Acórdão Nº 5001615-88.2020.8.24.0035 do Primeira Câmara de Direito Civil, 28-04-2022

Número do processo5001615-88.2020.8.24.0035
Data28 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001615-88.2020.8.24.0035/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: TOKIO MARINE SEGURADORA S.A. (AUTOR) ADVOGADO: DEBORAH SPEROTTO DA SILVEIRA (OAB RS051634) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Tokio Marine Seguradora S/A, contra sentença prolatada pelo juízo da 1ª Vara da Comarca de Ituporanga que, nos autos da "Ação regressiva" n. 5001615-88.2020.8.24.0035, ajuizada contra Celesc Distribuição S/A., julgou improcedentes os pedidos, condenando a seguradora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$700,00 (setecentos reais), nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º, do Código de Processo Civil (Evento 38, E1).

Inconformada, a apelante sustentou, preliminarmente, o cerceamento ao seu direito de defesa, ao argumento de que, apesar de ter postulado a intimação da ré para juntar aos autos os cinco relatórios referidos no Módulo 9 do PRODIST, em seu item 6.2, o juízo a quo proferiu sentença, sem a produção das provas necessárias à resolução da controvérsia.

No mérito, em síntese, aduziu ter restado comprovada a ocorrência dos danos, bem como o nexo de causalidade entre eles e a ação ou omissão da concessionária do serviço público, em razão da suficiência dos laudos coligidos com a inicial, ressaltando, ainda, que "caberia à recorrida comprovar a medição de tensão de energia elétrica entregue ao segurado no dia do sinistro, bem como a adoção de medidas de proteção às redes fornecedoras de energia que alimentam a unidade consumidora do segurado da apelante, elucidando em que consistem, qual sua eficácia, período de manutenção, quem os fiscaliza e qual a efetividade de tais medidas em casos análogos aos dos sinistros descritos na lide, o que não ocorreu no presente feito" (Evento 47/Apelação 1, fl. 19 - E1), bem como a incidência das normas consumeristas, além de discorrer sobre a legislação que rege a matéria.

Com as contrarrazões (Evento 52/E1), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Recebo-os conclusos.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele se conhece.

Ultrapassada a quaestio, a apelante afirma o cerceamento ao seu direito de defesa, bem como que a documentação coligida aos autos comprova de forma clarividente a falha na prestação do serviço do fornecimento de energia elétrica pela concessionária ré e, por conseguinte, o nexo de causalidade entre o evento e os danos sofridos pelo segurado, exsurgindo a obrigação de ressarcimento por parte da apelada. Ademais, sustenta que as ditas provas acostadas pela Celesc não atendem ao disposto na legislação de regência e, portanto, não são aptas a embasar a decisão de improcedência.

A parte apelada, por sua vez, sustenta nas contrarrazões que "[...] o Relatório juntado aos autos juntamente com a contestação traz todas as informações determinadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Ou seja, utilizando-se do número do transformador que atende à unidade consumidora (equipamento mais próximo da UC), é feita a busca, por meio de um único relatório, em todo o sistema conectado a este transformador, como religadores automáticos, subestação, manobras emergenciais ou programadas, alimentadores e qualquer outra intercorrência neste sentido".

O recurso, adianta-se, não comporta provimento.

1. Do Cerceamento de Defesa

Ab initio, asseverou a apelante que o julgamento antecipado da lide teria obstado a produção de prova indispensável ao perfeito deslinde da quaestio, em clara ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa, vez que, "[...] no intuito de complementar as provas juntadas ao feito, REQUEREU a intimação da recorrida para juntar aos autos 05 relatórios referidos no Módulo 9 do PRODIST, em seu item 6.2 que prevê de forma TAXATIVA os itens NECESSÁRIOS para averiguação da existência de nexo causal entre o dano reclamado e eventual perturbação do sistema elétrico, contudo, o Nobre Magistrado já procedeu a prolação de sentença".

Razão, contudo, não lhe assiste.

Com efeito, de todos cediço ser o Julgador o destinatário das provas, que pode, dentro do princípio da persuasão racional adotado pelo art. 370 da Lei Processual Civil, decidir sobre a necessidade ou não da coleta de provas a partir do livre convencimento motivado, afastando a realização daquelas diligências que entender dispensáveis ao caso.

Desse modo, não se caracteriza cerceamento de defesa ou violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa o julgamento com base nos elementos constantes nos autos, quando suficientes à formação do convencimento do Magistrado, como no caso. A propósito, lecionando a respeito do tema, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery esmiúçam que:

"O juiz pode assumir uma posição ativa, que lhe permite, dentre outras prerrogativas, determinar a produção de provas, desde que o faça, é certo, com imparcialidade e resguardando o princípio do contraditório. Tem o julgador iniciativa probatória quando presentes razões de ordem pública e igualitária, como, por exemplo, quando esteja diante de causa que tenha por objeto direito indisponível (ações de estado), ou quando o julgador, em face das provas produzidas, se encontre em estado de perplexidade ou, ainda, quando haja significativa desproporção econômica ou sociocultural entre as partes (STJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, RT 729/155). (...) Cabe ao juiz da matéria decidir sobre a necessidade da produção de provas (CPC/1973 130, 401) [CPC 370, CC 227], podendo ser a decisão revista em recurso especial quando, independentemente do exame da matéria de fato, ficar evidenciada a violação a princípio legal sobre prova, ou dissídio. Na espécie, a ré pretendia a oitiva do depoimento da autora para esclarecimento de fato considerado irrelevante para o julgamento da causa (STJ, 4.ª T., REsp 90435, rel. Min. Ruy Rosado, j. 24.6.1996, DJU 26.8.1996, p. 29695)" (Comentários ao código de processo civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.055).

Outrossim, pela pertinência, registre-se que o Superior Tribunal de Justiça deixou assente o entendimento de que "[...] não ocorre o cerceamento de defesa na hipótese em que o magistrado entende que o feito está suficientemente instruído e julga a causa sem a produção de prova testemunhal", pois os "princípios da livre admissibilidade da prova e do livre convencimento do juiz permitem ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como indeferir aquelas que considerar inúteis ou protelatórias" (AgRg no Resp n. 845384, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 03.02.2011).

Firmadas tais premissas, no caso concreto, não se há falar em cerceamento de defesa, vez que o acervo probatório amealhado ao feito é suficiente para o julgamento da lide, porquanto, como se verá no mérito, a produção de quaisquer outras provas não teria o condão de influenciar no convencimento do julgador, haja vista a ré ter se desincumbido do ônus probatório que lhe competia ao coligir ao feito o histórico de atuações no equipamento e a pesquisa de perturbação da rede elétrica que atende o consumidor, documentos que, diversamente do alegado pela autora, foram produzidos em consonância com a normativa da ANEEL sobre a matéria, os quais, nos termos do entendimento sedimentado pela Súmula n. 32 desta Corte de Justiça, transfere à seguradora sub-rogada nos direitos do consumidor o ônus de demonstrar a falha alegada e ou eventual divergência nos registros, ônus do qual não se desincumbiu, conforme se verá a seguir.

Aliado a isso, como bem pontuado pelo juízo a quo, "desnecessária a produção de outras provas além daquelas presentes nos autos, diante da preclusão consumativa da parte autora requerer a produção de nova prova documental, haja vista que não requereu a juntada dos relatórios do módulo 1 do PRODIST quando intimada para indicar as provas que pretendia produzir no evento 24 e apenas requereu a juntada dos relatórios do módulo 9 do PRODIST".

Neste sentido, já decidiu esta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. CELESC. AÇÃO CONDENATÓRIA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO REGRESSIVA. DANOS A EQUIPAMENTOS RESULTANTES DE ANOMALIA NA REDE ELÉTRICA. PLEITO DEDUZIDO POR SEGURADORA EM DESFAVOR DA CONCESSIONÁRIA. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DA SEGURADORA. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. VINDICADO RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA DETERMINAR A INTIMAÇÃO DA CONCESSIONÁRIA RÉ PARA TRAZER AOS AUTOS TODOS OS RELATÓRIOS DESCRITOS NO MÓDULO 9, DO PRODIST. INSUBSISTÊNCIA. MÉRITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CELESC. CDC, ART. 14 E CF, ART. 37, § 6º. CONTRATO DE SEGURO. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DO VALOR DESEMBOLSADO PELA SEGURADORA, EM RAZÃO DA SUB-ROGAÇÃO NOS DIREITOS DO SEGURADO. CC, ART. 786 E SÚMULA N. 188 DO STF. ALEGADA DEMONSTRAÇÃO DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS À SUB-ROGAÇÃO NOS DIREITOS DO SEGURADO. INSUBSISTÊNCIA. SUB-ROGAÇÃO NOS DIREITOS DO SEGURADO CONDICIONADO, CONTUDO, DE COMPROVAÇÃO DA FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS, DO NEXO CAUSAL ENTRE OS DANOS E O ALEGADO EVENTO DANOSO E DO EFETIVO PAGAMENTO AO SEGURADO. SEGURADORA, IN CASU, QUE ACOSTOU AOS AUTOS CÓPIA DE RELATÓRIO DE REGULAÇÃO DE SINISTRO INDICANDO A SUPOSTA ORIGEM DOS DANOS. PROVA CONTRAPOSTA POR DOCUMENTO (HISTÓRICO DE AUTUAÇÕES) DA CONCESSIONÁRIA APONTANDO A INEXISTÊNCIA DE FALHAS NO SISTEMA ELÉTRICO NA DATA DO SINISTRO. DOCUMENTO INTERNO CONSIDERADO INÍCIO DE PROVA, QUE TRANSFERE À SEGURADORA O ÔNUS DA COMPROVAÇÃO DA ALEGADA FALHA E DO NEXO CAUSAL COM OS DANOS. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NA SÚMULA N. 32, DO TJSC. AUSÊNCIA, ADEMAIS, DE COMPROVAÇÃO DO DE PAGAMENTO EM PROL DO SEGURADO. COMPROMISSO DE PAGAMENTO INCAPAZ DE EVIDENCIAR QUE A TRANSAÇÃO FOI, DE FATO, EFETIVADA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS A EVIDENCIAR A OCORRÊNCIA DA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO E DO NEXO CAUSAL COM OS PREJUÍZOS SUPORTADOS. DIREITO DE REGRESSO NÃO EVIDENCIADO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO...

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