Acórdão Nº 5001262-25.2023.8.24.0041 do Primeira Câmara Criminal, 27-04-2023

Número do processo5001262-25.2023.8.24.0041
Data27 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 5001262-25.2023.8.24.0041/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO


RECORRENTE: PEDRO SERGIO ALVES (RECORRENTE) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)


RELATÓRIO


No Juízo da Vara da Criminal da Comarca de Mafra, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face Pedro Sérgio Alves, pela prática, em tese, da infração penal contra a vida prevista no art. 121, § 2º, II, III e IV, do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na inicial acusatória (Evento 1 dos autos originários):
No dia 27 de novembro de 2021, por volta das 23 horas, na via pública da Rua Rufino Mendes, Bairro Jardim América, nesta cidade e Comarca de Mafra, o denunciado Pedro Sérgio Alves, agindo de modo consciente e voluntário, matou a vítima Alessandro Stoeberl, vulgo "Seco", por motivo fútil, com emprego de meio cruel e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima.
Na referida data, após o denunciado e a vítima saírem do "Bar do Turuna" momentos antes, Pedro, conduzindo o automóvel I/Fiat Siena EL Flex, placa MHA-6468, cor prata, seguiu a vítima Alessandro Stoeberl, que dirigia uma motocicleta, até as imediações da residência da vítima, no Bairro Jardim América, nesta cidade.
Já nas proximidades da residência da vítima, o denunciado, aproveitando-se da confiança da vítima decorrente da amizade existente entre ambos, o que fez com que inexistisse motivo para que Alessandro acreditasse que seria atacado, e valendo-se, portanto, de recurso que dificultou a defesa da vítima, aproximou-se do ofendido e, agindo de inopino e com intenção de matar, atingiu-o com um instrumento pérfuro-contundente.
Ato contínuo, Alessandro tentou escapar do ataque do denunciado correndo pela Rua Rufino Mendes, mas Pedro o alcançou e golpeou Alessandro novamente, atingindo-o catorze vezes ao todo, provocando-lhe "01 ferimento corto contundente em face anterior e proximal de perna direita. 01 ferimento corto-contundente em epigástrio com saída de epiplom (evisceração). 01 ferimento corto-contundente em face anterior e infra mamária a esquerda. 01 ferimento corto conto-contundente em região external no terço médio e escoriação em região do hipocôndrio direito. 03 ferimentos corto-contundentes em lateral esquerda do tórax. 01 ferimento corto-contundente em lateral e proximal de antebraço esquerdo. 01 ferimento em lateral/proximal de antebraço direito. Escoriação em lateral e distal do tórax a direita. 01 ferimento cortocontundente em região dorsal e subescapular direita e outra dorsal e distal. 01 ferimento corto-contundente em região dorsal e subescapular direita e outra dorsal e distal. 01 ferimento corto-contundente em região para ver tibial a esquerda lombo/torácica. 01 ferimento corto-contundente em face anterior e medial de braço direito. 01 ferimento corto-contundente em região escapular esquerda. 01 ferimento corto-contundente em região posterior e medial de braço esquerdo. Ferimento lacerado em ambos os joelhos e em lateral da perna direita. [...] Equimose em lateral esquerda do estômago bem como diversos segmentos de alça intestinal" (laudo pericial do e. 1, doc. 2, p. 24-29 do Inquérito Policial apenso).
A seguir, o denunciado Pedro evadiu-se do local com seu automóvel, enquanto a vítima pediu ajuda a seus familiares e chegou a receber socorro médico, mas não resistiu aos ferimentos causados pelo denunciado e veio a óbito, decorrente de choque hemorrágico (laudo pericial do e. 1, doc. 2, p. 24-29 do Inquérito Policial apenso).
O denunciado Pedro matou a vítima Alessandro porque naquele dia ocorreu a final da Copa Libertadores da América, oportunidade na qual o Palmeiras e o Flamengo disputaram a referida partida futebolística, tendo o Palmeiras sagrado-se vencedor e campeão do referido campeonato. Assim, ao longo daquela noite, a vítima, que torcia para o Palmeiras, estava fazendo brincadeiras relacionadas ao resultado daquele jogo de futebol que desagradaram Pedro, que torcia para o Flamengo, tendo ele decidido por fim à vida do ofendido, portanto, por esse motivo fútil.
O denunciado também valeu-se de meio cruel para matar Alessandro, pois atingiu-o com violentos e numerosos golpes com uma arma branca em diversas regiões do corpo, provocando sofrimento intenso e desnecessário para causar a morte da vítima.
Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio decisão de pronúncia, que admitiu a pretensão acusatória, para submeter o acusado a julgamento Popular pelo suposto cometimento do crime de homicídio triplamente qualificado, nos termos descritos na peça vestibular. A deliberação contou com o seguinte dispositivo (Evento 146 dos autos originários):
Ante o exposto, julgo admissível a denúncia e, em consequência, com fulcro no art. 413 do Código de Processo Penal, PRONUNCIO o réu PEDRO SÉRGIO ALVES, como incurso nas sanções do artigo 121, §2º, incisos II, III e IV, do Código Penal, a fim de que seja submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri.
Inconformado com o decisum, o acusado interpôs o presente recurso, almejando, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade do depoimento prestado por sua genitora e, no mérito, a impronúncia, por ausência de indícios suficientes acerca da autoria delitiva (Evento 154 dos autos originários).
Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da decisão recorrida (Evento 184 dos autos originários).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Procurador José Eduardo Orofino da Luz Fontes, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 13).
Este é o relatório

