Acórdão Nº 5001090-23.2022.8.24.0040 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 13-04-2023

Número do processo5001090-23.2022.8.24.0040
Data13 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001090-23.2022.8.24.0040/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: DENILDA LAGUNA DE SA FIRMINIO (AUTOR) ADVOGADO: LADEMIR CARLOS SALVADOR JUNIOR (OAB SC060048A) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: ANDRÉ LUIS SONNTAG (OAB SC017910)


RELATÓRIO


Denilda Laguna de Sá Firminio interpôs recurso de apelação cível da sentença do Evento 18 dos autos de origem, que proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Laguna, julgou improcedentes os pedidos formulados em ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Indenização por Danos Morais ajuizada pela ora apelante em face do Banco BMG S.A.
Cuida-se, na origem, de ação de restituição de valores c/c indenização por danos morais aforada em 2-3-2022 por Denilda Laguna de Sá Firminio, afirmando, a autora, ter procurado a instituição financeira demandada para a contratação de empréstimo consignado, oportunidade em que acabou sendo ludibriada, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, operação com natureza e sujeita a encargos diversos, e superiores, aos do empréstimo pretendido. Destacou que o desconto do valor emprestado em sua folha de pagamento, limitado a 5% de seu rendimento líquido, acaba por tornar o valor recebido impagável, na medida em que apenas da conta dos encargos incidentes, não representando efetiva amortização, fazendo com que o consumidor, a despeito dos pagamentos efetuados, permaneça eternamente devedor do saldo contratado. Alegou que, diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada, tendo em vista que apenas pretendia a contratação de empréstimo e não fornecimento de cartão. Asseverou a aplicação da legislação consumerista ao caso, entendendo pela necessidade de inversão do ônus probatório e apresentação do contrato pela parte adversa. Pugnou, assim, pelo cancelamento da operação com a suspensão dos descontos em sua folha de pagamento e a devolução da quantia que entende indevidamente cobrada. Suscitou, alternativamente, a conversão do crédito contrato em operação de empréstimo pessoal consignado, a ser regido pelas normas correlatas. Requereu, por fim, a condenação da parte demandada ao pagamento de danos morais decorrentes do abalo sofrido pelo autor em relação à suposta atitude fraudulenta e aos descontos irregulares perpetrados pela casa bancária.
Deferida a gratuidade da justiça requerida pela demandante (Evento 4 dos autos de origem).
Devidamente citado, o Banco BMG S/A apresentou contestação (Evento 11 - PET2 dos autos de origem), na qual defendeu, inicialmente, a incidência da prescrição e decadência, destacando, no mais, a regularidade da contratação realizada entre as partes. Afirmou, neste sentido, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo o demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável suficiente para a monta pretendida além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito, que não constitui venda casada, a única operação viável para a concessão do valor perseguido. Destacou que a operação de saque via cartão de crédito com margem consignável e o empréstimo pessoal consignado tratam-se de operaçãos distintas, com natureza e características diversas, sendo incabível, por isso, a conversão da operação em crédito pessoal consignado. Argumentou que, inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência da demanda. Juntou o contrato firmado com a parte autora, comprovante de disponibilização do valor sacado do cartão de crédito, bem como as faturas emitidas em relação ao referido cartão .
Réplica da autora, na qual, combatendo as alegações do banco demandado, reafirmou os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda (Evento 16 dos autos de origem).
Sobreveio sentença de mérito prolatada em 6-9-2022 pela magistrada da 1ª Vara Cível da Comarca de Laguna, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, o que se deu nos seguintes termos (Evento 18 dos autos de origem):
DENILDA LAGUNA DE SA FIRMINIO ingressou com Ação Declaratória c/c Indenização por Danos Morais e Obrigação de Fazer em face de BANCO BMG S.A, ambos devidamente qualificados nos autos em epígrafe.
Alegou, em síntese, que fora surpreendida com o desconto de "reserva de margem de cartão de crédito" em seu benefício previdenciário, sem sequer ter contratado a respectiva operação de crédito, não tendo, inclusive, jamais recebido ou utilizado qualquer cartão de crédito que autorizasse a reserva em seu benefício previdenciário.
Para tanto, ajuizou a presente demanda objetivando a declaração de inexistência da respectiva contratação, com a condenação da parte requerida à restituição, na forma dobrada, dos valores descontados a título de RMC de seu benefício previdenciário e, também, ao pagamento de indenização pelos danos morais que aduz ter sofrido. Alternativamente, pugnou pela conversão da modalidade da contratação para empréstimo consignado.
Requereu os benefícios da Justiça Gratuita, valorou a causa e juntou documentos (Evento 01).
Recebida a inicial, foi dispensada a realização de audiência de conciliação, determinada a citação da parte requerida e deferido à autora os benefícios da Justiça Gratuita (Evento 04).
Regularmente citada (Evento 09), a instituição financeira requerida apresentou contestação e documentos (Evento 11), na qual alegou, em preliminar, a ocorrência da prescrição e decadência. No mérito, sustentou a validade da contratação realizada entre as partes, tendo havido, inclusive, a utilização dos valores disponibilizados através da realização de saque pela parte autora. Ao final, pugnou pelo julgamento improcedentes dos pedidos deduzidos na peça inicial.
Houve réplica (Evento 16).
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
Decido.
Inicialmente, registro que por tratar-se de matéria puramente de direito, com fulcro no art. 355, I, do Código de Processo Civil, julgo o feito antecipadamente, razão pela qual dispenso a produção de outras provas.
Passo, assim, à análise das preliminares levantadas.
a) Da prescrição e decadência:
A parte ré sustenta a ocorrência da prescrição, sob o argumento de que já se esgotou o prazo de 03 (três) anos previsto pela legislação civil (art. 206, §3º, IV, do Código Civil) para o ajuizamento da presente demanda.
Razão não lhe assiste.
Com relação ao presente caso, é importante salientar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, haja vista tratar-se de uma nítida relação de consumo e, em razão da matéria, é de se esclarecer que aplica-se ao presente os termos dispostos no art. 27, da legislação supracitada, in verbis:
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
Ainda, mister se faz esclarecer que o prazo para início da contagem, haja vista tratar-se de relação jurídica versada em prestações continuadas, incide somente quando do pagamento da última prestação efetuada pelo consumidor, prazo esse que nem se encontra previsto contratualmente (Evento 11, Doc. 04).
Sublinha-se, também, que quando do ajuizamento da demanda, em 02/03/2022, a parte autora ainda sofria com os descontos em sua folha de pagamento, conforme documentação acostada junto ao Evento 01 (Doc. 07), de modo que a rejeição da prejudicial levantada é medida que se impõe.
Igualmente, também merece ser rejeita a alegação de que o direito da parte autora decaiu, com base no disposto no artigo 178, do Código Civil.
Sobre esse assunto, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina já dispôs que "o pleito almejado pela demandante não se trata de um direito potestativo, motivo pelo qual, ao caso, apenas é cabível a aplicação de prazo prescricional" (TJSC, Apelação n.º 5000363-04.2021.8.24.0039/SC. Relator: Des. Luiz Zanelato, j. 09/09/2021).
Ainda:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. SENTENÇA QUE RECONHECEU A DECADÊNCIA E JULGOU O FEITO EXTINTO. RECURSO DO CONSUMIDOR. DECADÊNCIA. PRETENSÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO E REPARAÇÃO DE DANOS, DIANTE DA FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. INAPLICABILIDADE DO PRAZO PARA ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO PREVISTO NO ART. 178, II, DO CÓDIGO CIVIL. DEMANDA QUE SE SUBMETE APENAS AO PRAZO PRESCRICIONAL DO ART. 27 DO CDC EM RAZÃO DA SUA NATUREZA. PREJUDICIAL DE MÉRITO AFASTADA. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. [...] (TJSC, Apelação n.º 5008929-78.2020.8.24.0005/SC. Relator: Des. Torres Marques, j. 08/06/2021, grifei).
Portanto, não sendo o caso de reconhecimento da decadência, a rejeição da respectiva prejudicial de mérito também é medida que se impõe.
Não havendo mais preliminares pendentes de análise, passo à apreciação do mérito.
Trata-se, em síntese, de ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral, visando a cessação de desconto de reserva de margem consignável em benefício previdenciário, uma vez que a parte autora sustenta que referidos descontos são indevidos, pois a contratação efetuada junto ao banco réu correspondia a simples empréstimo consignado.
A parte ré, por sua vez, afirma que quando da aquisição do empréstimo, a parte autora aderiu ao cartão de crédito, estando ciente da modalidade contratada, tendo, inclusive, realizado o saque do valor que lhe fora disponibilizado.
Pois bem. Este juízo tem alterado o seu posicionamento em algumas...

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