Acórdão Nº 5001548-67.2020.8.24.0086 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 26-01-2023

Número do processo5001548-67.2020.8.24.0086
Data26 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001548-67.2020.8.24.0086/SC



RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI


APELANTE: JEAN CARLOS PEREIRA (AUTOR) APELANTE: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Da ação
Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 16), em atenção aos princípios da celeridade e da economia processuais, por retratar com fidedignidade o traquejo da instrução havido na origem, in verbis:
1. Perante este Juízo, JEAN CARLOS PEREIRA propõe a presente "ação revisional de contrato bancário" em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.
Alega, em síntese, que: [a] o contrato bancário realizado com o demandado contém diversas ilegalidades, dentre as quais específica: as tarifas de IOF; registro do contrato; avaliação do bem; os juros remuneratórios; a capitalização de juros em periodicidade inferior a anual; [b] a descaracterização de sua mora em virtude das ilegalidades do contrato; e [c] a aplicação da teoria da imprevisão e mdecorrência da pandemia do coronavírus.
Pede liminarmente o pagamento em juízo da parcela incontroversa. Ao final, pugna por sejam revistas as cláusulas ilegais. Requer os benefícios da gratuidade, os quais são concedidos (ev. 6).
Citada, a parte ré oferece resposta em forma de contestação (ev. 10). Preliminarmente, apresenta: [a] impugnação ao pedido de justiça gratuita; [b] ausência de poderes específicos na procuração para litigar contra instituição financeira; [c] incompetência territorial, pois o documento apresentado pelo autor não é válido; [d] não houve pretensão resistida; [e] a petição inicial é inepta, pois o autor não cumpriu o artigo 330, §2º, do CPC; e [f] o valor da causa está inadequado. No mérito defende, em síntese, inexistir qualquer abusividade no contrato de financiamento.
Pede a improcedência do pleito.
Há juntada de documentos; e impugnação à contestação (ev. 14).
Da sentença
O Juiz de Direito, Dr. GUILHERME MAZZUCCO PORTELA, da Vara Única da Comarca de Otacílio Costa, julgou procedentes, em parte, os pedidos deduzidos na exordial, cujo excerto dispositivo transcreve-se abaixo (Evento 16):
3. Assim, quer pelo expressamente consignado nesta decisão, quer por tudo que do seu teor decorre, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pleito inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil para, em consequência, reconhecer a abusividade da cobrança da tarifa de registro de contrato e tarifa de avaliação, determinando a devolução e compensação simples desses valores.
Diante da sucumbência mínima da parte ré, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, bem como ao pagamento dos honorários de advogado em favor do procurador da parte contrária, que fixo em 12% sobre o valor da causa, observadas as condicionantes do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Suspendo a exigibilidade do pagamento de tais ônus contra si, nos termos do art. 98, §3º, do Código de Processo Civil.
Transitada em julgado, certifique-se e, providencie-se a cobrança das custas por meio da GECOF. Não havendo manifestação em 30 dias, arquivem-se.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Da Apelação Cível da Instituição Financeira
Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o Réu BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. interpôs o presente recurso de Apelação Cível contra a sentença (Evento 21).
Apresentou impugnação à gratuidade da justiça concedida ao Autor, que limita-se a informar que não possui condições de arcar com as custas presente demanda. Contudo, não comprova seus rendimentos mensais e arca com a prestação do contrato celebrado junto ao Banco, cuja prestação mensal perfaz o montante de R$ 1.200,62 (mil e duzentos reais e sessenta e dois centavos).
Aventa a inépcia da petição inicial por descumprimento ao requisito do disposto no art. 330, § 2º do CPC, tendo em vista a ausência de indicação do valor incontroverso - que deve corresponder, no mínimo, ao valor de capital ainda não amortizado do empréstimo, nos termos do art. 783 do CC.
Pugna pela reforma da sentença a fim de que seja reconhecida a legalidade da Tarifa de Cadastro e da Tarifa de Avaliação de Bens.
Observa que não existe nos autos comprovação objetiva quanto à abusividade nos valores cobrados pelo Banco em comparação com os parâmetros de mercado, tampouco evidências que denotem o desalinhamento de procedimento ou prática abusiva.
O Banco sustenta a legalidade da cobrança de tarifas de ressarcimento por serviço prestado por terceiro, registro de contrato, avaliação de bens, comissão de correspondente bancário, gravame e seguro.
Por fim, argui o descabimento da repetição do indébito em dobro.
Ante o exposto, requer o provimento do Apelo para julgar improcedentes os pedidos da prefacial.
Da Apelação Cível do Autor
O Autor manejou recurso de Apelação Cível com intuito de reforma parcial da sentença (Evento 27).
Argumenta que resta claro que o custo efetivo total de 25,46% a.a. é o valor que deve ser analisado para fins de revisão contratual, pois trata-se do valor efetivamente cobrado em contrato, e não a taxa de juros anual de 21,78% a.a., embora igualmente muito acima da taxa média.
Suscita a abusividade da incidência da capitalização de juros.
O Autor ainda impugna a cobrança de IOF. Diante da má-fé da Instituição Financeira em não permitir a possibilidade de pgamento do IOF à vista, requera devolução em dobro dos valores cobrados a maior.
Finalmente, permanecendo saldo favorável ao Autor após a compensação dos valores pagos com os valores em aberto, aduz ser plenamente justificável o deferimento da repetição do indébito dobrada.
Requer seja provido o recurso de Apelação para julgar procedentes os pedidos da prefacial.
Das contrarrazões
O Autor apresentou contrarrazões (Evento 32).
O Banco ofereceu contrarrazões, na qual argui a inadmissibilidade por ofensa ao princípio da dialeticidade recursal (Evento 34).
Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.
Após a redistribuição, vieram-me conclusos.
Este é o relatório

