Acórdão Nº 5001259-15.2020.8.24.0061 do Quinta Câmara Criminal, 19-11-2020

Número do processo5001259-15.2020.8.24.0061
Data19 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5001259-15.2020.8.24.0061/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

RECORRENTE: ADEMIR SMANIOTO SIMAO (ACUSADO) RECORRENTE: CARLOS ALBERTO DA SILVA FILHO (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de São Francisco do Sul, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Ademir Smanioto Simão, vulgo "Chaves", e Carlos Alberto da Silva Filho, vulgo "Mano", dando-os como incursos nas sanções do artigo 2º da Lei n. 12.850/13 e do artigo 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (Evento 1, Denúncia 1 dos autos originários):

"FATO 01

Em data, horário e local a serem melhor esclarecidos ao longo da instrução criminal, porém, pelo menos até o dia 17 de outubro de 2019, os denunciados, de forma livre e consciente, bem como previamente acordados e em união de desígnios, passaram a constituir e a integrar pessoalmente organização criminosa com atuação no Estado de Santa Catarina, conhecida pela sigla PGC (Primeiro Grupo Catarinense), ao associar-se com outros indivíduos (ainda não identificados, mas de existência notória) .

FATO 02:

Dito isso, no dia 17 de outubro de 2019, por volta das 20h50min, no estabelecimento comercial denominado "Cubanacan", localizado na Avenida Doutor Nereu Ramos, s/n, Acaraí, São Francisco do Sul/SC, os denunciados, de forma livre e consciente, bem como previamente acordados e em união de desígnios, mataram a vítima Edemilson Sebastião.

Segundo apurado, na data dos fatos, os denunciados deslocaram-se até o Bar "Cubanacan" em uma motocicleta, e, logo que chegaram no local, um dos denunciados, que será individualizado durante a instrução processual, saltou da motocicleta e efetuou pelo menos seis disparos de arma de fogo contra Edemilson, causando as lesões descritas no Laudo Pericial n. 9406.19.05187, cuja cópia segue anexa, as quais foram a causa da morte da vítima.

Imediatamente na sequência, o agente retornou à motocicleta, que era conduzida pelo outro denunciado, que será individualizado durante a instrução processual, tendo ambos fugido do local em alta velocidade.

Destaca-se que o delito em questão foi cometido por motivo torpe, uma vez que o atentado contra a vida da vítima decorreu de determinação da organização criminosa conhecida como PGC, uma vez que Edemilson supostamente teria se apropriado de valores da referida organização criminosa, conforme destacado no Relatório de Investigação Preliminar de fls. 1/32 do arquivo "REPRESENTACAO_BUSCA5" do Evento 1.

Ademais, o crime foi cometido mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, pois os disparos foram efetuados tão logo a motocicleta passou em frente ao local, enquanto a vítima encontrava-se sentada conversando com Alexandre Magno Rodrigues Vieira".

Apresentada as alegações finais pelas partes a autoridade judiciária a quo julgou admissível a denúncia nos seguintes termos (Evento 95 dos autos originários):

"Ante o exposto, diante das elucidações apresentadas e da legislação penal, especial e processual penal aplicável à espécie, JULGO PROCEDENTE o pedido constante na denúncia ofertada pelo Ministério Público e PRONUNCIO Ademir Smanioto Simão e Carlos Alberto da Silva Filho, pela suposta prática dos crimes previstos no artigo 2º da Lei n. 12.850/13 e do artigo 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal.

Nego aos réus o direito de recorrer em liberdade, pois ainda se fazem presentes os fundamentos da prisão preventiva"

Inconformados, ambos os réus interpuseram recurso de apelação, através de seus advogados constituídos.

Ademir Smanioto Simão, requereu preliminarmente, a nulidade processual, em virtude da ocorrência do vício de inexistência do ato, porquanto ausente no Termo de Depoimento das testemunhas, na fase inquisitorial, a assinatura do Delegado ou escrivão de polícia. No mérito, pugnou, pela impronúncia e/ou a absolvição sumária dos crimes pelo qual foi pronunciado frente a fragilidade da prova em apontar indícios suficientes da autoria delitiva, com base no princípio do in dubio pro reo. Por fim, sustentou o afastamento das qualificadoras do motivo torpe e do recurso que impossibilitou a defesa do ofendido (Evento 114 dos autos originários).

