Acórdão Nº 5001442-09.2019.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Público, 25-01-2022

Número do processo5001442-09.2019.8.24.0000
Data25 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5001442-09.2019.8.24.0000/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5001419-76.2019.8.24.0125/SC

RELATORA: Desembargadora BETTINA MARIA MARESCH DE MOURA

AGRAVANTE: LIZ SERVICOS ONLINE LTDA ADVOGADO: SERGIO BALBINOTTI OTAKI (OAB SC045299) ADVOGADO: JORGE ANDRE RITZMANN DE OLIVEIRA (OAB SC011985) AGRAVADO: ESTADO DE SANTA CATARINA MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Liz Serviços Online Ltda. interpôs Agravo de Instrumento contra decisão proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Itapema que, no bojo do "Pedido de Tutela Provisória de Urgência Cautelar Requerida em Caráter Antecedente", formulado contra o Estado de Santa Catarina, indeferiu o pleito liminar de suspensão da exigibilidade de ICMS, sobre o serviço de cessão de software.

Relata, em suma, que atua no ramo tecnológico, tendo desenvolvido software para "disponibilização dos atos oficiais dos Municípios na rede mundial de computadores" e, na sequência, firmou contratos com diversos entes públicos, para simples cessão do produto. Menciona que após notificação para recolhimento de ISSQN sobre os itens comercializados, ingressou com demanda judicial, obtendo o reconhecimento da não incidência do referido imposto. Contudo, por força da evolução da atividade antes desempenhada, a "simples cessão de software passou a se caracterizar como um serviço, uma obrigação de fazer", o que culminou no pagamento de ISSQN desde janeiro de 2015. Narra ter realizado o parcelamento dos débitos referentes ao período de janeiro de 2015 a novembro de 2017 e o "pagamento regular dos tributos de dezembro de 2018 até a presente data". Sustenta que em 09.04.2018, houve novo lançamento tributário, dessa vez pelo Estado de Santa Catarina, "primeiro, por realizar operações de circulação de mercadorias e não recolher o valor correspondente ao ICMS no período de janeiro de 2015 (01/2015) a dezembro de 2017 (12/2017), e, segundo, por não ter realizado inscrição no Cadastro de Contribuintes de ICMS", ocasionando a inscrição em dívida ativa. Alega que a situação é particularmente grave, pois seus serviços são voltados exclusivamente às pessoas jurídicas de direito público interno, devendo, a todo tempo, comprovar a regularidade fiscal perante a Administração Pública, sendo que a emissão da certidão positiva com efeitos de negativa, é determinante para a continuação da atividade empresarial. Defende a não incidência de ICMS na atividade desempenhada, pois se trata de prestação de serviço, sendo inviável a cobrança simultânea de ICMS e ISSQN. Pleiteia a prestação de caução, "averbando-se a existência da presente ação na matrícula do imóvel registrado sob o n. 21.965, no Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Itapema, mencionando a dação em garantia", para garantir a obtenção da certidão positiva com efeitos de negativa. Requer a antecipação da tutela recursal, para que seja suspensa a exigibilidade do tributo e, subsidiariamente, para lhe possibilitar a prestação de caução, objetivando a expedição de certidão positiva com efeito de negativa e, ao final, o provimento do recurso.

A antecipação da tutela recursal foi parcialmente deferida, "para possibilitar à agravada, mediante termo de caução do imóvel, com a devida averbação na matrícula, a expedição de certidão positiva com efeitos de negativa" (evento 6).

A Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou pela ausência de interesse no recurso (evento 17).

Esse é o relatório.

VOTO

Ab initio, porque cabível o recurso (artigo 1.015, inciso I, do CPC/2015) e preenchidos os requisitos de admissibilidade (artigos 1.016 e 1.017 do CPC/2015), o presente agravo de instrumento deve ser conhecido.

O recurso comporta provimento.

A literalidade do artigo 300 do CPC/2015 não deixa margem à dúvida de que o deferimento da tutela de urgência depende, necessariamente, do preenchimento dos requisitos da probabilidade do direito e do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, de forma cumulativa.

Extrai-se do referido dispositivo legal:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

No tocante à probabilidade do direito, leciona Eduardo Arruda Alvim:

[...] deve ser possível ao julgador, dentro dos limites permitidos de seu conhecimento ainda não exauriente da causa, formar uma convicção ou uma avaliação de credibilidade sobre o direito alegado. O deferimento do pedido e da medida excepcional pressupõe, nesse sentido, a consideração, pelo julgador, de que existem grandes e palpáveis chances de que haverá correspondência entre o conteúdo da cognição aferida no momento da tutela provisória e o conteúdo da cognição obtida na decisão final de mérito" (Tutela Provisória. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 153).

Quanto ao perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, disciplinam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

[...] a tutela provisória é necessária simplesmente porque não é possível esperar, sob pena de o ilícito ocorrer, continuar ocorrendo, ocorrer novamente, não ser removido ou de dano não ser reparado ou reparável no futuro. [...] Vale dizer: há urgência quando a demora pode comprometer a realização imediata ou futura do direito" (Novo Código de Processo Civil comentado. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 383).

In casu, a discussão central relaciona-se à incidência de ISSQN ou ICMS sobre os serviços desenvolvidos pela Agravante.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5659/MG, em 24.02.2021, passou a entender pela incidência de ISSQN nas operações envolvendo o licenciamento ou cessão do direito de uso de um programa de computador, seja ele considerado "de prateleira" e vendido de forma padrão ou se tratando de software personalizado, desenvolvido exclusivamente para o contratante.

O posicionamento da Suprema Corte se deu por três argumentos principais: i) o Poder Legislativo, ao elencar o subitem "1.05" na lista anexa da Lei Complementar n. 116/03, definiu um critério objetivo para a incidência tributária do ISSQN, uma vez que pela Lei n. 9.609/98 o uso de softwares é objeto de contrato de licenciamento; ii) o software se trata de uma criação intelectual, materializada pelo trabalho humano, fato que configura uma obrigação de fazer; e iii) um dos modelos mais comuns de prestação de serviços envolvendo o software atualmente, é o Software-as-a-Service (SaaS), o qual se caracteriza pelo acesso do consumidor a aplicativos disponibilizados pelo fornecedor na internet, permanecendo online e armazenado em nuvem, não sendo necessário o uso de armazenamento no disco rígido do computador do usuário, o que guarda circunstâncias que atraem a incidência do ISSQN.

O voto, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, restou assim ementado:

Ação direta de inconstitucionalidade. Direito Tributário. Lei nº 6.763/75-MG e Lei Complementar Federal nº 87/96. Operações com programa de computador (software). Critério objetivo. Subitem 1.05 da lista anexa à LC nº 116/03. Incidência do ISS. Aquisição por meio físico ou por meio eletrônico (download, streaming etc). Distinção entre software sob encomenda ou padronizado. Irrelevância. Contrato de licenciamento de uso de programas de computador. Relevância do trabalho humano desenvolvido. Contrato complexo ou híbrido. Dicotomia entre obrigação de dar e obrigação de fazer. Insuficiência. Modulação dos efeitos da decisão.1. A tradicional distinção entre software de prateleira (padronizado) e por encomenda (personalizado) não é mais suficiente para a definição da competência para a tributação dos negócios jurídicos que envolvam...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT