Acórdão Nº 5001270-90.2020.8.24.0175 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 23-11-2021

Número do processo5001270-90.2020.8.24.0175
Data23 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001270-90.2020.8.24.0175/SC

RELATORA: Desembargadora REJANE ANDERSEN

APELANTE: MARIA ANTUNES DE LIMA (AUTOR) ADVOGADO: GUSTAVO PALMA SILVA (OAB SC019770) ADVOGADO: Stephany Sagaz Pereira (OAB SC035218) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: FELIPE BARRETO TOLENTINO (OAB SC057388A)

RELATÓRIO

Maria Antunes de Lima ajuizou ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada (RMC) em desfavor de Banco BMG S.A, ao argumento de que está sofrendo descontos indevidos em seu benefício previdenciário, os quais são realizados a título de reserva de margem consignável oriunda de contratação de cartão de crédito que aduz ter sido realizada mediante um desvirtuamento da real operação de crédito que pretendia contratar.

O Togado concedeu o beneplácito da justiça gratuita à parte autora (evento 3).

Contestação da casa bancária (evento 10).

Réplica (evento 14).

Ato contínuo, sobreveio sentença da qual se extrai a seguinte parte dispositiva (evento 21):

JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação ordinária ajuizada por MARIA ANTUNES DE LIMA em desfavor do BANCO BMG SA, e, por consequência, JULGO EXTINTO o processo com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como, ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), considerando o trabalho desenvolvido, o tempo da demanda e a importância econômica da ação na esfera patrimonial das partes, "ex vi" do disposto no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil. Contudo, fica suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial porque a parte vencida é beneficiária da gratuidade da justiça (art. 98, § 3º do CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Oportunamente, arquivem-se.

Irresignada com o decisum de primeiro grau, a parte autora apresentou recurso de apelação (evento 27), pugnando pela reforma da sentença vergastada para: a) reconhecer a nulidade do contrato de empréstimo consignado por meio de cartão de crédito e, por consectário, dos descontos realizados em seu benefício previdenciário a título de reserva de margem consignável (RMC); b) deferir a condenação da casa bancária por dano moral; c) condenação da parte ré em custas e honorários advocatícios.

Contrarrazões da casa bancária (evento 33), aduzindo má-fé processual ante a prática de advocacia predatória por parte do procurador do autor, tendo em vista ter ingressado com ações semelhantes, pugnando pela manifestação pessoal do autor em relação à sua ciência no feito.

Por conseguinte, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

É o relato do necessário.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra sentença que, no âmbito da presente ação, julgou improcedentes os pedidos formulados na peça exordial.

Realizada a admissibilidade recursal, passa-se à análise das insurgências levadas ao duplo grau de jurisdição.

1 Litigância de má-fé

No que tange ao pedido da casa bancária em contrarrazões referente à prática de advocacia predatória e alegada má-fé do procurador do autor diante da propositura de inúmeros processos da mesma natureza do aqui tratado, é de ser rejeitado, uma vez que não configurada a conduta temerária apontada, bem como incabível, neste grau de jurisdição, a apuração do alegado.

Neste sentido, já disse esta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM DESCONTO EM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC, EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.CONTRARRAZÕES DO BANCO. SUSTENTADA INDISPENSABILIDADE DE INTIMAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA COMPARECER EM JUÍZO PARA CIÊNCIA E CONFIRMAÇÃO DO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. DESNECESSIDADE, PORQUANTO O DEMANDANTE SUBSCREVEU O INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO E DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA, O QUE, POR SI SÓ, JÁ VALIDA A CIÊNCIA E O DESEJO DA PARTE COM O AJUIZAMENTO DO FEITO. OUTROSSIM, ALMEJADA CONDENAÇÃO DA PENA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DO PROCURADOR DA PARTE AUTORA EM RAZÃO DO AJUIZAMENTO DE AÇÕES SIMILARES "EM LOTE". INVIABILIDADE. CAUSÍDICO QUE NÃO FAZ PARTE DA RELAÇÃO PROCESSUAL INSTAURADA, PELO QUE SE TORNA IMPOSSÍVEL SUA CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ [...].RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (Apelação n. 5004932-79.2020.8.24.0040, rel. José Maurício Lisboa, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 22-4-2021, grifo nosso).

