Acórdão Nº 5001224-80.2022.8.24.0030 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 17-11-2022

Número do processo5001224-80.2022.8.24.0030
Data17 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001224-80.2022.8.24.0030/SC

RELATOR: Desembargador ROBERTO LUCAS PACHECO

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: EDSON JOSE SERAFIM (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Imbituba, Edson José Sarefim ajuizou "ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral" em face do Banco BMG S/A, objetivando a declaração de inexistência de contrato de empréstimo via cartão de crédito com margem consignável, a restituição simples dos valores indevidamente cobrados e, ainda, indenização de R$ 10.000,00 pelos danos morais causados pela atitude ilícita da instituição demandada. Ainda, pleiteou a concessão de tutela provisória de urgência antecipada, dos benefícios da Justiça Gratuita, a inversão do ônus da prova e a condenação da parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios.

O pleito veio fundado na alegada ausência de contratação dessa espécie de avença, firmando tão somente contrato de empréstimo consignado, cujo pagamento dar-se-ia mediante descontos mensais em seu benefício previdenciário. Para embasar sua pretensão, juntou documentos (Evento 1 dos autos de origem).

O pedido de concessão da justiça gratuita foi deferido (Evento 5 dos autos de origem).

Citado, o banco demandado apresentou contestação, acompanhada de documentos (Evento 9 dos autos de origem).

A parte autora manifestou-se sobre a contestação (Evento 14 dos autos de origem).

O togado a quo julgou antecipadamente a lide, nestes termos (Evento 17 dos autos de origem - ipsis litteris):

ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados nesta demanda, para CONDENAR o(a) requerido(a) BANCO BMG S.A ao pagamento ao(à) autor(a) EDSON JOSE SERAFIM da importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de indenização por danos morais, atualizada monetariamente (INPC/IBGE) a partir desta data e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso (7/12/2019).

CONDENO o(a) requerido(a), outrossim, ao ressarcimento, em dobro, de todas as parcelas descontadas do benefício previdenciário do(a) autor(a) a título de Empréstimo RMC, ressalvadas aquelas descontadas no triênio que antecedeu o ajuizamento da ação, vez que atingidas pela prescrição.

CONDENO o(a) requerido(a), por fim, ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários de sucumbência, fixados à razão de 12,5% (doze e meio por cento) do valor da condenação.

Por cautela, vez que demonstrada a permanência dos descontos, OFICIE-SE ao INSS para que suste, imediatamente, o empréstimo consignado lançado no benefício previdenciário do(a) autor(a) (Benefício n. 611.400.446-2), tendo como fundamento a Reserva de Margem Consignável instituída pelo(a) requerido(a).

Não conformada com o decisum, a instituição financeira ré interpôs recurso de apelação, objetivando a reforma da sentença a fim de serem julgados totalmente improcedentes os pleitos deduzidos pela autora. Nessa senda, alegou, em síntese, que a parte apelada firmou contrato de cartão de crédito e efetuou saques vinculados à margem consignável do cartão, de sorte que não houve nenhuma conduta ilícita, mormente porque a parte autora aderiu expressamente ao contrato para utilização de cartão de crédito mediante consignação em folha de pagamento. Dessa forma, entende não ter praticado qualquer ato ilícito que justifique o afastamento das disposições contratuais previamente estipuladas ou que imponha o dever de restituir valores e indenizar moralmente a parte autora. Sucessivamente, pugnou pela redução do valor da indenização pelos danos morais e a restituição simples dos valores cobrados (Evento 23 dos autos de origem).

Depois de apresentadas as contrarrazões (Evento 30 dos autos de origem), o feito foi remetido a esta Corte.

VOTO

1 A questão será analisada à luz do Código de Defesa do Consumidor, porquanto a relação jurídica estabelecida entre as partes litigantes amolda-se às definições de consumidor final e fornecedor de serviços previstas nos arts. 2º e 3º, § 2º, daquela lei especial de regência.

Dito isso, e analisando a documentação encartada nos autos, infere-se que a parte autora firmou com o banco réu "Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado Banco BMG S.A. e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento" (Evento 9, Contrato 2), acreditando estar contratando empréstimo consignado com descontos mensais em seu benefício previdenciário.

Já dos extratos dos benefícios previdenciários recebidos pela parte autora (aposentadoria por invalidez previdenciária - Evento 1, Histórido de Créditos 4), infere-se que consta, além de empréstimos consignados firmados com outras instituições bancárias, referência a reserva de margem para cartão de crédito (RMC).

Ocorre que na avença firmada entre a autora e o banco réu não foram estipulados o número de parcelas para pagamento e a data de vencimento do contrato. E no caso concreto, conquanto haja cláusula expressa acerca da reserva de margem consignável, mostra-se evidente que houve vício de consentimento da parte consumidora devido ao fato de não terem sido prestadas informações claras e suficientes pela parte ré, fazendo com que aquela contratasse operação muito mais onerosa do que pretendia (e acreditava) contratar.

Além disso, o instrumento firmado prevê a aplicação de taxas de juros acima daquelas praticadas no mercado para operações de crédito pessoal consignado a aposentados e pensionistas do INSS, de acordo com a normativa do Banco Central, já que estabelecidas em 3,36% ao mês e 49,49% ao ano.

Veja-se que o banco réu, mediante a apresentação dos documentos constantes do Evento 9, Fatura 5, não logrou comprovar que a parte autora tenha recebido ou utilizado o cartão de crédito (a não ser a realização de dois saques, de sorte que se deve ter por evidenciada a intenção dela de tomar empréstimo consignado, com desconto em seu benefício previdenciário, e não na modalidade aplicada pela instituição bancária ré. Até porque não soa verossímil que a autora, caso tivesse conhecimento prévio das condições contratuais - tanto no tocante à forma de pagamento quanto em relação à taxa de juros aplicada -, optaria por aderir a contrato de cartão de crédito, sabidamente um dos mais onerosos ao consumidor.

Ademais, nem mesmo a eventual insuficiência de margem de empréstimo consignado na época da contratação é suficiente para demonstrar a adesão consciente da parte ao contrato de cartão de crédito com margem consignável. Seria imprescindível a comprovação nos autos de que ela tinha ciência dessa circunstância e que...

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