Acórdão Nº 5001374-57.2020.8.24.0054 do Sétima Câmara de Direito Civil, 15-09-2022

Número do processo5001374-57.2020.8.24.0054
Data15 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001374-57.2020.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

APELANTE: RENATO TENFEN (AUTOR) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Renato Tenfen interpôs recurso de apelação contra sentença (Evento 80, SENT1 dos autos de origem) que, nos autos da ação de reparação de perdas e danos ajuizada em face de Celesc Distribuição S.A., julgou improcedentes os pedidos iniciais.

Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida:

RENATO TENFEN, já devidamente qualificado na inicial, ajuizou a presente demanda que nominou de Ação de Reparação de Perdas e Danos em face de CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., igualmente já qualificiada. Aduziu ao juízo, em suma, ser produtor de fumo e que, nos períodos de 10.1.2020 e 11.1.2020, teria havido interrupção do serviço de fornecimento de energia elétrica, cujo resultado foi a perda/redução da qualidade do produto armazenado na estufa. Imputou responsabilidade objetiva à ré, uma vez que teria apresentado falha na prestação do serviço e finalizou requerendo sua condenação ao pagamento de indenização por danos materiais.

Citada, a ré apresentou contestação refutando as alegações articuladas na petição inicial; defendeu a ocorrência de caso fortuito e força maior, bem como a veracidade das informações contidas nos documentos por ela expedidos; asseverou ser dever do consumidor mitigar os riscos do prejuízo e impugnou o pedido de indenização por ausência de prova.

Houve réplica.

Na sequência, foi designada perícia.

Apresentado o resultado da prova pericial, a parte autora manifestou concordância com o laudo. A parte ré, por sua vez, pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais.

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório do necessário. Fundamento e decido. (Grifos no original).

Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:

Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos iniciais formulados por RENATO TENFEN em face de CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., resolvendo o mérito da causa e extinguindo o processo na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Arca a parte autora com as custas e despesas processais. Arbitro em favor da ré honorários advocatícios de 15% sobre o valor da causa, observados os critérios do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Ressalvo que a exigibilidade dos encargos de sucumbência fica suspensa em relação à parte autora, porquanto beneficiária da gratuidade.

Com o trânsito em julgado, arquive-se. (Grifos no original).

Em suas razões recursais (Evento 86, APELAÇÃO1 dos autos de origem), a parte autora asseverou que "com a imprestabilidade das folhas, houve então, por consequência, grande prejuízo com a frustrada secagem das folhas do fumo, sendo o fumo em seu interior, totalmente descartado, pois sem valor comercial algum, resultando em uma perda de receita no valor de R$ 32.914,98 (...), conforme prova o Laudo Técnico firmado pelo Técnico em Agropecuária Fernando Grossklaus - CREA/SC 052.421-6" (p. 4).

Aduziu que "O Juízo nomeou PERITO JUDICIAL o engenheiro agrônomo EDIO ZUNINO SGROTT - CREA/SC 32.530-5, que certificou que EFETIVAMENTE houve prejuízo financeiro com a perda na qualidade do tabaco em virtude das interrupções de energia já declinadas, apresentando LAUDO PERICIAL juntado nos eventos 45 e 68 de perdas na quantia, primeiramente em R$ 22.200,00 (...) e posteriormente corrigido para R$ 21.810,00 (...), valor este em 01/01/2020 (evento 68)" (p. 4).

Alegou que "Não merece prosperar a afirmação de que o apelante deveria ter adquirido um gerador alternativo para não prejudicar a sua produção em caso de interrupção no fornecimento de energia elétrica, pois ele, consumidor, não tem nenhuma obrigação de assim o fazê-lo em sua unidade consumidora; pelo contrário, a responsabilidade pelo fornecimento de energia elétrica adequado, de boa qualidade, de forma contínua e sem interrupções incumbe à concessionária" (p. 8).

Sustentou que "No caso em apreço, é incontroverso que: (i) houve interrupção no fornecimento de energia elétrica na área em que está localizada a unidade consumidora cadastrada em nome do apelante, ou seja, a culpa não foi do apelante e, (ii) não houve ocorrência de caso fortuito ou força maior. Ou seja, a interrupção por si só, deflagrou, dentro dos padrões exigidos pela legislação consumerista, falha na prestação de serviços pela concessionária. Essa Corte de Justiça não tem destoado quanto ao dever de indenizar por parte da apelada no caso em questão" (p. 13).

Referiu que "A fim de comprovar os danos que o apelante teve preju[izos financeiros com a interrupção do fornecimento da energia elétrica em sua propriedade no período já declinado, houve gasto também com a contratação do Técnico em Agropecuária Fernando Grossklaus - CREA/SC 052.421-6 que confeccionou o respetivo LAUDO TÉCNICO. Para tanto, o respetivo profissional estipulou a quantia de R$ 900,00 (novecentos reais), quantia esta devidamente adimplida pelo requerente, conforme recibo de quitação em anexo" (p. 18).

Com as contrarrazões (Evento 91, CONTRAZ1 dos autos de origem), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedentes os pedidos inaugurais.

Porque presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do reclamo interposto.

Tem-se como fato incontroverso, porque não impugnado, que o autor é fumicultor e utiliza estufa elétrica para a secagem de folhas de tabaco, sendo igualmente inconcusso que houve interrupção no fornecimento de energia na propriedade do demandante em 10-1-2020 e 11-1-2020.

A controvérsia, portanto, cinge-se em verificar se a descontinuidade da prestação de serviço público foi capaz de causar os prejuízos descritos na inicial. Em seguida, caso reconhecida a responsabilidade da ré, deve-se analisar a sua extensão, além dos pleitos de indenização por danos materiais e de ressarcimento dos valores despendidos na confecção de laudo pericial extrajudicial.

Sobre tais pontos, então, debruçar-se-á a presente decisão.

Adianta-se, desde já, que o apelo comporta parcial acolhimento.

I - Da responsabilidade civil e do dever de indenizar:

Analisando o caso em apreço, observa-se que o apelante, na qualidade de produtor de fumo, de fato amargou prejuízos de ordem material decorrentes de interrupções de energia elétrica em sua unidade consumidora. Com efeito, em razão da suspensão temporária do serviço, as folhas de tabaco que estavam em processo de secagem em estufa tiveram a qualidade reduzida ou foram totalmente inutilizadas.

Há de se registrar que restou demonstrada a ocorrência de interrupção no fornecimento de energia elétrica na propriedade do demandante, tendo a suspensão dos serviços se iniciado às 21h54min do dia 10-1-2020 e retornado apenas às 8h36min do dia 11-1-2020, conforme atesta o Sistema Integrado de Operação e Manutenção (SIMO) juntado aos autos pela demandada (Evento 11, ANEXO2 dos autos de origem).

Ainda, deve-se consignar que durante a instrução processual houve a elaboração de laudo pericial que atestou os danos sofridos pelo recorrente, sendo que o referido exame foi desenvolvido por engenheiro agrônomo com registro no Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA), sob o crivo do contraditório, inclusive com respostas aos quesitos formulados pelo Juízo e fundamentação embasada na tabela de preços referenciais do tabaco vigente à época dos fatos (Evento 45, LAUDO2 dos autos de origem).

Extrai-se do laudo do expert:

12) Qual o tempo necessário sem fornecimento de energia elétrica para que se tenha início uma desclassificação da qualidade do fumo que está sendo beneficiado?

R. O tempo necessário depende do estágio de secagem das folhas. No estágio inicial de secagem, que dura cerca de 20 horas com temperaturas de 110 a 130 o C, e no qual as folhas de fumo tem grande quantidade de água, o volume de vapor dentro da estufa é alto. Nessa situação, similar ao que ocorreu na estufa do Sr. Renato Tenfen, o não funcionamento dos ventiladores com falta de circulação de ar por cerca de 3 horas causa acúmulo desse vapor e a degradação das folhas é relativamente rápida. Ocorre o cozimento das folhas que passam a colar umas nas outras e nos grampos e noutras partes da estufa. Posteriormente inicia a putrefação com formação de mau cheiro.

Quando a perda é total, muitas vezes, é necessário retirar as folhas com pás e em carrinhos de mão para descarte. Quando não é total a perda, com o restabelecimento da energia e reinício da secagem, as folhas que foram afetadas ficam escuras e agregadas, devido à degradação química e pela redução da circulação do ar (folhas coladas). Se a falta de energia ocorre na fase final, quando as folhas já estão quase secas, os danos são menores, pois há pouco vapor na estufa. Neste caso o período de falta de ventilação pode ser maior, sem danos tão graves. [...]

13) Os geradores de energia elétrica, movidos a combustíveis por hidrocarbonetos, seriam meios eficazes para suprir a demanda de energia elétrica em casos de interrupção no fornecimento de energia elétrica?

R. Sim, são eficazes para suprir a demanda no caso de falta de energia elétrica. A aquisição destes equipamentos, obviamente onera a produção de fumo, pois é necessária a aquisição e também a manutenção de dois sistemas de fornecimento de energia. O autor possui um gerador. [...]

14) Os valores apresentados pelo autor condizem com aqueles sugeridos pela Afubra (Associação dos Fumicultores do Brasil) nas safras de no mínimo 03 anos anteriores a safra perdida?

R. Os valores apresentados pelo autor na inicial são superiores aqueles praticados na safra 2019/2020 e anteriores, mas corrigimos com o uso de médias históricas corretas no cálculo da perícia atual.

15) Qual a média de produção do autor (classe de fumo/valor) identificada após análise e conferência das notas fiscais ofertadas pela fumageira?

A média geral de venda de 27.426 kg de tabaco...

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