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATO, COM PEDIDOS DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCONTOS DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, QUE, ACOLHENDO O PEDIDO SUBSIDIÁRIO, DETERMINOU À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA REQUERIDA QUE PROCEDA, NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS, A READEQUAÇÃO DOS TERMOS DO CONTRATO DE "CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO", DE MODO A, DENTRE OUTRAS MEDIDAS, LIMITAR OS JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA PERMITIDA PELA LEGISLAÇÃO E PELO INSS.[...].PARTE RÉ QUE ALMEJA A CONDENAÇÃO DA ADVOGADA DA PARTE AUTORA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, ALÉM DE PLEITEAR A EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS AO NUMOPEDE, À ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, AO MINISTÉRIO PÚBLICO E À AUTORIDADE POLICIAL, PARA QUE POSSAM SER APURADOS INDÍCIOS DE INFRAÇÕES DISCIPLINARES E OCORRÊNCIA DE CONDUTA TÍPICA, SOB A ARGUIÇÃO DE PRÁTICA DE CONDUTA TEMERÁRIA NO AJUIZAMENTO DE INÚMERAS AÇÕES "EM LOTE", PRATICAMENTE IDÊNTICAS. DESACOLHIMENTO. SANÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ ENDEREÇADA À PARTE, E NÃO A SEU PATRONO. RECORRENTE, ADEMAIS, QUE PODE BUSCAR DIRETAMENTE AS AUTORIDADES OU O ÓRGÃO DE CLASSE COMPETENTES, CONFORME O CASO, CASO ENTENDA HAVER INDÍCIOS DE INFRAÇÕES E DE TIPOS PENAIS. [...]. (Apelação n. 5000072-52.2019.8.24.0175, rel. Tulio Pinheiro, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 29-10-2020, sublinhei).

Do voto:

A súplica não pode prosperar, não apenas considerando que a sanção por litigância de má-fé é endereçada à parte, e não a seu patrono (v.g. Apelação Cível n. 2012.080167-4, rel. Des. Jorge Luis Costa Beber, j. em 24.09.2015), mas também o fato de o próprio insurgente, caso entenda haver indícios de infrações e de tipos penais (o que, por ora, não se pode aferir à luz do que foi anexado), poder buscar diretamente as autoridades administrativamente ou o órgão de classe competentes, conforme o caso.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. [...] ALEGAÇÃO DO BANCO RÉU DE PRÁTICA DE "ADVOCACIA PREDATÓRIA" PELO PROCURADOR DA AUTORA. AÇÕES JUDICIAIS PROPOSTAS COM A MESMA PRETENSÃO EM FACE DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS QUE NÃO FAZ DO PROCURADOR UM LITIGANTE DE MÁ-FÉ. ASSINATURA NA PROCURAÇÃO E NA DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA QUE DEMONSTRA A CIÊNCIA E A INTENÇÃO DA AUTORA DE MOVER A PRESENTE DEMANDA (Apelação n. 5001416-34.2020.8.24.0175, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 17-12-2020).

E, corpo do acórdão:

''[..] Se não o fez a tempo e modo é porque assim entendeu desnecessário. A alegação em tela, nesta fase processual, data venia, flerta com a litigância de má-fé, porquanto se aproxima do proceder de modo temerário (art. 80, V, CPC).

Ainda, o suposto ajuizamento de centenas de ações versando sobre os mesmos pedidos e causas de pedir patrocinadas pelo procurador da autora não o transforma, por si só, em causídico agressor. Isso porque se trata de seu ofício e, pelo visto, da matéria que, por ora, mais lhe condiz.

Igualmente, mostra-se descabido, no presente momento e através deste Colegiado, oficiar a Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério Público e a competente autoridade policial sobre os fatos aqui alegados, mormente porque, como já explanado, tais providências podem ser adotadas diretamente pelo réu''.

Rejeita-se, portanto, a alegação de litigância de má-fé.

2 Legalidade do contrato firmado entre as partes

Sustenta a parte autora apelante que a sentença singular deve ser reformada para declarar a inexistência da contratação de empréstimo consignado via cartão de crédito, o qual originou os descontos a título de reserva de margem consignável, realizados no seu benefício previdenciário. Para tanto, alega que sua intenção era apenas a de fazer um empréstimo consignado simples e jamais a de contratar cartão de crédito. Argumenta, ainda, que a manutenção dos termos do contrato sub judice implicará em uma dívida vitalícia e impagável, a qual representa obrigação totalmente desproporcional ao consumidor.

Da análise detida dos autos em epígrafe, depreende-se que a celeuma principal cinge-se na verificação da (i) legalidade da contratação de empréstimo consignado, por meio de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) e, também, na averiguação da existência de eventual vício de consentimento em relação à referida contratação.

Compulsando detidamente o caderno processual verifica-se por incontroverso, que houve transação formalizada pelas partes para realização de empréstimo, o qual se consolidou por meio do documento denominado "Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado Banco BMG e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento" (evento 10, CONTR2).

Entretanto, apesar de o referido documento estar formalmente perfeito e possuir a assinatura do requerente, ora apelante, o contexto fático-probatório coligido nos autos revela uma ilicitude na referida contratação, a qual se materializa no fato de que houve um desvirtuamento da real intenção da demandante que, ao que tudo indica, desejava apenas realizar um empréstimo consignado, sem, contudo, adquirir/contratar qualquer cartão de crédito.

Oportunamente, cumpre destacar que as faturas apresentadas no evento 10, faturas 7 à 10, demonstram que não houve a utilização do cartão de crédito pela parte demandante para compras ou serviços. Doutro vértice, dessume-se dos autos que a instituição financeira recorrente sequer...

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