Acórdão Nº 5001509-11.2020.8.24.0235 do Quarta Câmara Criminal, 27-05-2021

Número do processo5001509-11.2020.8.24.0235
Data27 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5001509-11.2020.8.24.0235/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: MARCOS WILLIAN PIRES DE LIMA DA SILVA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Herval D'Oeste, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Marcos Willian Pires de Lima da Silva, imputando-lhe a prática dos delitos capitulados no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e no art. 29, § 1°, III, da Lei n. 9.605/98, pois, segundo consta na inicial:
Fato 1:
Segundo se infere do auto de prisão em flagrante incluso, no dia 8 de setembro de 2020, por volta das 14h, em trânsito na ponte Jorge Lacerda, no sentido Herval d'Oeste/Joaçaba, o denunciado Marcos Willian Pires de Lima da Silva foi flagrado transportando e guardando sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, 956gr (novecentas e cinquenta e seis gramas) da substância entorpecente vulgarmente conhecida por "maconha", dividida em dois tabletes, e duas pedras de substância conhecida por "cocaína", pesando aproximadamente 20gr (vinte gramas)1 , embaladas em um invólucro de cor azul, as quais eram destinadas ao comércio ilícito, além de R$ 2.153,00 (dois mil cento e cinquenta e três reais) em espécie e sem origem lícita comprovada, numerário proveniente do tráfico de drogas, bem como apetrechos utilizados para pesagem da droga, consistente em uma balança de precisão e uma faca de serrinha2 , além de um aparelho celular3 (levantamento fotográfico do evento n. 1 do APF)
Fato 2:
Em seguida, após a apreensão, os policiais militares deslocaram-se até a residência do acusado, localizada na Rua Altino Capistrano de Jesus, 52, loteamento Jardim Itália, em Joaçaba/SC e, franqueada a entrada, constataram que Marcos Willian Pires de Lima da Silva mantinha em cativeiro, confinados em duas gaiolas, um canário da terra e dois (macho e fêmea) pinta silva, aves espécimes da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente4 , notadamente a autorização para Criação Amadora de Passeriformes emitida pelo IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - conforme prevê a Instrução Normativa do IBAMA n. 10, de 20 de setembro de 2011 (Evento 1, DENUNCIA1, dos autos originários).
Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedentes os pedidos formulados na denúncia, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de reclusão e 6 (seis) meses de detenção, em regime inicial fechado, além do pagamento de 576 (quinhentos e setenta e seis) dias-multa, fixados no mínimo legal, pela prática dos crimes previstos no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e no art. 29, §1 °, III, da Lei n. 9.605/98, na forma do art. 69, caput, do Código Penal (Evento 155, SENT1, dos autos originários).
Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou pela aplicação do perdão judicial previsto no art. 29, § 2°, da Lei n. 9.605/98; a concessão da minorante descrita no § 4° do art. 33 da Lei n. 11.343/06; e a restituição dos valores apreendidos (Evento 9, RAZAPELA1).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 14, CONTRAZAP1), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio da Exma. Dra. Jayne Abdala Bandeira, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 17, PROMOÇÃO1)

Documento eletrônico assinado por SIDNEY ELOY DALABRIDA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 840961v12 e do código CRC 78e1d30c.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SIDNEY ELOY DALABRIDAData e Hora: 9/4/2021, às 16:31:14
















Apelação Criminal Nº 5001509-11.2020.8.24.0235/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: MARCOS WILLIAN PIRES DE LIMA DA SILVA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


VOTO


Presentes os requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se à análise do seu objeto.
1 Crime ambiental
A defesa pretende a aplicação do perdão judicial previsto no art. 29, § 2°, da Lei n. 9.605/98.
No caso, a materialidade e autoria delitiva são incontestes, conforme se depreende do auto de prisão em flagrante (fl. 2), boletim de ocorrência (fls. 3-8), termo de entrega (fl. 23, todos do Evento 1, INQ1, inquérito policial n. 5001501-34.2020.8.24.0235), e da prova oral coligida em ambas as fases da persecução penal.
Registra-se que os policiais militares Dairon Rafael Bortoli e Roberto Ângelo Costenaro, em juízo, confirmaram que encontraram 3 (três) pássaros sem anilha na casa do réu e que foram orientados pela Polícia Militar Ambiental a realizar a apreensão das aves (depoimentos audiovisuais, Evento 126, VÍDEO1, autos originários).
Desse modo, é inegável que o apelante mantinha em cativeiro, confinados em gaiolas, um canário-da-terra e dois (macho e fêmea) pintassilva, aves espécimes da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, notadamente a autorização para Criação Amadora de Passeriformes emitida pelo IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, conforme prevê a Instrução Normativa do IBAMA n. 10, de 20 de setembro de 2011.
Dito isso, passa-se à análise da controvérsia atinente à aplicação do perdão judicial previsto no § 2º do art. 29 da Lei n. 9.605/98.
Segundo o referido dispositivo legal: "No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar pena".
Sobre o assunto, Luiz Regis Prado leciona:
[...] trata do perdão judicial no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, podendo o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Trata-se de norma penal em branco, já que as espécies silvestres ameaçadas de extinção encontram-se enumeradas em norma penal extrapenal (Portaria 1.522/1989, Ibama)" (Direito penal do ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação do território e biossegurança (com a análise da Lei 11.105/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 240).
A propósito, extrai-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
[...] Para fins de incidência do benefício do art. 29, § 2°, da Lei9.605/1998 - que não configura direito absoluto do infrator, mas, ao revés, prerrogativa do juízo, com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, dependentemente das circunstâncias do caso concreto -, incumbe ao beneficiário simultaneamente provar, como ônus seu, o genuíno caráter de "guarda doméstica" e não se tratar, "ainda que somente no local da infração", de "espécie silvestre ameaçada de extinção" (REsp n. 1.686.089/MG, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. em 7/12/2017, DJe de 19/12/2017).
Lembra-se, ademais, que a garantia ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito fundamental constitucionalmente assegurado no art. 225 da Constituição Federal, in verbis: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".
O inciso VII do § 1º do referido dispositivo constitucional estabelece: "§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: [...] VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade".
In casu, infere-se dos autos que foram apreendidos 1 (um) canário-da-terra (Sicalis flaveola) e dois pintassilva (Spinus yarrellii), confinados em duas gaiolas, aves espécimes da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.
Em consulta ao Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (Volume 3), verifica-se que as aves identificadas como da espécies Spinus yarrellii (pintassilva) constam na categoria de risco de extinção e critérios "Vulnerável (VU) B2ab(v)" (Disponível em: https://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/comunicacao/publicacoes/publicacoes-diversas/livro_vermelho_2018_vol3.pdf - p. 623).
Desse modo, tendo em vista que o acusado mantinha pássaros ameaçados de extinção sob guarda doméstica, inviável a concessão do perdão judicial inserido no art. 29, § 2º, da Lei n. 9.605/98.
2 Do crime contra a saúde pública
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