Acórdão Nº 5001287-73.2019.8.24.0010 do Segunda Câmara de Direito Comercial, 13-04-2021

Número do processo5001287-73.2019.8.24.0010
Data13 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001287-73.2019.8.24.0010/SC



RELATOR: Desembargador ROBSON LUZ VARELLA


APELANTE: BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU) ADVOGADO: RONALDO GOIS ALMEIDA (OAB RS056646) APELADO: DIANA HILARIO (AUTOR) ADVOGADO: ALVINO GABRIEL DE NOVAES MENDES (OAB SC051633) ADVOGADO: ERICK ROETGER SILVA (OAB SC039244)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação cível interposto por BANCO DAYCOVAL S.A. contra sentença de parcial procedência (evento 23) da denominada ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com restituição de indébito e indenização por danos morais, a qual foi prolatada nos seguintes termos:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por DIANA HILARIO contra BANCO DAYCOVAL S.A., com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:
a) DECLARAR a nulidade da contratação do cartão de crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC e, por consequência, determinar o cancelamento do cartão de crédito emitido;
b) DETERMINAR o cancelamento definitivo dos descontos e cobranças a título de reserva de margem para cartão de crédito do benefício da parte autora, para tanto, determinando-se a expedição de ofício à Autarquia Previdenciária para cumprimento da presente sentença, sob as penas legais;
c) CONDENAR a parte ré em obrigação de fazer, consistente na readequação do contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo consignado, no valor obtido pela parte autora através dos saques, tendo por base os encargos definidos pelo Banco Central do Brasil para tal modalidade de empréstimo, na data da contratação, o que deverá ser oportunamente apurado através de liquidação de sentença;
d) DETERMINAR a repetição do indébito em favor da parte autora, na forma simples, dos valores descontados indevidamente da parte autora a título de RMC, incidindo sobre tais valores correção monetária pelo INPC/IBGE a contar de cada desembolso, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação;
e) CONDENAR a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, da importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de indenização por danos morais, com a incidência de correção monetária pelo INPC, a contar da data da publicação da presente sentença, e de juros de mora na monta de 1% ao mês, a partir da citação;
f) AUTORIZAR a compensação entre os valores devidos pela parte autora com aqueles devidos pela ré em decorrência da presente sentença, na forma do art. 368 e ss. do Código Civil.
Em razão da sucumbência mínima da parte autora, CONDENO a parte ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC.
Em suas razões recursais (evento 31), a casa bancária primeiramente defende a ocorrência de cerceamento de defesa. No mais, sustenta, em síntese, a legalidade do negócio jurídico celebrado entre as partes, ressaltando a inexistência de prova de que a apelada teria sido levada a erro, não se vislumbrando, assim, irregularidade que dê causa à anulação do instrumento. Assevera que, à época da pactuação, a recorrida já não tinha margem consignável em seus rendimentos, inviabilizando a contratação de empréstimo consignado, restando apenas a obtenção de crédito consignado através da adesão ao contrato de cartão de crédito com margem consignável. Aduz a inexistência de termo final a caracterizar dívida impagável, porquanto o débito é extinto com pagamento do débito, na data do vencimento da fatura, constitui liberalidade da autora. Defende que o uso cartão fica constituído e provado pelo saque de valores, razão pela qual não há falar em nulidade. Também, afirma inexistir danos indenizáveis, requerendo, subsidiariamente, a minoração do "quantum". Ainda, discorre acerca do descabimento da restituição de valores, vislumbrando, em caso de manutenção do "decisum", que eventual importância disponibilizada à parte adversa sejam devolvidos ou compensados, e devidamente corrigidos monetariamente, sob pena de enriquecimento ilícito.
Foram apresentadas contrarrazões (evento 35).
Este é o relatório