Carlos Alberto da Silva Filho, por sua vez, requereu a impronúncia face a inexistência de indícios suficientes da autoria e participação no delito de homicídio qualificado (Evento 111 dos autos originários).

Nas contrarrazões, o Ministério Público pugnou o desprovimento dos recursos (Evento 118 dos autos originários).

Em juízo de retratação, a autoridade a quo manteve a decisão combatida (Evento 120 dos autos originários)

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Dr. Pedro Sérgio Steil, manifestou-se pelo conhecimento parcial e desprovimento dos recursos em sentido estrito interposto pelos apelantes (Evento 16 destes autos).

Este é o relatório.



VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1. Cuida-se de recurso em sentido estrito interposto por Ademir Smanioto Simão e Carlos Alberto da Silva Filho, contra decisão que os pronunciou para julgamento perante o Tribunal do Júri pela prática, em tese, dos crimes tipificados nos artigos 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal e da Lei n. 12.850/13.

É sabido que a decisão de pronúncia se destina a filtrar a imputação, exercendo a função de encaminhar à apreciação do Tribunal Popular tão somente os casos que detenham provas mínimas a gerar dúvida razoável no espírito do Magistrado, em expressão do princípio in dubio pro societate, como juízo de admissibilidade da acusação.

O decisum encerra, portanto, "um mero juízo de admissibilidade, onde examinam-se somente indícios de autoria e materialidade do fato. Assim, deve o Magistrado ser comedido ao fundamenta-la, sob pena de invadir a competência do Tribunal do Júri, juiz natural da causa" (STJ, HC n. 170.716/MG, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 28.2.2012).

Destarte, consoante enuncia o artigo 413 do Código Processual Penal, há de ocorrer a pronúncia quando, convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, identifique elementos mínimos para potencial e futura condenação, cabendo a apreciação e resolução de eventuais controvérsias ao juízo natural constitucionalmente instituído.

Por outro lado, o juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado nas hipóteses elencadas no artigo 415 do Código de Processo Penal, ou ainda, constatada a ausência de elementos bastantes a autorizar à submissão ao julgamento popular, evidencia-se a necessidade de impronunciar o agente (artigo 414 Código de Processo Penal).

2. Inicialmente, a defesa de Ademir Smanioto Simão sustentou em preliminar a nulidade processual consubstanciada na ocorrência do vício de inexistência do ato, porquanto as provas contidas no caderno processual apontam que a obtenção da prova oral das testemunhas foi colhida sem a presença do Delegado ou escrivão de polícia - frente a ausência da assinatura no Termo de Depoimento -, pois fora realizado por agente de polícia incompetente para o ato. Assim, restou prejudicado todo o processo penal, devendo ser reconhecida a inépcia da denúncia e extinção do feito.

Razão, porém, não lhe assiste.

Sem maiores digressões, há muito consolidou o entendimento de que "eventuais máculas na fase extrajudicial não têm o condão de contaminar a ação penal, dada a natureza meramente informativa do inquérito policial" (RHC 93.424, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 13-12-18).

Portanto, embora inexista a assinatura do Delegado de Polícia nos depoimentos das testemunhas protegidas, tal ato não incide em nulidade processual, eis que os relatórios conclusos e os demais depoimentos colhidos administrativamente estão assinados pela autoridade competente.

Não fosse isso, observa-se que a insurgência ocorreu somente quando da apresentação das alegações finais, estando, portanto, preclusa, eis que não fora arguida no momento oportuno.

Outro tanto, não há falar-se em inépcia da denúncia.

Com efeito, referida peça vestibular e seu recebimento estão vinculados ao preenchimento dos requisitos elencados no artigo 41 do Código de Processo Penal e a existência de elementos seguros que demonstrem a perpetração do crime e meros indícios da autoria.

No caso em análise, a denúncia trouxe a exposição dos atos criminosos, com todas as suas circunstâncias, fulcrada em amplo conjunto de provas indiciárias as quais não foram invalidadas, a qualificação dos acusados, indicando a capitulação dos crimes, inexistindo, pois, afronta ao artigo 41 do Código de Processo Penal.

O Superior Tribunal de Justiça, a...

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