Acórdão Nº 5001185-07.2020.8.24.0175 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 19-08-2021

Número do processo5001185-07.2020.8.24.0175
Data19 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001185-07.2020.8.24.0175/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA

APELANTE: DARCI JUSTINO HUBER (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:

DARCI JUSTINO HUBER ajuizou a presente "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Dano Moral, com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada", contra BANCO BMG SA, ambos qualificados nos autos.

Em linhas gerais, alega que realizou empréstimo consignado junto a instituição financeira requerida. Porém, meses após, foi surpreendida com o desconto "Reserva de Margem de Cartão de Crédito", o que deu origem a constituição da reserva de margem consignável (RMC). Informa que desde então a requerida tem realizado a retenção de margem consignável no percentual 5% sobre o valor do seu benefício previdenciário. O que, no seu entendimento, configura fraude contratual, porquanto tais serviços não foram por si solicitados ou contratados, apenas requereu e autorizou o empréstimo consignado, cujos encargos contratuais são inferiores aqueles. Disse que sequer houve o recebimento ou desbloqueio do cartão e que o desconto compromete a margem consignável do seu benefício (30%), tornando a dívida impagável, ante a onerosidade dos encargos contratuais.

Dentre outros provimentos, requereu: a tutela provisória de urgência antecipada que a parte ré se abstenha de reservar a margem consignável e empréstimo sobre a RMC; a declaração da inexistência da contratação de empréstimo consignado na modalidade RMC (cartão de crédito); a condenação da ré na restituição em dobro dos descontos realizados mensalmente a esse título; indenização por danos morais. Subsidiariamente pugnou pela readequação/conversão do empréstimo de cartão de crédito (RMC) para a modalidade consignada. (Evento 1)

O pedido de tutela antecipada foi indeferido. (Evento 4)

Em contestação, a instituição financeira refutou argumentos contidos na inicial. Disse que a modalidade de crédito foi contratada pela parte autora, que recebeu o valor correspondente em sua conta bancária. A devolução de valores pretendida por esta configuraria enriquecimento ilícito. Não há ato ilícito, tampouco dano indenizável. Propugnou pela rejeição integral dos pedidos autorais (Evento 10).

Houve réplica e tréplica. (Evento 17 e 22)

Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (Evento 24), nos seguintes termos:

Ante o exposto:

JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação ordinária ajuizada por DARCI JUSTINO HUBER em desfavor do BANCO BMG SA, e, por consequência, JULGO EXTINTO o processo com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como, ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), considerando o trabalho desenvolvido, o tempo da demanda e a importância econômica da ação na esfera patrimonial das partes, "ex vi" do disposto no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil. Contudo, fica suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial porque a parte vencida é beneficiária da gratuidade da justiça (art. 98, § 3º do CPC). (com destaque no original)

Irresignada, a parte autora interpôs recurso de apelação cível (Evento 30), reiterando a tese inicial de que houve vício de consentimento, vez que sua intenção não era contrair cartão de crédito com margem consignável (RMC), mas sim empréstimo consignado; que não fez uso do cartão de crédito consignado ou o desbloqueou; que os saques complementares não foram por ele autorizados, tendo sido transferidos para sua conta bancária a detrimento de sua vontade; que houve evidente falha na prestação de serviço por parte da instituição financeira ré, eis que praticou venda casada, de modo que inequívoco o ato ilícito perpetrado pela casa bancária, devendo ser declarada inexistente a contratação, com a consequente condenação da instituição financeira ré à restituição do indébito em dobro e ao pagamento de indenização por danos morais.

Pugna, por fim, pelo provimento do recurso com a reforma do decisum objurgado, a fim de que os pedidos exordiais sejam julgados totalmente procedentes.

Alternativamente, requer que seja realizada a readequação/conversão do "empréstimo" via cartão de crédito consignado (RMC) para empréstimo consignado.

Em sede de contrarrazões (Evento 38), a instituição financeira apelada sustenta, preliminarmente, a ocorrência da prescrição da repetição de indébito e dos danos morais.

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de apelação cível interposta por Darci Justino Huber contra a sentença que, nos autos da "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Dano Moral, com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada", julgou improcedentes os pedidos por si formulados em face do Banco BMG S.A.

Contrarrazões do Banco Réu.

Aponta o banco apelado a prefacial da prescrição da repetição de indébito e danos morais, em sede de contrarrazões, pois afirma ter decorrido o lapso trienal para tal desiderato.

Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, pacificou entendimento reconhecendo a incidência da prescrição decenal para os casos que envolvem responsabilidade civil contratual, in verbis:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA

I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual.

II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.

III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.

IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.

V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.

VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do Código Civil).Embargos de divergência providos. (EREsp 1281594/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/05/2019, DJe 23/05/2019).

No mesmo sentido, em casos análogos, é o que entende esta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.PRELIMINAR ALEGADA EM CONTRARRAZÕES. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. MATÉRIA QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. REJEIÇÃO.PREJUDICIAL AO MÉRITO. PRESCRIÇÃO. CONTRATO DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. BUSCA PELA DECLARAÇÃO DE...

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