VOTO


Insurge-se a instituição financeira contra sentença de parcial procedência da ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais.
Os pontos atacados no apelo serão analisados separadamente com o objetivo de facilitar a compreensão.
Cerceamento de defesa
Prefacialmente, a casa bancária insurgente aventa a ocorrência de cerceamento de defesa, pelo julgamento antecipado da lide, afirmando que os fatos por si alegados poderiam ser afirmados com a audiência de instrução e julgamento e com o depoimento pessoal da apelada.
Razão, contudo, não lhe assiste.
No sistema de persuasão racional adotado pelos arts. 370 e 371 da Lei Processual Civil, cabe ao magistrado determinar a conveniência e a necessidade da produção probatória.
Nesse viés, como presidente da instrução processual, não há obrigação de o juiz coletar a prova requerida pela parte quando configurada a inutilidade de sua produção para o deslinde da "quaestio", sendo lícito ao togado decidir antecipadamente a lide.
A respeito da temática, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:
[...] É lícito ao magistrado formar a sua convicção com base em qualquer elemento de prova disponível nos autos bastando para tanto que indique na decisão os motivos que lhe formaram o convencimento, de forma que a intervenção desta Corte quanto a tal valoração encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 3. Não configura cerceamento de defesa a sentença que julga antecipadamente a lide, de maneira fundamentada, resolvendo a causa sem a produção de outras provas em razão da suficiência probatória. Precedentes. [...] (AgInt no REsp 1459039/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Boas Cueva, publ. em 25/6/2018)
Ademais, conforme indicado no art. 370, parágrafo único, da Lei Adjetiva Civil, "o juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias".
"In casu", a averiguação dos argumentos levantados pelos litigantes pode ser realizada mediante análise da documentação acostada ao feito, prescindindo-se de novas provas para a apreciação da alegação exordial
Dessa maneira, dispensando-se a produção probatória ulterior, inexiste mácula no julgamento antecipado do litígio, tal como deliberado pelo juízo "a quo".
Diante dessas considerações, rejeita-se a preliminar em apreço.
Contratação via cartão de crédito consignado
Relativamente ao tema, importa esclarecer que, durante o curso do processado, a parte autora defendeu a nulidade da contratação ajustada com a ré, sustentando ter sido vítima de fraude por esta ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), operação diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado, o qual acreditou efetivamente ter celebrado.
No pronunciamento judicial atacado, o Magistrado de Primeiro Grau concluiu pela readequação do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável "para contrato de empréstimo consignado, no valor obtido pela parte autora através dos saques, tendo por base os encargos definidos pelo Banco Central do Brasil para tal modalidade de empréstimo, na data da contratação, o que deverá ser oportunamente apurado através de liquidação de sentença" (evento 23).
Em seu reclamo, pretende a apelante a reforma do referido "decisum", a fim de que seja julgada improcedente a demanda, no que assevera, para tanto, a validade do contrato de cartão de crédito consignado, defendendo ter sido entabulado com anuência da demandante, a significar, em consequência, a licitude dos descontos efetuados no seu benefício previdenciário e a inviabilidade de restituição de valores.
Pois bem.
Sobre as modalidades de mútuo bancário, o Banco Central do Brasil define como "empréstimo consignado aquele cujo desconto da prestação é feito diretamente em folha de pagamento ou benefício previdenciário. A consignação em folha de pagamento ou de benefício depende de autorização prévia e expressa do cliente à instituição financeira concedente" (http://www.bcb.gov.br/pre/bc_atende/port/consignados.asp).
Ainda a respeito, esclarece a jurisprudência que, no empréstimo por intermédio de cartão de crédito com margem consignável, "disponibiliza-se ao consumidor um cartão de crédito de fácil acesso ficando reservado certo percentual, dentre os quais poderão ser realizados contratos de empréstimo" (TJMA, Apelação Cível n. 0436332014, rel. Des. Cleones Carvalho Cunha, j. em 14/5/2015, DJe 20/5/2015).
Nessa perspectiva, a concessão de crédito através dessas duas modalidades (empréstimo e cartão de crédito), mesmo na consignação, possui considerável distinção, especialmente em relação às taxas de juros e demais encargos, avistando-se maior onerosidade ao consumidor quando se vale do cartão de crédito em detrimento do empréstimo.
Isso se deve, por vezes, em razão de que "o consumidor firma o negócio jurídico acreditando tratar-se de um contrato de empréstimo consignado, com pagamento em parcelas fixas e por tempo...

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