Acórdão Nº 5001348-81.2021.8.24.0003 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 14-12-2021

Número do processo5001348-81.2021.8.24.0003
Data14 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001348-81.2021.8.24.0003/SC

RELATORA: Desembargadora JANICE GOULART GARCIA UBIALLI

APELANTE: MANOEL VARELLA (AUTOR) APELANTE: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de Apelações Cíveis interpostas por MANOEL VARELLA (autor) e BANCO VOTORANTIM S.A. (réu) da sentença proferida nos autos da "Ação de Revisão de Contrato c/c Declaração de Nulidade de Cláusulas Contratuais Abusivas, Repetição de Indébito e Pedido Liminar de Manutenção de Posse" n. 5001348-81.2021.8.24.0003. O decisório recorrido contou com a seguinte parte dispositiva (doc. 22):

Diante do exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão autoral, a fim de declarar abusivos os encargos moratórios previstos na avença - cédula de crédito bancário n. 901090676 (Evento 12, CONTR2) -, os quais devem se limitar à multa de 2% e juros moratórios de 12% a.a., nos termos da fundamentação supra.

Por ser ínfima a sucumbência da ré, CONDENO a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor atualizado da causa, dado o grau de zelo, o lugar de prestação, a natureza e importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado (art. 85, caput e §2º, do CPC), suspensa a exigibilidade, no entanto, em razão do beneplácito da justiça gratuita, deferida no evento 4.

A instituição financeira sustenta, em síntese: a) "não há mais discussão quanto à possibilidade da cobrança cumulada dos juros remuneratórios no período de inadimplência", pois a "rubrica de juros remuneratórios, à taxa do contrato ou à média de mercado, acrescidos de juros moratórios no percentual pactuado e multa de 2%, podem ser cobrados de forma cumulada" e "estão em plena conformidade com o Acórdão Paradigma n°. REsp 1.058.514-RS, e com o entendimento exarado na Súmula nº 472 do STJ"; b) o enunciado da Súmula n. 379 do STJ, que dispõe acerca da limitação do percentual de juros moratórios, não é aplicável ao caso, uma vez que "o contrato objeto desta ação é regido pela Lei 10.931/04 (Cédulas de Crédito Bancário)", a qual faculta às "partes estipularem os encargos moratórios, sem fixar qualquer condição ou limite"; c) "na remota hipótese de ser a parte requerida condenada, os consectários legais sejam atualizados única e exclusivamente pela taxa Selic, nos termos do artigo 406 do CCB, a partir da fixação da indenização"; d) em razão do exposto, deve ser "mantida a cobrança dos juros remuneratórios para o período de inadimplência, no patamar em que contratados de 2,23% a.m., acrescidos de juros moratórios no percentual de 6,00% ao mês pactuado e multa moratória de 2% sobre o valor em atraso", bem como dos "juros de mora de 6,00% a.m., nos termos e valores em que foram contratados, em cumulação aos demais encargos moratórios contratados legitimamente", atribuindo-se integralmente os ônus da sucumbência ao autor (doc. 25).

