Acórdão Nº 5001425-51.2020.8.24.0092 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 18-03-2021

Número do processo5001425-51.2020.8.24.0092
Data18 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001425-51.2020.8.24.0092/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001425-51.2020.8.24.0092/SC



RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA


APELANTE: ALEXANDRE DE OLIVEIRA (AUTOR) ADVOGADO: BIANCA DOS SANTOS (OAB SC027970) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU) ADVOGADO: ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO (OAB SC043613)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação interposto pelo demandante, Alexandre de Oliveira, da sentença, de lavra do Juízo de Direito da 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis (Dr. Tanit Adrian Perozzo Daltoe), que, nos autos da ação de revisão de cláusulas contratuais em alienação fiduciária proposta em face do demandado, Banco Pan S.A, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial para:
a) afastar a cobrança das tarifas de avaliação do bem e registro de contrato, nos termos da fundamentação;
b) fixar o valor do Custo Efetivo Total (CET) do contrato revisando, observando o afastamento das tarifas supra indicadas;
c) determinar a repetição simples de eventual indébito ou compensação pela instituição financeira, desde que verificado pagamento a maior, a ser apurado por simples cálculo aritmético, corrigidos pelo índice da Corregedoria Geral de Justiça e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data da citação.
Em suas razões recursais, o demandante, ora apelante, alegou que:
(a) a possibilidade de revisão das cláusulas contratuais;
(b) a ilegalidade da capitalização mensal de juros, em razão da inconstitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001;
(c) a aplicação dos juros remuneratórios dentro do limite legal, à alegação de cobrança de taxa superior à pactuada; e,
(d) a nulidade da cobrança da TAC e da TEC.
Pautou-se, nesse sentido, pelo provimento do recurso de apelação.
Contrarrazões no evento 49.
É o relatório

VOTO


I. Tempus regit actum
A sentença recorrida foi proferida em 07.10.2020. Portanto, à lide aplica-se o CPC/15, na forma do enunciado administrativo nº 3: "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".
II. Admissibilidade
Porque presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
III. Apelo do demandante
(a) revisão das cláusulas contratuais
A apelante defende a possibilidade de revisão das cláusulas contratuais abusivas, em razão do Código de Defesa do Consumidor.
De plano, cumpre pontuar que o caso em tela guarda relação de consumo, nos termos da Súmula n. 297, editada pelo Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe: "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
Chancelada aplicação do Código de Defesa do Consumidor à espécie, anota-se que o art. 6º, do aludido diploma legal, dispõe acerca dos direitos básicos do consumidor e, especificamente no inciso V, prevê a "modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas".
Adiante, o art. 51 do Código de Defesa do Consumidor versa acerca das cláusulas contratuais nulas de pleno direito, relativas ao fornecimento de produtos e serviços, especialmente aquelas que colocam o consumidor em posição de extrema desvantagem.
Vale destacar algumas hipóteses previstas nos incisos do referido artigo:
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código;
III - transfiram responsabilidades a terceiros;
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
[...]
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
[...]
Como se vê, ressoa patente a possibilidade de revisão, pelo Poder Judiciário, das cláusulas contidas nos contatos que instrumentalizam as relações de consumo, especialmente com o fim de aniquilar as arbitrariedades comumente inseridas nos contratos de adesão, tal como nos contratos de natureza bancária.
De mais a mais, a revisão das cláusulas contratuais é permitida também sob à ótica do Código Civil, mormente em razão da incidência dos princípios da boa-fé objetiva (art. 422 do CC), da função social dos contratos e do dirigismo contratual (art. 421 do CC), os quais levam à mitigação da força exorbitante que se atribuía ao princípio do pacta sunt servanda, quando tais ajustes, visivelmente de longa duração, trazem em seu teor cláusulas com conteúdo abusivo, desproporcional ou, quiçá, ilegal, as quais implicam em onerosidade excessiva daquele que, por exemplo, contrai um financiamento ou crédito de instituição financeira, a qual detém melhores condições jurídicas e técnicas, obtém grandes ganhos.
Neste sentido, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:
[...] no que atine à possibilidade de revisão das cláusulas contratuais, a jurisprudência do STJ pacificou-se no sentido de que, aplicável o Código de Defesa do Consumidor aos casos que envolvem relação de consumo, é permitida a revisão das cláusulas contratuais pactuadas, diante do fato de que o princípio do pacta sunt servanda vem sofrendo mitigações, mormente ante os princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual.
(AREsp. n. 32.884/SC. Rel. Min. Raul Araújo, j. em 20.10.2011).
Nestes termos, a possibilidade de revisão de contrato é clara - e pacífica na jurisprudência - e não fere o princípio da força obrigatória dos contratos, que é relativizado ante a aplicação de regras do microssistema de proteção ao consumidor e mesmos aquelas puramente civis, que têm o condão de afastar da pactuação eventuais iniquidades/abusividades.
No presente caso, as cláusulas contratuais foram devidamente analisadas na sentença, em que pese o Togado de piso não ter constatado qualquer abusividade a ser aniquilada, motivo pelo qual carece a apelante de interesse recursal.
Apelo não conhecido no ponto, portanto.
(b) capitalização de juros
Defende a apelante a ilegalidade da capitalização mensal de juros, ainda que expressamente pactuada no contrato, ao argumento de inconstitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória n. 1963-71/2000, reeditada sob o n. 2170-36/2001, conforme reconhecido pelo Órgão Especial deste Tribunal, na Aguição de Inconstitucionalidade n. 2007.059574-4.
É bem verdade que, por maioria de votos, o Órgão Especial desta Corte declarou inconstitucional o art. art. 5º da Medida Provisória n. 1963-71/2000, reeditada sob o n. 2170-36/2001, o qual permite a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano nas operações realizadas pelas...

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