quem dependerá da impugnação (appelatum).
Como se percebe, a regra do tantum devolutum quantum appellatum acaba por criar, no Juízo ad quem, verdadeiro obstáculo à sua pretensa liberdade de reexaminar a causa como se fosse o órgão de primeiro grau. O poder de reexame da instância superior fica restrito à parte da decisão impugnada pelo recorrente, evitando-se, assim, a prestação de atividade jurisdicional sem que tenha havido provocação das partes, em fiel observância à regra da inércia da jurisdição (ne procedat judex ex officio). (Manual de Processo Penal, vol. II - 2ª ed., Niterói, RJ: Impetus, 2012, pág. 902).
Neste norte, não basta que o apelante se mostre inconformado com a decisão de primeiro grau, é necessário que demonstre os pontos específicos da insurgência, contrapondo os fundamentos da sentença, sob pena de não conhecimento do recurso e manutenção da decisão recorrida.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico no sentido de que: "Embora o recurso de apelação devolva ao Juízo ad quem toda a matéria objeto de controvérsia, o seu efeito devolutivo encontra limites nas razões aventadas pelo recorrente, em homenagem ao princípio da dialeticidade, que rege os recursos no âmbito do Processo Penal, por meio do qual se permite o exercício do contraditório pela parte adversa, garantindo-se, assim, o respeito ao cânone do devido processo legal" (HC n. 185.775/RJ, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 1º/8/2013.
No entanto, também há precedente daquele Tribunal Superior no sentido de que a mera repetição das alegações finais não impede, por si só, o conhecimento do recurso:
HABEAS CORPUS. NULIDADE. CONDENAÇÃO. APELAÇÃO INTERPOSTA NÃO CONHECIDA. MERA REPETIÇÃO DAS ALEGAÇÕES FINAIS. ACÓRDÃO FUNDADO NA INOBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. VIOLAÇÃO AO PRIMADO DA EXIGÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ATO JUDICIAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. A teor do art. 93, IX, da Constituição...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT