Acórdão Nº 5001635-78.2019.8.24.0079 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 18-02-2021

Número do processo5001635-78.2019.8.24.0079
Data18 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001635-78.2019.8.24.0079/SC



RELATOR: Desembargador TULIO PINHEIRO


APELANTE: DELEZIA CAMPOS DE OLIVEIRA (AUTOR) APELANTE: BANCO BMG SA (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Perante o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Videira, DELEZIA CAMPOS DE OLIVEIRA promoveu "ação de obrigação de não fazer com pedido de concessão de tutela de urgência c/c repetiçao de indébito e compensaçao por dano moral" contra BANCO BMG S.A., autuada sob o n. 5001635-78.2019.8.24.0079.
Na inicial, alegou a parte autora, em síntese, ter sido induzida em erro pela casa bancária, ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável, operação bancária diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado que acreditou ter celebrado. Sustentou, a respeito, que não teve a intenção de celebrar contrato de cartão de crédito e não foi comunicada a respeito dos débitos referentes à reserva da margem consignável. Quanto ao pacto de "cartão de crédito consignado", aduziu que esta modalidade é ilegal, por ensejar onerosidade excessiva ao consumidor, ao restringir a sua liberdade em efetuar outros negócios jurídicos, bem como ao tornar o empréstimo impagável, em razão de o valor descontado corresponder apenas ao pagamento mínimo do cartão, contexto que enseja a prorrogação e o reajuste do restante do débito no mês subsequente. Defendeu, ainda, a ilegalidade na contratação, por não ter autorizado expressamente a cobrança da RMC e por ter sido induzida em erro pelo fornecedor, quando celebrou avença diversa e mais onerosa, havendo violação ao seu direito à informação. Pelo exposto, pleiteou, em sede de tutela provisória de urgência antecipada, a abstenção do banco em efetuar os descontos referentes a "RMC" e a "Empréstimo sobre a RMC". No mérito, requereu a declaração de inexistência de contratação, a repetição do indébito em dobro e a condenação da demandada no pagamento de indenização por danos morais. Pediu, por fim, a concessão da gratuidade judiciária (petição inicial, evento 1).
Sua Excelência deferiu a gratuidade da justiça, concedeu o intento de tutela de urgência requestado e decretou a inversão do ônus da prova (evento 3).
Citada, a instituição financeira ré apresentou contestação, bem como acostou documentos (evento 13).
Houve réplica (evento 17).
Na sequência, o MM. Juiz RAFAEL GOULART SARDA exarou sentença (evento 22), o que fez nos seguintes termos, consoante se extrai de sua porção dispositiva:
(...) Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para:
I- Declarar a ineficácia da relação jurídica unicamente quanto ao contrato de cartão de crédito com "Reserva de Margem Consignável" (RMC), com o cancelamento do cartão de crédito, preservando-se a relação contratual na modalidade de empréstimo consignado, com o recálculo do saldo devedor pelo agente financeiro, observados os seguintes parâmetros: (a) os juros remuneratórios deverão ser limitados conforme a tabela da taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil no mês da contratação; (b) os valores adimplidos até a presente data deverão ser abatidos do saldo devedor do contrato; (c) o valor da parcela deverá limitar-se ao montante descontado mensalmente do benefício previdenciário da parte autora;
II - Condenar a parte ré à repetição de indébito na forma simples, somente se, observados os parâmetros estabelecidos no item I, for constatada a existência de saldo em favor da parte autora; o valor deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do desconto de cada parcela e com a incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data da citação;
III - Condenar a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, do valor de R$ 3.000,00 a título de danos morais, incidindo juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso (data da inclusão da reserva de margem para cartão de crédito) e correção monetária pelo INPC a partir da presente data (enunciados das Súmulas n. 54 e 362 do Superior Tribunal de Justiça), autorizada a aplicação do valor no abatimento do saldo devedor do empréstimo consignado contratado, acaso existente, observados os parâmetros estabelecidos no item I.
Confirmo a tutela de urgência anteriormente concedida.
Considerando que a parte autora decaiu em parte mínima de seus pedidos, condeno a parte ré ao pagamento da integralidade das despesas processuais pendentes, além daquelas adiantadas no curso do processo pelo vencedor.
Fixo os honorários sucumbenciais devidos pela parte ré ao advogado da parte autora, no percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, em atenção aos critérios previstos no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. (...) (destaques do original).
Irresignados, apelaram os contendores.
Em suas razões, a casa bancária acionada defendeu a legalidade da contratação de cartão de crédito, com reserva de margem consignável. Argumentou, para tanto, que a parte recorrida, por vontade própria, contratou cartão de crédito consignado, conforme termo de adesão anexado ao processado, tendo recebido e usufruído do valor que lhe foi disponibilizado, mediante saque. Após fazer alusão às normas que amparam a modalidade de contratação defendida, bem como as características desta, pugnou pelo julgamento de improcedência da demanda. Ainda, suplicou pela declaração de inexistência de danos morais. Outrossim, pleiteou o afastamento da repetição do indébito (evento 26).
A parte autora, de seu turno, no arrazoado recursal que apresentou, pugnou a repetição do indébito em dobro, bem como requereu a majoração da indenização estipulada a título de danos morais para valor não inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Ainda, defendeu a impossibilidade de compensação de possíveis débitos com a condenação por danos morais. Por fim, pleiteou a majoração da verba advocatícia sucumbencial, além do prequestionamento das temáticas (evento 32).
Com as contrarrazões do polo autor (evento 34), ascenderam os autos a esta Casa

