Acórdão Nº 5001498-07.2021.8.24.0086 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 28-07-2022

Número do processo5001498-07.2021.8.24.0086
Data28 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001498-07.2021.8.24.0086/SC

RELATOR: Desembargador JÂNIO MACHADO

APELANTE: IVALDIR COELHO AVILA (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Ivaldir Coelho Avila ajuizou "ação declaratória de inexistência de débito e nulidade contratual c/c restituição de valores, com pedido de tutela de urgência e indenização por dano moral" contra Banco BMG S/A sob o fundamento de que não contratou empréstimo via cartão de crédito com reserva de margem consignável, a razão do pedido de declaração de inexistência da contratação e da reserva de margem consignável, além da restituição em dobro e pagamento por dano moral.

O ilustre magistrado concedeu o benefício da justiça gratuita, indeferiu a tutela de urgência e inverteu o ônus da prova (evento 4). Após alguns percalços de ordem processual, a instituição financeira ofereceu contestação (evento 20), sobrevindo a impugnação (evento 23). Na sequência, o digno magistrado Guilherme Mazzucco Portela julgou improcedentes os pedidos iniciais (artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil) (evento 25).

Irresignado, o mutuário interpôs recurso de apelação cível (evento 31) sustentando: a) a declaração de nulidade do pacto; b) o direito à repetição em dobro do indébito; c) a reparação pelo abalo moral suportado e; d) a redistribuição do ônus da sucumbência com a fixação dos honorários no máximo legal.

Em cumprimento à determinação judicial proferida na ação de execução de título extrajudicial n. 0300603-97.2017.8.24.0086, sendo executado o mutuário, foi certificada a penhora no rosto destes autos (eventos 35/36) e, com a resposta da instituição financeira (evento 37), os autos vieram a esta Corte.

VOTO

Por meio do contrato de cartão de crédito consignado n. 40230130, datado de 16.11.2015, a instituição financeira efetuou a reserva de margem consignável no benefício previdenciário (evento 1, anexo 9) e o mutuário teve depositado em sua conta bancária, via TED (Transferência Eletrônica Disponível), o valor de R$1.969,50 em 19.11.2015, bem como teria solicitado a emissão de cartão de crédito e permitido o pagamento de faturas mediante consignação em folha de pagamento, não sendo especificado o percentual da margem consignável reservado à quitação de despesas do cartão de crédito (evento 20, contrato 2, comprovante 6).

O número de parcelas, seus valores e a data do vencimento não constam no pacto. Não há prova da utilização do cartão de crédito, verificando-se que o valor foi depositado em conta bancária, o que evidencia a provável intenção de contratar o empréstimo consignado.

O débito da reserva de margem consignável e a cobrança de taxas de juros acima daquelas praticadas no mercado para operações de crédito consignado a beneficiários do INSS divulgadas pelo Banco Central (2,21% ao mês e 29,92% ao ano, referente ao mês de novembro de 2015, enquanto que a pactuada foi de 3,36% ao mês e 49,49% ao ano), são práticas consideradas abusivas, nos termos do artigo 39, incisos I, III e IV, do Código de Defesa do Consumidor.

Ao impor ao consumidor uma modalidade de crédito mais onerosa, a instituição financeira violou os deveres de informação, da lealdade contratual e da boa-fé objetiva (artigo 6º, incisos III, IV e V, do Código de Defesa do Consumidor), ônus do qual não está dispensada, por si só, pela indisponibilidade circunstancial de margem para o empréstimo consignado na época da contratação.

Logo, reconhecida a abusividade das cláusulas em desarmonia com a escolha do consumidor, segundo entendimento da Câmara, determina-se a conversão do contrato em empréstimo consignado (princípio da conservação do negócio jurídico, artigo 170 do Código Civil), com a compensação dos valores já descontados (apelação cível n. 5001339-76.2019.8.24.0040, relator o desembargador Rodolfo Tridapalli, j. em 22.4.2021).

E, mesmo diante da indisponibilidade de margem para empréstimo consignado, não se mostra possível a emissão de boleto e tampouco se justifica a necessidade de retorno das partes ao estado anterior, uma vez que, ao tempo da contratação, eventual esgotamento da margem era de conhecimento da instituição financeira, a quem é imputado o risco da atividade.

Outrossim, a singular circunstância de, em outras Câmaras desta Corte, ter prevalecido a compreensão de legalidade do pacto em razão da indisponibilidade de margem ou da presença de imagem do cartão de crédito, como dito na resposta ao recurso (evento 37, fls. 4/7), em nada altera o resultado aqui encontrado. Primeiro, porque não se está diante de nenhuma das situações especificadas no artigo 927 do Código de Processo Civil. Segundo, porque não há identidade entre as partes envolvidas nos diferentes feitos, sendo afastada qualquer possibilidade de existir coisa julgada (artigo 506 do Código de Processo Civil).

O dever de indenizar surge quando ficam demonstrados os requisitos bem especificados pelo artigo 186 do Código Civil: a) o comportamento culposo; b) a presença de um dano e; c) o nexo de causalidade.

A demonstração da culpa não é necessária, uma vez que a responsabilidade civil da instituição financeira, na qualidade de prestadora de serviços, é objetiva, conforme estabelece o artigo 14 da Lei n. 8.078, de 11.9.1990. A existência de descontos mensais indevidos em verba de caráter alimentar (benefício previdenciário) demonstra os danos relacionados diretamente à manutenção da vida do consumidor e de sua família. Portanto, o abalo moral decorrente da atitude lesiva da instituição financeira, no caso concreto, não é presumido, o que se afirma a partir da prova constante do processo, levando-se em conta as circunstâncias fáticas e específicas.

O mutuário é idoso e percebeu, no mês de junho de 2021, aposentadoria por invalidez previdenciária (no valor líquido de R$1.343,99) (evento 1, identidade 5, extrato 7). Recebe proteção especial do legislador constitucional pelas suas condições de consumidor (artigo 5º, inciso XXXII), idade avançada e invalidez (artigos 201, inciso I e 203, inciso I). Daí afirmar-se que o mutuário é uma pessoa hipervulnerável e, pois, merecedor de uma atenção especial pelo Judiciário.

No caso concreto, tem-se por suficiente e necessário o arbitramento de R$5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por dano moral, estando preservados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, com a incidência de correção monetária desde a data em que o valor foi mensurado (a partir do presente julgamento), adotando-se o INPC como fator de atualização e juros moratórios desde o evento danoso (10.12.2015, evento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT