Acórdão Nº 5001371-28.2021.8.24.0035 do Quarta Câmara Criminal, 20-05-2021

Número do processo5001371-28.2021.8.24.0035
Data20 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 5001371-28.2021.8.24.0035/SC



RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO


AGRAVANTE: ALISSON DOS SANTOS (AGRAVANTE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)


RELATÓRIO


Trata-se de agravo em execução penal interposto pelo reeducando Alisson dos Santos, inconformado com a decisão (Seq. 11 SEEU) proferida pelo Juízo da Vara Criminal da comarca de Rio do Sul, que, nos autos do PEP n. 0003285-63.2018.8.24.0054, procedeu a soma de penas e emitiu atestado de pena a cumprir apontando a necessidade de o apenado cumprir 60% (3/5) da pena para progredir de regime em relação ao crime equiparado a hediondo.
Em suma, o agravante, assistido pela Defensoria Pública, argumentou o seguinte: [a] "considerando-se que a redação do artigo 112 foi completamente alterada com o advento da nova lei, deve também haver uma interpretação por inteiro do dispositivo legal. Isto é dizer que ao efetuar a escolha de qual inciso regulará a progressão do apenado, o juízo deverá analisar não apenas qual inciso se encaixa às características objetivas e subjetivas, mas qual destes é o mais benéfico ao condenado"; [b] "importante esclarecer que não é possível que incida a fração de 3/5 sobre a pena para fins de lapso temporal para progressão de regime, da redação anterior do art. 2º, § 2º, da Lei de Crimes Hediondos, tendo em vista que foi revogado pela Lei n. 13.964/19, cuja revogação foi mais benéfica ao executado"; [c] "diante da ausência de previsão na legislação de uma hipótese específica para os reincidentes em crime comum, a solução deve ser pela adequação ao inciso que mais se encaixa ao caso e que é mais favorável ao apenado; caso contrário, o ordenamento iria estar desrespeitando diversos princípios norteadores da execução da pena, como o princípio da legalidade, do favor rei e da individualização da pena"; [d] "considerando-se o vácuo legal deixado pelo/a legislador/a quanto aos condenados por crimes hediondos, mas reincidentes em crimes comuns, a Lei n. 13.964/19 constitui, sem dúvidas, novatio legis in mellius, devendo ser interpretada in bonam partem para retroagir aos apenados que se encontrarem nesta situação".
Concluiu requerendo ao Tribunal o provimento do recurso, "para o fim de reconhecer a incidência do fator 2/5 ou 40% (quarenta por cento) para progressão de regime, previsto no art. 112, inciso V, da Lei n. 7.210, de 1984" (Evento 1 - petição inicial 1).
Com as contrarrazões (Evento 10), e mantida a decisão impugnada por seus fundamentos em atenção ao preconizado no art. 589 do Código de Processo Penal (Evento 12), os autos formados por instrumento ascenderam a esta Corte.
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho, que se manifestou pelo conhecimento e provimento do recurso (Evento 9 - promoção 1)

VOTO


Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso há de ser conhecido.
Como visto, o reeducando Alisson dos Santos foi condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 5 anos de reclusão e 1 ano e 2 meses de detenção, por infração ao art. 33, "caput", da Lei n. 11.343/2006, e art. 65, "caput", incs. I e III, "d", do Código Penal, e ao art. 12 Lei n. 10.826/2003, c/c art. 61, inc. I, art. 65 e art. 65, inc. III, "d", ambos do Código Penal, respectivamente.
No caso, a controvérsia tratou da interpretação e dos impactos da Lei n. 13.964/2019 no processo de execução penal, notadamente no requisito objetivo para progressão de regime.
Entende a Defensoria Pública que a Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime) passou a prever o percentual de 60% (3/5) apenas para os reincidentes específicos em crime hediondo ou equiparado, sendo o lapso de 40% (2/5) aplicável aos primários, bem como reincidentes não específicos.
Razão lhe assiste, adiante-se.
Oportuno destacar desde logo que a posição vigente na Quarta Câmara Criminal deste Tribunal era no sentido de, mesmo com o advento da Lei n. 13.964/2019, exigia-se do sentenciado, reconhecida a reincidência seja ela específica ou geral, no caso de crime hediondo ou equiparado, o cumprimento de 60% (3/5) da pena para progredir de regime.
A título exemplificativo: Agravo de Execução Penal n. 5016373-69.2020.8.24.0036, rel. José Everaldo Silva, j. 18-2-2021; Agravo de Execução Penal n. 0002344-93.2020.8.24.0038, de minha relatoria, j. 11-2-2021; Agravo de Execução Penal n. 5023286-76.2020.8.24.0033, rel. Sidney Eloy Dalabrida, j. 4-2-2021; Agravo de Execução Penal n. 0001028-60.2020.8.24.0033, rel. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, j. 8-10-2020.
Porém, a compreensão desta Câmara Criminal modificou-se a partir da unificação da jurisprudência das Quinta e Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça, que ocorreu a partir do julgamento, em 9-12-2020, pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça do AgRg no HC 613.268/SP, de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, assim ementado:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. VIA INADEQUADA. LEI 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME). PROGRESSÃO DE REGIME. PACIENTE CONDENADO POR TRÁFICO DE DROGAS. REINCIDÊNCIA EM CRIME COMUM (FURTO QUALIFICADO). HIPÓTESE NÃO ABARCADA PELA NOVATIO LEGIS. ANALOGIA IN BONAM PARTEM. CUMPRIMENTO DE 40% DA PENA. ORIENTAÇÃO REVISTA. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. CONCESSÃO DE HC DE OFÍCIO.
1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. Firmou-se nesta Superior Corte o entendimento no sentido de ser irrelevante que a reincidência seja específica em crime hediondo para a aplicação da fração de 3/5 na progressão de regime, pois não deve haver distinção entre as condenações anteriores (se por crime comum ou por delito hediondo). Interpretação da Lei 8.072/90. Precedentes.
3. Com a entrada em vigor da Lei 13.964/19 - Pacote Anticrime-, foi revogado expressamente o art. 2º, §2º, da Lei n. 8.072/90 (art. 19 da Lei n. 13.964/19), passando a progressão de regime, na Lei de Crimes Hediondos, a ser regida pela Lei n. 7.210/84.
4. A nova redação dada ao art. 112 da Lei de Execução Penal modificou por completo a sistemática, introduzindo critérios e percentuais distintos e específicos para cada grupo, a depender especialmente da natureza do delito.
5. No caso, o paciente foi sentenciado pelo delito de tráfico de drogas, tendo sido reconhecida sua reincidência devido à condenação definitiva anterior pelo crime de furto qualificado (delito comum). Para tal hipótese, inexiste na novatio legis percentual a disciplinar a progressão de regime ora pretendida, pois os percentuais de 60% e 70% foram destinados aos reincidentes específicos (sem destaque no original).
6. Em direito penal não é permitido o uso de interpretação extensiva, para prejudicar o réu, devendo a integração da norma se operar mediante a analogia in bonam partem. Princípios aplicáveis: Legalidade das penas, Retroatividade benéfica e in dubio pro reo.
- A lei penal deve ser interpretada restritivamente quando prejudicial ao réu, e extensivamente no caso contrário (favorablia sunt amplianda, odiosa restringenda) - in NÉLSON HUNGRIA, Comentários ao Código Penal, v. I, t.I, p. 86.
Doutrina: HUMBERTO BARRIONUEVO FABRETTI e GIANPAOLO POGGIO SMANIO, Comentário ao Pacote Anticrime, Ed. Atlas, 2020; RENATO BRASILEIRO DE LIMA. Pacote Anticrime: Comentários à Lei 13.964/19, Ed.
JusPodium, 2020; PAULO QUEIROZ, A nova progressão de regime - Lei 13.964/2019, https://www.pauloqueiroz.net; ROGÉRIO SANCHES CUNHA, Pacote Anticrime: Lei n. 13.964/2019 - Comentários às alterações no CP, CPP e LEP. Salvador: Editora JusPodvim, 2020; e PEDRO TENÓRIO SOARES VIEIRA TAVARES e ESTÁCIO LUIZ GAMA LIMA NETTO; NETTO LIMA, Pacote Anticrime: As modificações no sistema de justiça criminal brasileiro. e-book, 2020.
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