O autor, por sua vez, sustenta, em suma: a) "é flagrante [...] a abusividade dos encargos cobrados a título de juros remuneratórios", porque superiores à Taxa Média de Mercado; b) os juros moratórios não podem ultrapassar o patamar de 1% ao mês; c) deve ser limitado a "2% (dois por cento) o percentual das multas de mora nos contratos de consumo" e incidir apenas sobre as "parcelas em atraso e não sobre a totalidade do débito"; d) "nosso sistema jurídico veda o anatocismo", consoante "o Art. 4° do Decreto 22.626/33 e a Súmula 121 STF"; e) a comissão de permanência não pode ser cumulada com correção monetária, todavia, o banco "além da comissão de permanência está cumulando a cobrança extorsiva com correção monetária, spread bancário, taxa de gravame, Seguro de Proteção Financeira, Tarifa de Cadastro, Avaliação de bens recebidos em garantia, Registro junto ao DETRAN e outras taxas que acabam por ocasionar uma elevada onerosidade na cédula contratual"; f) em razão do exposto, requer, "liminarmente": que o banco "se abstenha de efetuar quaisquer registros e restrição [de crédito] contra o Apelante"; seja "determinado o recebimento da consignação em pagamento das parcelas eventualmente vencidas e das vincendas"; seja considerado "o encargo cobrado pelo Agente Financeiro abusivo em face destes estarem em desacordo com a Taxa Média de Mercado"; "a manutenção da posse do bem indicado na petição inicial, em definitivo", em seu favor; g) "no mérito", pugna pela restituição do indébito relativamente às parcelas quitadas, ou compensação com as parcelas devidas, "bem como a restituição de valores que foram pagos indevidamente"; sejam declaradas nulas "as cláusulas e as N.P. vinculadas"; "ao final, seja reformada a presente decisão, no que concerne aos pedidos indeferidos pelo douto Magistrado, revisando o presente contrato, declarando nulas as cláusulas que permitiram a capitalização mensal de juros em todo o seu período, declarando também, nula as cláusulas abusivas e considerando o contrato para compra e venda a prazo, aplicando-se ao valor concedido ao Apelante pelo Apelado, juros remuneratórios conforme a Taxa Média de Mercado estabelecida pelo Banco Central do Brasil (BACEN), a priori afastando os juros moratórios e regularizando os juros remuneratórios visando o equilíbrio contratual" (doc. 30).

Com as contrarrazões apresentadas apenas pela parte autora (doc. 31), ascenderam os autos a esta Corte.

VOTO

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do recurso do banco e, adianta-se, de parte do recurso do autor.

Recurso do banco réu

Juros remuneratórios no período de inadimplência cumulados com juros moratórios e multa

Sustenta o banco apelante a possibilidade de cobrança cumulada do juros remuneratórios com os encargos de mora (juros e multa).

No caso, o magistrado a quo manteve os juros de mora e a multa contratual conforme previsão no pacto, todavia, vetou a cobrança cumulada com os juros remuneratórios.

É possível a cobrança de juros remuneratórios no período de inadimplência, desde que não cumulados com comissão de permanência e fixados na taxa média de mercado divulgada pelo Bacen, limitado ao percentual contratado.

Nesse sentido é o enunciado da Súmula 296 do Superior Tribunal de Justiça: "Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado".

No caso, há previsão expressa de incidência de juros remuneratórios, juros moratórios e multa contratual para a hipótese de inadimplência (item I do contrato de financiamento de veículo - doc. 18, p. 1).

Oportuno anotar, ainda, a possibilidade da exigência de juros moratórios e multa contratual de forma simultânea, mas não cumulada, conforme sentenciado, uma vez que a cobrança cumulada de referidos encargos é vedada, pois implica no cálculo de um encargo sobre o outro. Já a cobrança simultânea nada tem de ilegal, pois representa apenas a incidência de encargos distintos sobre um mesmo débito.

Sobre o tema, destacam-se julgados deste Tribunal de Justiça:

CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DO DEMANDADO. [...]PERÍODO DE INADIMPLÊNCIA. PACTO QUE PREVÊ A INCIDÊNCIA DE JUROS REMUNERATÓRIOS, JUROS DE MORA E MULTA CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. VEDADO, TODAVIA, O COMPUTO DE UM ENCARGO SOBRE O OUTRO.É plenamente válida a cobrança conjunta dos encargos de mora, sendo inviável a incidência apenas se cumulados com a comissão de permanência, não pactuada na hipótese.Todavia, os juros de mora devem incidir sobre o valor da prestação vencida, sendo vedada, pois, a incidência de forma cumulada sobre outro encargo de mora (multa), sob pena de configurar bis in idem, já que ambos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT