Acórdão Nº 5001118-46.2020.8.24.0012 do Primeira Câmara Criminal, 11-05-2023

Número do processo5001118-46.2020.8.24.0012
Data11 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5001118-46.2020.8.24.0012/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

RECORRENTE: ANTONIO RUBIANO SCHMITZ (AUTOR) ADVOGADO(A): AMANDA CAROLINE MARTINI CORDEIRO (OAB SC057117) ADVOGADO(A): TUANNY CAROLINE LENZ (OAB SC059142) ADVOGADO(A): ISADORA ZENI (OAB OABSC64994) RECORRIDO: LUIZ REMI MARCHESAN (ACUSADO) ADVOGADO(A): ADEMIR DE OLIVEIRA JUNIOR (OAB SC037403)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Antônio Rubiano Schmitz, com base no art. 581, I, do Código de Processo Penal, contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de CAÇADOR, que rejeitou a queixa-crime ofertada pelo ora recorrente contra Luiz Remi Marchesan e declarou extinta a sua punibilidade face à decadência, com fulcro no art. 395, II e III, e no art. 38, ambos do CPP, bem assim nos termos do art. 107, IV, do CP (evento 49, eproc1G, em 24-11-2021).

Em síntese, sustentou que a peça acusatória preenche os requisitos do art. 41 do CPP relativamente aos delitos capitulados (CP, arts. 138, 139 e 140), permitindo, pois, o contraditório e a ampla defesa, além disso, não há falar em decadência do direito de ação, porquanto "a inicial narrou que, no dia 22 de novembro de 2019, o querelado veiculou o vídeo em questão e a propositura da presente demanda se deu em 13 de fevereiro de 2020, ou seja, dentro do prazo legal".

Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, "para o fim de que seja recebida a queixa-crime, bem como seja rechaçada a extinção da punibilidade em razão da decadência" (evento 53, eproc1G, em 30-11-2021).

Em juízo de retratação (CPP, art. 589), a decisão foi mantida (evento 58, eproc1G, em 19-1-2022).

Contrarrazões ofertadas pelo querelado, pugnando pela manutenção da decisão combatida (evento 71, eproc1G, em 26-4-2022).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do procurador de justiça Ernani Dutra, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 18, eproc2G, em 29-3-2023).

VOTO

Do juízo de admissibilidade

Não obstante o despacho proferido no evento 7 destes autos, determinando que o recorrente recolhesse as custas iniciais da queixa-crime, constata-se que elas já foram quitadas (eproc1G, Guia 3431511, em 2-5-2022, no valor de R$ 882,08, montante que abrangeu o preparo recursal).

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

Do mérito

Contrariamente ao que foi sustentado pelo querelante, a sentença conta com fundamentação concreta e idônea para justificar a rejeição da queixa-crime que atribuiu ao querelado os crimes previstos nos arts. 138, 139 e 140, todos do CP.

A decisão proferida pela juíza de direito Rafaela Volpato Viaro é técnica e aborda com fidelidade o panorama existente nos autos, razão pela qual é adotada como motivação de decidir no presente voto, o que é feito com fulcro na técnica per relationem:

Adianto ser o caso de rejeição da queixa-crime.

Isso porque a peça acusatória não atende aos elementos formais do artigo 41 do Código de Processo Penal. É, pois, inepta.

Na lição de Noberto Avena, são elementos obrigatórios da peça acusatória "quando o fato foi praticado, onde ocorreu, quem o praticou, o motivo que o ensejou (se conhecido), os meios utilizados, o modo como foi cometido o delito, o malefício causado e, por fim, a explicação quanto ao contexto no qual perpetrado.".

O querelante discorre que no dia 22 de novembro de 2019 o querelado Luiz Marchesan postou um vídeo na rede social, cujo teor visa desabonar sua conduta.

Verifico que a narração fática se mostrou genérica, limitando-se a fazer menção ao vídeo postado na rede social facebook.

A inicial se resume a apontar que em seu vídeo o querelado repetiu a postagem realizada por Jackson Cordeiro, na qual este diz que o querelante obtém informações privilegiadas e "chantageia a Administração Pública", bem como que indicou 68 (sessenta e oito) cargos comissionados para obtenção de vantagem ilícita.

Mais que isso.

A bem verdade, no vídeo anexado no ev. 1 extrai-se que o querelado expressou indignação com o tratamento dispensado a ele frente a terceiros que fizeram acusações contra "um vereador" por tráfico de influência e chantagem. As ilações de prática de crime, contudo, não constam da mídia audiovisual.

Tampouco o print de tela ao final do vídeo se presta a tal fim, vez que não permite a convicção, ainda que sumária, de que foi o querelado quem fez a montagem e propagou a postagem do usuário João Maria Cordeiro.

Não bastasse, em relação aos crimes de difamação e injúria, em que pese a classificação jurídica dada ao fato, sequer há descrição da conduta praticada pelo querelado correspondente às normas incriminadoras.

Daí porque ausente também a justa causa, consubstanciada no lastro probatório mínimo para deflagração da ação penal.

Por fim, observo que, ao que tudo indica, outras pessoas concorreram para os fatos narrados na inicial, vez que o querelante imputou ao querelado a propagação de postagem do usuário Jackson Cordeiro, que por conseguinte foi "compartilhada" e "curtida" por terceiros na rede social.

Na forma do artigo 48 do Código de Processo Penal a queixa-crime ajuizada contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos. Trata-se do princípio da indivisibilidade da ação penal privada.

Em casos semelhantes, decidiu o nosso e. Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CRIMINAL - QUEIXA-CRIME - DIFAMAÇÃO (ART. 139 DO CÓDIGO PENAL) - CONDENAÇÃO NA ORIGEM - RECURSO DEFENSIVO - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PRIVADA - ACOLHIMENTO - EPISÓDIO OCORRIDO NA PLATAFORMA DIGITAL FACEBOOK - CENÁRIO FÁTICO CONSISTENTE NA SEQUÊNCIA DE COMENTÁRIOS SOBRE PUBLICAÇÃO DA "CLÍNICA CATARINENSE DE DERMATÓLOGIA - "DISCUSSÃO" ENTRE O QUERELANTE (SÓCIO DA CLÍNICA), QUERELADO E TERCEIRA PESSOA - TEOR DAS POSTAGENS DO TERCEIRO QUE GUARDAM SIMILITUDE/CORRESPONDÊNCIA AO CONTEÚDO CRÍTICO PUBLICADO PELO QUERELADO - POST´S "CURTIDOS" ENTRE SÍ E POR DEMAIS PESSOAS - SITUAÇÃO QUE REMETE A RENÚNCIA TÁCITA AO DIREITO DE QUEIXA QUANTO AO TERCEIRO (JULIANO) - EXTENSÃO DA RENÚNCIA EM FAVOR DO QUERELADO - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 48 E 49 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE - RECURSO PROVIDO. "Nos crimes contra a honra, cuja persecução se dá mediante ação privada, vige o princípio da indivisibilidade. Assim, a teor do art. 49 do Código de Processo Penal, a renúncia ao direito de queixa em relação a vários dos possíveis autores do delito se estende aos demais" (TJSC, RC nº 1999.000374-4, Des. Paulo Gallotti, j. em 16.03.1999) (TJSC, Apelação n. 0306583-35.2017.8.24.0018, de Chapecó, rel. Luis Francisco Delpizzo Miranda, Primeira Turma Recursal, j. 24-09-2020).

HABEAS CORPUS. SUPOSTA PRÁTICA DO CRIME DE CALÚNIA. ELABORAÇÃO E COMPARTILHAMENTO EM REDE SOCIAL DE ANÚNCIO COM CONTEÚDO QUE VEICULA SUPOSTA CALÚNIA. INICIAL ACUSATÓRIA QUE NARRA A PRÁTICA DO DELITO EM COAUTORIA. QUEIXA-CRIME OFERTADA CONTRA APENAS UMA DAS AUTORAS. RENÚNCIA TÁCITA AO DIREITO DE QUEIXA QUANTO A OUTRA. EXTENSÃO DA RENÚNCIA EM FAVOR DA QUERELADA. EXEGESE DOS ARTS. 48 E 49 DO CPP. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PRIVADA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA PARA DETERMINAR O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. (TJSC, Habeas Corpus n. 2014.027040-4, da Capital, rel. Rodrigo Collaço, Quarta Câmara Criminal, j. 05-06-2014).

Os precedentes acima refletem a hipótese dos autos, vez que trata de publicação em rede social divulgada por mais de uma pessoa, o que atrai a incidência do princípio da indivisibilidade da ação penal privada.

Seguindo essa linha de raciocínio, o oferecimento de queixa-crime contra somente um dos supostos autores do fato importa em renúncia tácita ao direito de querela, cuja eficácia se estende a todos, conforme regra do artigo 49 do Código de Processo Penal.

Extrai-se da narrativa inicial acusatória:

[...] Ocorre que, há certo tempo, vem recebendo ataques por parte do Querelado e de pessoas próximas deste através de redes sociais.

No dia 09 de novembro de 2019, o Querelante foi informado que realizaram uma postagem por intermédio do aplicativo Facebook, onde o Sr. Jackson...

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