Acórdão Nº 5001197-31.2022.8.24.0052 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 17-08-2023

Número do processo5001197-31.2022.8.24.0052
Data17 Agosto 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001197-31.2022.8.24.0052/SC



RELATOR: Desembargador JAIME MACHADO JUNIOR


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO(A): CRISTIANA NEPOMUCENO DE SOUSA SOARES (OAB MG071885) APELADO: PAULO RAIMUNDO DE PAULA (AUTOR) ADVOGADO(A): JONI GILMAR CONSOLI (OAB SC032037)


RELATÓRIO


BANCO BMG S.A interpôs recurso de apelação contra sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Porto União que, nos autos da Ação anulatória de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável cumulada com obrigação de fazer, restituição de valores em dobro e danos morais ajuizada por PAULO RAIMUNDO DE PAULA, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, cujo dispositivo restou assim vertido:
Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, nos termos da fundamentação, para os fins de:
a) DECLARAR a inexigibilidade do valor descontado na folha de pagamento da parte autora a título de RMC estabelecido pelo banco réu.
b) CONDENAR a parte ré à restituição simples dos valores retidos indevidamente, os quais devem ser apurados mediante cálculo aritmético, corrigidos monetariamente pelo INPC desde cada desconto e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação;
c) RESOLVER o contrato n. 6478799 (N ADE 46215383) e acessório n. 50538308, entabulado entre as partes e DETERMINAR a devolução, pela parte autora, dos valores creditados em sua conta bancária referente ao contrato discutido nos autos, acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês, ambos a contar da data de cada disponibilização na conta do autor;
d) CONDENAR a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula n. 362 do STJ) e juros legais desde a citação.
e) DETERMINAR a compensação do valor a ser devolvido pela parte autora (item "c"), com as verbas que tem direito a receber (itens "b" e "d").
Face à sucumbência recíproca, condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais na proporção de 70%; arcando, a parte autora, com os 30% remanescentes.
Fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, considerando o valor e a simplicidade da causa, o seu rápido deslinde e o julgamento antecipado do mérito, distribuídos na proporção da sucumbência, vedada a compensação (art. 85, §14, CPC).
A exigibilidade da obrigação sucumbencial resta suspensa em favor da parte autora, em virtude dos benefícios da justiça gratuita concedidos.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (Evento 18).
Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a casa bancária pugnou pelo reconhecimento do prazo prescricional de 3 (três) anos para indenização de danos morais e materiais, além de arguir a decadência da pretensão autoral, pelo que reivindicou a extinção do feito.
Requereu, ademais, a intimação da parte autora para noticiar o seu conhecimento acerca da distribuição da demanda, ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Sustentou, também, a necessidade de expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil e ao Ministério Público para que seja apurado os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica do causídico da parte adversa.
Discorreu acerca da relação contratual e defendeu, em suma, a validade do pacto entabulado (cartão de crédito com reserva de margem consignável) e dos descontos efetuados em remuneração. Asseverou, também, o descabimento da devolução dos valores descontados.
Pontuou, ainda, a ausência dos requisitos autorizadores da responsabilidade civil, além da inexistência de danos morais passíveis de indenização, ao passo que agiu no exercício regular de direito. Subsidiariamente, pleiteou a minoração do montante arbitrado (Evento 27).
Com as contrarrazões (Evento 32), ascenderam os autos a este egrégio Tribunal de Justiça.
Este é o relatório

VOTO


Considerando que o decisum objurgado restou proferido sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, a análise do reclamo ficará a cargo do mencionado diploma legal.
De início, a instituição financeira alegou que os pleitos de indenização por danos morais e materiais encontram-se fulminados pela prescrição trienal.
Pontuou, ainda, a decadência do direito, sob o argumento de que o prazo decadencial nos casos deste jaez, em que se requer a anulação do negócio jurídico, é de 04 (quatro) anos, à luz do art. 178 do Código Civil.
Contudo, razão não lhe assiste.
Isso porque, o art. 178 do Código Civil, em seus incisos I e II, prevê que o prazo de decadência quadrienal refere-se a negócios jurídicos firmado sob coação (inciso I), erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão (inciso II), isto é, quando da ocorrência de vícios de validade do pacto.
No entanto, o caso dos autos resta circunscrito a defeito na prestação do serviço bancário, com a violação do dever de informação, esculpido no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor, voltando-se, pois, ao plano da eficácia do negócio jurídico.
Sobre a temática, colhe-se da doutrina de Flávio Tartuce:
Anote-se que não se podem confundir os vícios do negócio jurídico com os vícios redibitórios ou vícios do produto. Os primeiros atingem os negócios jurídicos em geral, mais especificamente a manifestação da vontade ou a órbita social [..]. Os últimos atingem os contratos, particularmente o objeto de uma disposição patrimonial. [...] Ressalte-se que os vícios ou defeitos do negócio jurídico estão no seu plano da validade, enquanto que os vícios redibitórios e os vícios do produto estão no plano da eficácia do contrato correspondente (In Manual de Direito Civil: volume único. 6 ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016, p. 253).
Nessa perspectiva, levando-se em conta a causa de pedir, os aspectos do direito violado e a natureza da ação proposta - condenatória e de ressarcimento dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais oriundos do não cumprimento do dever de informação pela instituição financeira - entende-se que não se revela aplicável o instituto da decadência, mas tão somente o prazo prescricional estabelecido no art. 27 do CDC.
Em casos como o presente, já se manifestou esta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. DECADÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO DADA A NATUREZA DA DEMANDA. PRESCRIÇÃO ARGUIDA EM CONTRARRAZÕES. INOCORRÊNCIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRAZO QUINQUENAL QUE SE INICIA NA DATA EM QUE OCORRIDO O ÚLTIMO DESCONTO. EXEGESE DO ARTIGO 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E ENTENDIMENTO ADOTADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONSUMIDOR QUE PRETENDIA OBTER EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EFETIVAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DESTINADOS AO PAGAMENTO MÍNIMO INDICADO NA FATURA DO CARTÃO, RESULTANDO NA CONTRATAÇÃO DE CRÉDITO ROTATIVO. FORMA DE ADIMPLEMENTO E TAXA DE JUROS INCOMPATÍVEIS COM A MODALIDADE CONSIGNADA. PRÁTICA ABUSIVA. ADEQUAÇÃO DO CONTRATO QUE SE IMPÕE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000069-12.2021.8.24.0019, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 29-04-2021).
Dito isto, passando-se à análise da prescrição, o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor dispõe que: "Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos...

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