Acórdão Nº 5001552-84.2019.8.24.0104 do Terceira Câmara Criminal, 02-08-2022

Número do processo5001552-84.2019.8.24.0104
Data02 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5001552-84.2019.8.24.0104/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO

APELANTE: ADRIANO PIANEZI APELANTE: VILSON MANOEL NUNES APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: IAGO NATAN CARDOSO (RÉU) APELANTE: ZAQUEU FARIA (RÉU) APELANTE: DJONNY RAULINO (RÉU) APELANTE: MARCOS DOS SANTOS (RÉU) APELANTE: THUAN MACHADO OLIVEIRA (RÉU) APELANTE: JOAO HENRIQUE KASPAREIT (RÉU) APELADO: DEISY NASCIMENTO DOS SANTOS APELADO: OS MESMOS APELADO: PAULO ROBERTO VIEIRA CAVALERI (RÉU)

RELATÓRIO

Denúncia: O ministério público ofereceu denúncia, aditada em 03/02/2020 e recebida em 06/02/2020 (evento 102, DOC1), nos seguintes termos (evento 91, DOC1):

FATO 01 - Do crime de organização criminosa (art. 2º, caput e §§ 2º e 3º, da Lei n. 12.850/13)

Inicialmente, cumpre mencionar que a Organização Criminosa Primeiro Grupo Catarinense - PGC nasceu no Estado de Santa Catarina no ano de 2003, na ala de segurança máxima da Penitenciária da Capital. Aponta-se como seu fundador o detento Nelson de Lima, vulgo "Setenta", tendo como objetivo primeiro promover união dos sentenciados, a redução da opressão e melhorias nas condições carcerárias.

A consolidação da hoje maior facção criminosa do Estado teve início no mês de maio daquele mesmo ano, quando foi inaugurada a Penitenciária de São Pedro de Alcântara, para onde foram transferidos reclusos de alta periculosidade de Florianópolis e de outras trinta e cinco unidades prisionais do Estado de Santa Catarina.

A partir de então, o grupo foi se organizando e somando filiados, inicialmente dentro do estabelecimento prisional e, conforme os já faccionados atingiam a liberdade, também por criminosos ainda não descobertos pelas forças de segurança, demonstrando toda sua estrutura e força nos ataques desencadeados no ano de 2012 em todo o Estado de Santa Catarina.

Por ser uma espécie de irmandade que visa lealdade de seus filiados num modelo quase familiar, o ingresso na facção criminosa somente se dá por indicação de um membro já faccionado, chamado "batismo", de forma que os faccionados sempre serão conhecidos pelo seu "padrinho". Aliás, o tratamento entre os faccionados imita a relação familiar, sendo que o batizado sempre tratará quem lhe concedeu o ingresso na organização como padrinho, e sempre será por este tratado como afilhado.

Já a relação entre faccionados sem o vínculo do batismo é de irmandade, sempre chamando uns aos outros de irmãos, e suas esposas/companheiras de cunhadas. A partir do momento que ingressam na organização criminosa, como são batizados, os agora faccionados não usam nem são mais chamados pelo seu nome civil, mas por vulgos escolhidos por eles, elemento que revela a ideia de "renascimento", de assunção de uma identidade a serviço do crime organizado.

Foi somente com a apreensão de documentos dentro de presídios, de anotações e de atas das reuniões do grupo em operação policiais que se conseguiu identificar parte da estrutura do grupo, formalizada, inclusive, em uma espécie de estatuto.

O propósito do PGC, formalizado até em estatuto próprio, visa, basicamente, uma expansão da facção para uma predominância criminosa. Além disso, é objetivo do PGC sedimentar uma estrutura para ir de encontro ao sistema, causando temor ao Poder Judiciário, Ministério Público, sistema prisional e as forças policiais, com intuito de conseguir regalias nas unidades prisionais e continuar a organizar o crime, mesmo de dentro dos estabelecimentos penais.

O PGC se mantém por meio do pagamento de mensalidade (chamada de dízimo ou caixa) por seus integrantes, e também pela venda de rifas. Essa arrecadação é proveniente principalmente do tráfico ilícito de drogas, locação de armas e de outros instrumentos para práticas de furtos, roubos e outras modalidades delitivas.

A estrutura básica da facção é formada, na cúpula, por dois conselhos: um vitalício, chamado também de 1º Ministério, composto por 7 membros permanentes (vitalícios, como o próprio nome diz), que detém os poderes supremos do grupo, como "sumariar vidas e excluir faccionados". Inclusive, se não conseguir contato com os outros membros, um integrante do 1º Ministério pode tomar essas decisões sozinho. Somente a massa, ou seja, o conjunto de faccionados, pode depor um membro vitalício. O outro conselho se denomina 2º Ministério, o qual também é composto por 7 integrantes, estes obrigatoriamente, durante o mandato, têm de estar recolhidos na Penitenciária de São Pedro de Alcântara. Referido conselho pode tomar decisões de atribuição do 1º Ministério, se não for possível a este grupo tomar a decisão, assim como cassar a decisão de membro do 1º Ministério tomada isoladamente.

Após a apreensão do aparelho celular de ZAQUEU FARIAS e com o acesso autorizado pelo Juízo aos celulares apreendidos, constatou-se que os denunciados MARCOS DOS SANTOS, DJONNY RAULINO, ZAQUEU FARIA e THUAN MACHADO OLIVEIRA integram, de forma estável e permanente, o Primeiro Grupo Catarinense - PGC, organização criminosa composta por mais de 4 (quatro) pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com objetivo de obter, direta e indiretamente, vantagens de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais como tráfico de drogas, roubos, comércio e porte ilegal de armas de fogo/munições, homicídios, incêndios, entre outras atividades criminosas, cujas penas máximas são superiores a quatro anos de reclusão.

Consoante se verifica do Relatório de Investigação, os denunciados MARCOS DOS SANTOS e DJONNY RAULINO integram o chamado "Primeiro Ministério" da facção, colegiado máximo do grupo criminoso, responsável por ordenar as ações e coordenar toda a massa de membros faccionados. Conforme amplamente comprovado, MARCOS e DJONNY continuam comandando o Primeiro Grupo Catarinense - PGC mesmo estando há cerca de 10 (dez) anos presos, agindo de modo a fornecer suporte logístico, armamento, coletes e explosivos para as ações criminosas de interesse da facção criminosa.

Registra-se que MARCOS e DJONNY já foram condenados anteriormente por integrarem o Primeiro Grupo Catarinense, porém mantiveram-se nos quadros da facção até os dias atuais, exercendo papel de liderança estadual.

Também se colhe da investigação que ZAQUEU e THUAN integram a referida organização criminosa ao menos desde meados de 2019, não exercendo qualquer cargo de liderança, porém mantendo-se nos quadros da facção e utilizando-se dos "benefícios" de estar associado, como o empréstimo de materiais bélicos mediante a contribuição de 10% (dez por cento) dos lucros, na forma do estatuto do PGC.

Além disso, ZAQUEU atuava como fornecedor de armas para a referida facção, tendo em vista que mantinha em seu sítio, localizado na Estrada Geral da Vargem Grande, em Apiúna/SC, verdadeira fábrica clandestina de arma de fogo, que posteriormente eram negociadas para outros membros da organização criminosa com o intermédio de MARCOS.

FATO 02 - Associação Criminosa

No ano de 2019, em data e horário a ser melhor esclarecido durante a instrução processual, porém ao menos desde o mês de novembro, os denunciados ZAQUEU FARIA, THUAN MACHADO OLIVEIRA, JOÃO HENRIQUE KASPAREIT, IAGO NATAN CARDOSO, VILSON MANOEL NUNES, ADRIANO PIANEZI e o falecido Luciano Schutel, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, associaram-se para o fim específico de cometer crimes.

Segundo se apurou, os denunciados associaram-se com o objetivo de praticar crimes contra o patrimônio, mediante o uso de arma de fogo, na região do Vale do Itajaí, mais precisamente no Município de Apiúna.

Apurou-se, ainda que, o denunciado JOÃO HENRIQUE, que trabalhava na agência do Banco Bradesco daquela cidade, repassou para THUAN a informação acerca do horário em que os caixas eletrônicos seriam abastecidos, com detalhes da operação.

Assim, os denunciados ZAQUEU, THUAN, IAGO e Luciano Schutel, no dia 17 de dezembro de 2019, por volta das 14h50min, se dirigiram até a referida agência bancária e realizaram o assalto, sendo que THUAN e IAGO entraram no local, enquanto ZAQUEU e Luciano permaneceram do lado de fora fazendo a segurança dos comparsas.

Ademais, o denunciado VILSON ficou responsável por fornecer a "casa segura" ao grupo, local que esperariam a "poeira baixar", levando-os posteriormente até a região de mata do Ribeirão Carvalho. Já ADRIANO foi responsável pela chamada "segunda fuga", após os assaltantes abandonarem os veículos FORD/Fiesta e HONDA/Civic, embarcando no CHEVROLET/Agile dirigido por ADRIANO, que os levou até a residência indicada por VILSON.

Frisa-se que os denunciados estavam fortemente armados, utilizando fuzil e armas de grosso calibre.

FATO 03 - Latrocínio tentado

Consta do presente caderno indiciário que, ao menos desde novembro de 2019, o grupo criminoso formado por MARCOS DOS SANTOS, DJONNY RAULINO, ZAQUEU FARIA, THUAN MACHADO OLIVEIRA, JOÃO HENRIQUE KASPAREIT, IAGO NATAN CARDOSO, VILSON MANOEL NUNES, ADRIANO PIANEZI e o falecido Luciano Schutel, planejaram o roubo da Agência do Banco Bradesco, localizada na Avenida Quintino Bocaiúva, n. 325, Município de Apiúna/SC.

As armas utilizadas pela associação criminosa foram fornecidas pelo Primeiro Grupo Catarinense - PGC, pelo intermédio dos denunciados MARCOS e DJONNY, integrantes do 1ª Ministério da organização criminosa, mediante o pagamento de 10% (dez por cento) dos lucros obtidos. Registra-se que o fuzil AK-47, calibre .7,62 foi "emprestado" pelo núcleo de Joinville da referida facção, porquanto o fuzil M4, calibre .556, foi buscado por ZAQUEU em Florianópolis, pois era utilizado na contenção do avanço da facção rival PCC na capital. Ademais, o denunciado MARCOS forneceu a sua própria pistola calibre .9mm, que estava guardada na sua residência, para o grupo.

Além disso, o grupo contava com as informações privilegiadas prestadas pelo denunciado JOÃO HENRIQUE, funcionário da agência bancária, que repassava ao grupo toda a rotina administrativa do estabelecimento, como...

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