VOTO


Ab initio, antes de se passar à apreciação do mérito dos reclamos, esclarece-se que a análise sob enfoque é realizada em consonância com o posicionamento mais atual que vem sendo aplicado neste Órgão Colegiado acerca do tema.
Trata-se de recursos de apelação e adesivo interpostos, sucessivamente, por BANCO BMG S.A. e por DELEZIA CAMPOS DE OLIVEIRA contra sentença que julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados em ação declaratória de inexistência de débito, com pedidos de repetição do indébito e indenização por danos morais (Autos n. 5001635-78.2019.8.24.0079), promovida pela última contra o primeiro.
Na petição inicial, a parte autora defende, em síntese, a nulidade da avença celebrada, por vício de consentimento, sustentando ter sido induzida em erro pela casa bancária, ao adquirir cartão de crédito com reserva de margem consignável, operação bancária diversa e mais onerosa do que o contrato de empréstimo consignado que acreditou ter celebrado.
A instituição financeira ré, por sua vez, sustenta a validade do contrato de cartão de crédito entabulado entre as partes e, em consequência, a licitude dos descontos efetuados no benefício previdenciário da parte autora.
Infere-se dos autos que os litigantes formalizaram "Termo de adesão cartão de crédito consignado Banco BMG S.A. e autorização para desconto em folha de pagamento", "Proposta de contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG" e "Cédula de crédito bancário ('CCB') - Contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG", ocasião em que foi solicitado saque de valor, bem como autorizada a reserva de margem consignável (RMC) no benefício previdenciário da parte demandante, para o pagamento do valor mínimo da fatura mensal do cartão (vide termo de adesão, proposta e cédula, documento 3 do evento 13).
Em que pese tal documentação conferir substrato à celebração de negócio jurídico entre as partes, as circunstâncias do caso evidenciam a existência de vício de consentimento do consumidor, decorrente da ausência de informação clara e adequada, e a ocorrência de prática abusiva perpetrada pela casa bancária, contexto que enseja a nulidade contratual.
Isso porque, muito embora as avenças de cartão de crédito e de empréstimo consignado sejam modalidades contratuais distintas, a forma como a instituição financeira realizou a contratação de cartão de crédito consignado na presente hipótese acabou por levar o consumidor a erro, de tal maneira que se mostra razoável que pessoas habituadas a contratar empréstimo consignado acreditassem estar celebrando pacto desta natureza.
De fato, além de a forma de pagamento em ambas as avenças ser semelhante (desconto direto em benefício previdenciário), observa-se que, no ajuste debatido nos autos, em vez de haver a indicação do limite de crédito para utilização - informação essencial nos contratos de cartão de crédito -, há a menção a valor disponível para saque (veja-se do Quadro III constante do documento denominado "Cédula de crédito bancário ('CCB') - Contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado emitido pelo BMG" - documento 3 do evento 13), o que reforça a impressão do consumidor de estar contratando um empréstimo consignado.
O desconhecimento da parte autora acerca da contratação de cartão de crédito também é corroborado pelo fato de esta não ter realizado outra operação financeira além do saque da quantia prevista no contrato.
Com efeito, na única fatura colacionada ao feito (documento 3 do evento 13), consta apenas cobrança de encargos, tarifas e impostos referentes a esta operação, e amortização do saldo devedor com o crédito dos descontos efetuados no benefício previdenciário do consumidor.
Não bastasse, nota-se, de outro vértice, que a contratação...

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