VOTO


I - Da admissibilidade
a) Da gratuidade da justiça
O Banco impugna o deferimento da gratuidade da justiça.
Entretanto, a irresignação não merece prosperar.
Denoto que o Autor instruiu a petição inicial com documentos que comprovam o direito ao benefício da gratuidade da justiça (Evento 1 - DECLPOBRE3, OUT6 e OUT7).
Aliás, nos termos do art. 99, § 4º do CPC, "A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.".
Portanto, correto o deferimento da benesse da gratuidade da justiça em favor do Autor. Consequentemente, a parte está dispensada do recolhimento do preparo recursal.
b) Da dialeticidade recursal
Em contrarrazões, o Banco ventila a preliminar de ofensa ao princípio da dialeticidade recursal, visto que o Autor não rebateu os argumentos expostos pelo Magistrado a quo.
Compulsando os autos, denoto que o Autor impugnou de forma especificada a sentença de procedência parcial.
Nesse jaez, o édito do art. 1.010, III do CPC foi observado.
Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço dos recursos.
II - Do julgamento do mérito
Trata-se de recursos interpostos por JEAN CARLOS PEREIRA e BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. contra a sentença de parcial procedência dos pedidos formulados na "Ação Revisional de Juros com Pedido de Tutela de Urgência Antecipada e Produção Anecipada de Prova".
a) Da inépcia da petição inicial
O Banco ventila a preliminar de inépcia da petição inicial.
Segundo a dicção do art. 330, § 2º do CPC "Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.".
Perscrutando os autos, concluo que a petição inicial está correta, pois especificou as cláusulas contratuais que considera abusivas, discriminou os pedidos e quantificou o valor incontroverso, este fixado com base em cálculo atuarial (Evento 1 - INIC1, fls. 34/35 e CALC9).
A propósito do assunto, colaciono julgado desta Terceira Câmara de Direito Comercial em caso análogo:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATOS BANCÁRIOS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DE AMBAS AS PARTES. [...] 2. DO RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ. 2.1. INÉPCIA DA INICIAL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO VALOR INCONTROVERSO DA DÍVIDA. INVIABILIDADE. INDICAÇÃO, À INICIAL, DE TODOS OS ENCARGOS ENTENDIDOS COMO ILEGAIS OU ABUSIVOS, COM APONTAMENTO DO RESPECTIVO VALOR. PREENCHIMENTO DA EXEGESE DO ARTIGO 330, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. [...] (TJSC, Apelação n. 0306756-53.2015.8.24.0075, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Des. OSMAR MOHR, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 01/12/2022 - Grifei).
No mesmo norte:
EMPRÉSTIMOS PESSOAIS. REVISÃO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO DEMANDADO. INÉPCIA DA INICIAL. INOCORRÊNCIA. Cumprido o requisito do art. 330, § 2º, não há falar em inépcia da inicial em virtude da ausência de indicação do valor incontroverso da dívida. [...] APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5002169-85.2020.8.24.0079, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Des. GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 29/10/2020 - Grifei).
Por tais fundamentos, concluo que os requisitos da petição inicial estão preenchidos.
Sendo assim, refuto a proemial.
b) Do Custo Efetivo Total
O Autor pretende a limitação dos juros remuneratórios, sob a alegação de onerosidade excessiva na cobrança dos juros conforme ajustados com o Banco.
Nos termos da Resolução CMN n. 3.517/2007, que "Dispõe sobre a informação e a divulgação do custo efetivo total correspondente a todos os encargos e despesas de operações de crédito e de arrendamento mercantil financeiro, contratadas ou ofertadas a pessoas...

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