Acórdão Nº 5001573-49.2021.8.24.0085 do Terceira Câmara de Direito Civil, 30-08-2022

Número do processo5001573-49.2021.8.24.0085
Data30 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001573-49.2021.8.24.0085/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO IZIDORO HEIL

APELANTE: ZELINDA CORREIA (AUTOR) ADVOGADO: LUIZ FERNANDO CARDOSO RAMOS (OAB MS014572) APELADO: ASSOCIACAO COMERCIAL DE SAO PAULO (RÉU) ADVOGADO: HELIO YAZBEK (OAB SP168204) APELADO: BOA VISTA SERVIÇOS S.A. (RÉU) ADVOGADO: HELIO YAZBEK (OAB SP168204)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por ZELINDA CORREIA contra sentença proferida pelo juízo da Vara Única da Comarca de Coronel Freitas que, nos autos da "ação anulatória cumulada com indenização por danos morais", ajuizada em face de ASSOCIACAO COMERCIAL DE SAO PAULO e BOA VISTA SERVIÇOS S.A., julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, IV e VI do CPC.

Em suas razões, o apelante aduziu, em resumo, que: não agiu na tentativa de induzir o juízo a erro, devendo ser afastada a condenação em litigância de má-fé; desde o início da ação procurou cumprir todos os requisitos procedimentais para proporcionar o bom andamento processual; só é possível o indeferimento da petição inicial quando houver inépcia da inicial, ilegitimidade de parte, falta de interesse processual ou quando não houver atendimento ao disposto nos arts. 106 e 321; não há fundamento jurídico legal para o indeferimento prematuro do feito, porquanto apresentou inicialmente procuração devidamente assinada sem nenhum vício; não consta no rol de requisitos do artigo 105 do Código de Processo Civil o dever de que a procuração contenha poderes específicos; estão presentes pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; houve violação ao preceito constitucional do livre acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV, da CF), bem como ao direito de ação. Pugna, por fim, pelo provimento do recurso.

Com as contrarrazões (evento 37), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à análise de suas razões.

Na origem, a parte autora ajuizou "ação anulatória cumulada com indenização por danos morais". Argumenta que teve seu nome incluso nos órgãos de proteção ao crédito SCPC, por supostas dívidas junto as empresas requeridas. Afirma que não recebeu notificação prévia e tempestiva relacionada às inscrições, o que poderia ter evitado os constrangimentos sofridos. Pleiteia, assim, a condenação das rés ao pagamento de indenização por dano moral.

Ato contínuo, foi proferida a seguinte sentença:

[...] analisando detidamente o presente feito, assim como todos os demais (que tratam da mesma causa de pedir/pedidos) ajuizados pelo mesmo causídico junto a esta Unidade Jurisdicional, outra solução não há senão o indeferimento da inicial ante a ausência dos pressupostos de constituição e validade do processo, além de carecer a parte autora de interesse processual.

É que, a forma e o meio pelo qual o causídico Luiz Fernando Cardoso, OAB/MS nº 14.572, manejou a presente demanda (e as similares), fora fundada, a princípio, em declaração e documentação falsa, senão vejamos:

1) Não obstante conste no feito documento demonstrando que a parte autora estaria, em tese, assinando a devida procuração legal, resta evidente que, em uma análise mais apurada (por meio do recurso de aproximação), se observa que o aludido documento não confere com o instrumento de procuração e/ou declaração de hipossuficiência dos autos.

2) O instrumento de procuração apresentado em todas as ações que o causídico ajuizou nesta Comarca, foram feitas no formato cópia, jamais no original e, inclusive, com um número sequencial em cada procuração.

3) Em algumas situações que a parte não comprovou endereço, o causídico juntou declaração, em tese falsa, para "comprovar" a residência.

[...]

Destarte, não há dúvida que se trata de mais uma das diversas ações distribuídas nesta Unidade Jurisdicional, em proporção considerável, pelo causídico Luiz Fernando Cardoso Ramos, OAB/MS nº 14.572, o qual se utiliza do mesmo modus operandi para a propositura de demandas em nome de pessoas idosas que possuem empréstimos em instituições bancárias ou que tenham o nome inscrito no rol do cadastro de inadimplentes, aproveitando-se da condição frágil e vulnerável da pessoa idosa, para postular em benefício próprio, porquanto o objetivo principal é a captação de cliente (conduta considerada infração disciplinar pelo Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil, art. 34, IV) para proveito econômico em relação às instituições bancárias ou órgãos de restrição ao crédito, para, ao final, se beneficiar com o recebimento de valores oriundos de eventuais ganhos de causa.

Imperioso registrar que todas as ações são propostas com pedido de justiça gratuita, sem esquecer, ainda, da norma prevista no art. 77, I, do CPC, segundo a qual "além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo: expor os fatos em juízo conforme a verdade", o que não ocorreu na espécie.

Desse modo, resta evidente que no presente caso não há falar-se em presença dos pressupostos de constituição e validade do processo, além de carecer a parte autora de interesse processual, razão pela qual o indeferimento da petição inicial é medida que se impõe.

Ante o exposto, diante do princípio da segurança jurídica - porquanto verificada situação de: (I) vedação ao abuso do direito de demandar (art. 5º, XXXV da Constituição Federal e art. 187 do Código Civil); (II) o dever de cooperação entre as partes (art. 6º do CPC/2015); (III) o poder-dever do Juiz de prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias (art. 139, III do CPC/2015); (IV) os deveres das partes e procuradores (art. 77, II do CPC/2015); (V) a prevenção da litigância de má-fé (art. 80, V do CPC/2015); e (VI) eventual uso predatório da jurisdição, JULGO EXTINTO o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, IV e VI do Código de Processo Civil.

Despesas processuais pela parte autora, suspensas na forma do art. 98, § 3º do Código de Processo Civil. Sem honorários advocatícios.

Registro, desde já, ser inviável a repropositura da ação nos termos acima, na forma do art. 486, § 1º do Código de Processo Civil.

CIENTIFIQUE-SE o Ministério Público para fins de apuração eventual crime contra a fé pública (Código de Processo Penal, art. 40).

CONDENO a parte autora litigante de má-fé a pagar multa, no valor de 2% (dois por cento) do valor corrigido da...

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