Acórdão Nº 5001571-70.2022.8.24.0012 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 13-04-2023

Número do processo5001571-70.2022.8.24.0012
Data13 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001571-70.2022.8.24.0012/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: MARIA BERNADETE DA CRUZ (AUTOR)


RELATÓRIO


1.1) Da inicial
MARIA BERNADETE DA CRUZ ajuizou Ação Declaratória e Indenizatória em face de BANCO BMG S.A alegando, em síntese, que buscou a casa bancária para realizar um mútuo bancário na modalidade de empréstimo consignado mas, para sua surpresa e sem seu conhecimento, fora pactuado um contrato de cartão de crédito consignado, com inclusão de reserva de margem consignável em seu benefício previdenciário. Falou, ainda, que a conduta do Banco lhe causou prejuízos materiais e morais.
Assim, pleiteou a concessão da tutela de urgência antecipada para que a parte ré se abstenha de reservar margem consignável (RMC) destinada ao cartão de crédito e de efetuar o respectivo desconto em seu benefício previdenciário.
Pugnou pela declaração de nulidade do negócio jurídico, pela repetição do indébito e pela condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Por fim, acostou documentos, requerendo a concessão da justiça gratuita e a procedência dos pedidos inaugurais.
1.2) Da contestação
Citada, a parte ré ofereceu contestação (evento 12) alegando, preliminarmente, a ocorrência de prescrição e decadência.
No mérito, defendeu que a parte autora solicitou a emissão de cartão de crédito, sendo lícitas todas as cláusulas pactuadas, bem como sua contratação. Falou sobre a legalidade do cartão de crédito com margem consignável, da inexistência de responsabilidade civil e de danos morais. Por fim, reiterou sobre a inexistência de prova do dano moral e pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais.
1.3) Do encadernamento processual
Concedido o pedido de justiça gratuita e deferido o pedido de tutela de urgência antecipada (evento 8). Posteriormente, este pedido foi afastado no julgamento do Agravo de Instrumento n.º 5023896-75.2022.8.24.0000.
Manifestação sobre a contestação (evento 25).
1.4) Da sentença
Prestando a tutela jurisdicional, a Dra. ANDRE DA SILVA SILVEIRA proferiu sentença resolutiva de mérito (evento 29), nos seguintes termos:
Ante o exposto, ACOLHO PARCIALMENTE o pedido formulado por MARIA BERNADETE DA CRUZ contra BANCO BMG S.A, para o fim de: a-) DECLARAR NULO o contrato de empréstimo com garantia de reserva de margem consignável em cartão de crédito (RMC), com o retorno das partes ao statuos quo ante; b-) CONDENAR a parte a requerida a proceder à devolução dos valores descontados em dobro, corrigidos monetariamente pelo INPC, a partir de cada desconto indevido, com juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, mediante a compensação com o valor disponibilizado ao consumidor, o qual deverá ser acrescido de correção monetária pelo INPC desde o recebimento. JULGO EXTINTO O PROCESSO, com resolução de seu mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.
Diante da sucumbência recíproca, nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC, as custas processuais deverão ser suportadas na proporção de 70% pela parte ré e 30% pela parte autora, arbitrando-se os honorários em 10% do valor da condenação, cabendo 70% desse valor ao procurador da autora e 30% ao procurador da instituição financeira. Ante o deferimento dos benefícios da justiça gratuita à parte autora, suspendo, somente em relação a ela, a exigibilidade das despesas decorrentes de sua sucumbência, pelo prazo de 5 (cinco) anos, nos termos do art. 98, §§ 1º a 3º, do CPC.
1.5) Dos Embargos de Declaração
A parte ré ofertou Embargos de Declaração (evento 33), que foram rejeitados (eventos 42).
1.6) Do recurso
Irresignada, a parte ré interpôs recurso de Apelação Cível (evento 50) alegando, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, bem como as prejudiciais de prescrição e decadência. No mérito, reiterou a existência do pacto e a legalidade do contrato de cartão de crédito consignado, bem como a ausência de danos morais e de valores a repetir. Alternativamente, discorreu sobre a necessidade de minorar a indenização fixada e falou que a devolução deve ser na forma simples. Assim, requereu a reforma do julgado.
1.7) Das contrarrazões
Presente (evento 56).
É o relatório.


VOTO


2.1) Do objeto recursal
A discussão é sobre a validade do negócio jurídico entabulado entre as partes.
2.2) Do juízo de admissibilidade
Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, recolhido o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.
2.3) Da preliminar de cerceamento de defesa
Sustenta a casa bancária a ocorrência de cerceamento de defesa, porque "o Nobre Julgador não intimou as partes litigantes acerca do interesse na produção de provas, principalmente após a apresentação da réplica pela parte Autora, na qual impugnou os documentos acostados à defesa pela Instituição Financeira, simplesmente, proferiu sentença de parcial procedência, tolhendo a oportunidade de contraditório e ampla defesa" (evento 50, item 1, fl. 3).
Inicialmente, necessário pontuar que no sistema jurídico vigente o Magistrado, para chegar a conclusão sobre os fatos expostos, é regido pelo princípio da persuasão racional, o qual desdobra-se nos princípios do convencimento motivado (art. 371 do Código de Processo Civil) e da admissibilidade motivada da prova (arts. 369, 370 e 372 do Código de Processo Civil).
No que concerne o convencimento motivado, este concreta a liberdade do Magistrado na análise da prova constante do feito, independentemente de quem a tenha produzido, autorizando-o a pontuar sua relevância e seu peso, desde que de forma fundamentada.
Não diferente, a admissibilidade da prova motivada traz a liberdade de determinar, de ofício ou a requerimento, a produção de prova necessária à formação de seu convencimento, devendo indeferir aquelas inoportunas, desnecessárias, protelatórias e ilícitas, conquanto que o faça, igualmente, com a expressão de seus motivos.
Neste prumo, a Lei Processual, visando a celeridade processual, consubtanciada na razoável duração do processo (art. 139, inc. II, do Código de Processo Civil e art. 5º, inc. LXXVIII da CF), bem como na eficiente prestação jurisdicional (art. 37, caput da CF), contempla o instituto do julgamento antecipado da lide (art. 355 do Código de Processo Civil), o qual deve ser aplicado nas hipóteses de revelia ou quando a questão for unicamente de direito ou, sendo também de fato, ser desnecessária a produção de outras provas.
Também, não se pode esquecer, que a todo litigante é assegurado o contraditório e a ampla defesa, princípios gravados nos art. 7 º do Código de Processo Civil e 5º, inciso LV, da Constituição Federal, os quais devem ser ponderados juntamente com os supracitados, como bem expõe o doutrinador Robert Alexy, quando trata da sua teoria dos direitos fundamentais, a fim de equacionar uma efetiva, justa e célere resposta ao mérito, conforme predispõe a teoria eclética de Liebman.
Portando, dito de outra forma, a finalidade da prova é permitir ao julgador, seu destinatário final, a formação de convencimento quantos aos fatos e direitos alegados pelas partes, para que exponha de forma fundamentada.
No caso em apreço, verifica-se que ocorreu o julgamento antecipado da lide que, conforme rito estampado no Código de Processo Civil, precede a intimação das partes para indicar as provas que pretende produzir, uma vez que o Juízo a quo entende como suficiente o presente nos autos.
Logo, não há falar em cerceamento de defesa, uma vez que eram desnecessárias mais provas para o convencimento do julgador.
2.4) Das prejudiciais de mérito
2.4.1) Da prescrição
A discussão neste processo diz respeito essencialmente ao prazo prescricional aplicável a pretensão de declaração de inexistência de débito, cumulada com pedido de indenização por danos morais, originárias de contratos de reserva de margem consignáveis - RMC.
Pois bem, é indiscutível que tanto a pretensão declaratória, quanto o pedido condenatório, seja por repetição de indébito, seja por indenização por danos morais, advém da tese de inadimplemento contratual, decorrente de vício de consentimento, isto é, possuem a mesmo origem.
Sobre a prescrição nestas hipóteses, o Superior Tribunal de Justiça, por certo tempo, aplicou dois entendimentos distintos, um tomando o prazo quinquenal, consoante citado na decisão combatida, e outro com base no prazo decenal, na forma do artigo 205 do Código Civil.
Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, colocou fim a celeuma e uniformizou a incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual.
Vejamos:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.INAPLICABILIDADE DO ...

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