VOTO


Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto por Pedro Sérgio Alves contra decisão do Juízo da Vara Criminal da Comarca de Mafra que, ao julgar admissível o pedido formulado na denúncia, prolatou sentença de pronúncia, submetendo-o a julgamento perante o Conselho de Sentença em razão do suposto cometimento do delito contra a vida disciplinado no art. 121, § 2º, II, III e IV, do Código Penal.

1. Admissibilidade
Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso.

2. Preliminar
A Defensoria pretende o reconhecimento da nulidade do depoimento prestado pela genitora do acusado, Sra. Francisca Cônsul Alves, em razão da inobservância ao disposto no art. 206, do Código de Processo Penal. Argumenta que o Juízo singular deixou de fundamentar a imprescindibilidade da colheita do relato, sendo que, no caso, existem outras testemunhas arroladas pela acusação e a genitora do réu sequer presenciou os fatos.
Aduz, ademais, que a idade avançada de Francisca, o uso de calmante antes do depoimento e o fato de que presenciou o indeferimento da dispensa, podem tê-la feito se sentir acuada a prestar declarações.
Pondera a existência de prejuízo evidente, porquanto a informante apontou que o acusado, seu filho, confessou o cometimento de um homicídio.
A prefacial, antecipa-se, não prospera.
No tocante à obrigação ou não de prestar depoimento, o art. 206, do Código de Processo Penal, dispõe: "A testemunha não poderá eximir-se da obrigação de depor. Poderão, entretanto, recusar-se a fazê-lo o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado, salvo quando não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias".
No caso, o Magistrado singular indeferiu o pleito defensivo de dispensa da oitiva da genitora do acusado, da seguinte forma (Evento 113 dos autos originários): "A Defesa requereu a dispensa da oitiva da testemunha de acusação Francisca Consul Alves, com base no art. 206 do Código de Processo Penal, assinalando que se trata da genitora do acusado, entretanto o representante do Ministério Público manifestou a discordância, insistindo na oitiva da referida testemunha. O requerimento da Defesa restou indeferido, pois segundo entendimento do MM. Juiz, a mencionada pretensão não cabe à Defesa".
Ao apreciar o pedido de nulidade da colheita do referido depoimento, o Juízo a quo rechaçou a pretensão defensiva sob os seguintes fundamentos (Evento 146 dos autos originários):
A tese lançada pela defesa não prospera.
Anote-se que "o magistrado, antes de iniciada a colheita das declarações das pessoas enumeradas no art. 206, deve advertir o parente ou cônjuge do réu de que não está obrigado a depor. Abrindo mão desse direito, poderá favorecer ou prejudicar o acusado. Caso não haja tal alerta, mera irregularidade, pode a parte interessada intervir, solicitando que tal advertência seja feita e o direito da pessoa a ser ouvida, respeitado. Se as partes não interferirem, nem o juiz fizer o alerta e as declarações forem colhidas, deve-se considerá-las meras informações, sem o caráter de um depoimento" (Nucci, Guilherme de Souza. 12ªed.RT:2013p.496).
No caso, colhe-se da mídia de vídeo do evento 125 que a respectiva testemunha, após ter sido alertada pelo Magistrado, afirmou que não teria problema em prestar seu depoimento (mídia de vídeo 1h,34'33'').
Ainda, em que pese a aquiescência da testemunha, a mesma não restou compromissada, sendo ouvida como informante.
Noutro giro, impende registrar que "pelo teor do que dispõe o artigo 206 do Código de Processo Penal, quando se trata de testemunho de pessoa com grau de parentesco muito próximo das partes, há sempre um juízo de avaliação, a critério do juiz, quanto à necessidade da produção dessa prova" (STJ - Recurso Especial nº 1.437.794 - SP - Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz).
Considerando as peculiaridades do caso - homicídio sem testemunhas oculares, certo que os relatos, tanto da genitora quanto do irmão do acusado, são de grande relevo para o deslinde do feito, pois, na fase policial ambos disseram que o réu lhes confessou ter matado...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT