Acórdão Nº 5001643-78.2019.8.24.0039 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 31-03-2022

Número do processo5001643-78.2019.8.24.0039
Data31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001643-78.2019.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: JOAO MARIA AGOSTINHO MOREIRA (AUTOR) ADVOGADO: ANDREA CRISTINA OLIVEIRA RUSCH (OAB SC014870) APELADO: AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU) ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR (OAB SC029708)

RELATÓRIO

Joao Maria Agostinho Moreira interpôs recurso de apelação cível da sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Lages, que julgou improcedentes os pedidos da "ação declaratória de inexistência de debito, c/c repetição de indébito e dano moral" aforada contra Agiplan Financeira S/A CFI, o que se deu nos seguintes termos (evento 16/1G):

JOÃO MARIA AGOSTINHO MOREIRA ingressou com AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANO MORAL em face de AGIPLAN FINANCEIRA S/A CFI, dizendo trata-se de pessoa humilde, deficiente físico (cego de um olho) e analfabeto, recebendo benefício previdenciário de apenas um salário mínimo, para seu sustento e de sua esposa. No mês de janeiro/18 dirigiu-se até agência do banco réu, onde realizou contrato de empréstimo no valor de R$ 1.756,00, para pagamento em 10 parcelas, cujo valor não lhe foi informado. Recebeu em sua conta o valor contratado, mas espantou-se quando veio o primeiro desconto, no valor de R$ 456,00, e no mês seguinte o desconto foi de R$ 462,85 e assim foi até outubro/18, quando descontado o valor de R$ 456,85, além de uma taxa de R$ 14,90, cuja origem não souberam lhe informar. Ocorreu que em novembro/2018 a parcela do empréstimo reduziu para R$ 439,71, continuando a cobrança da taxa de R$ 14,90. Acreditou que por se tratarem das duas últimas parcelas o valor seria um pouco menor. Contudo, em que pese o contrato devesse ter sido encerrado em dezembro, as cobranças continuaram, razão pela qual foi novamente ao Banco, onde foi informado que seu empréstimo seria para pagamento em 12 parcelas, bem como que teria refinanciado o contrato em mais 12 meses. Desesperado, pois tinha certeza de que não havia feito qualquer refinanciamento e que já havia pago totalmente o empréstimo, deslocou-se até o Procon, cujos atendentes entraram em contato com a financeira, a qual informou que em outubro/18 o autor efetuou refinanciamento do empréstimo anterior no valor de R$ 2.154,05, parcelados em 12 vezes de R$ 439,71, totalizando a dívida R$ 5.276,52, o que foi negado pelo requerente, frisando que quanto solicitados os contratos o réu apresentou somente o de refinanciamento, sem qualquer anuência do autor, e um CD com a gravação da suposta gravação, cuja voz evidentemente não era do requerente. Disse que desde outubro/18 teve descontado R$ 439,71 e uma taxa de R$ 14,90. Que já havia pago com juro absurdo 8 parcelas do primeiro contrato (R$ 3.804,00), e segundo a financeira teria refinanciado R$ 2.154,05. Verificando seu extratos, viu que em novembro/18 houve um depósito de R$ 926,16 em sua conta. Logo, por simples operação matemática, percebe-se abuso na cobrança, pois teve depositado em sua conta o total de R$ 2.682,16 e pagou 16 parcelas que totalizaram R$ 6.700,15, restando ainda mais duas parcelas, totalizando assim R$ 7.579,57. Ainda, existe a incógnita da cobrança do valor de R$ 14,90, exigida desde o início do contrato e não explicado pela financeira, supondo tratar-se de um cartão de crédito que a ré emitiu em seu nome e lhe enviou, contudo referido cartão sequer foi 'descolado' do envelope, sequer desbloqueado ou utilizado, de modo que ilegal e abusiva a cobrança. Alegou que se revela abusiva a atitude da ré em unilateralmente e sem anuência do consumidor refinanciar empréstimo e ainda cobrar juros abusivos, bem como cobrar por cartão de crédito não solicitado ou utilizado, sendo passível não só o cancelamento e devolução dos valores, mas inclusive reparação de danos morais. Sustentou a ilegalidade dos juros relativos ao primeiro contrato, no percentual de 24,448 a.m., enquanto a média de mercado em janeiro/18 era de 2% a.m., de maneira que as prestações deveriam ser no valor de R$ 166,05, totalizando as 12 parcelas R$ 1.992,60, sendo R$ 236,60 de juros. Logo, como por tal contrato pagou até o refinanciamento 8 parcelas de R$ 462,82, um total de R$ 3.702,80, foi cobrado a maior R$ 1.710,20, quantia esta que deve lhe ser restituída em dobro. Com relação ao refinanciamento não contratado, com parcelas no valor de R$ 439,71, a taxa de juros aplicada foi de 17,45082% a.m., enquanto a média de mercado era 1,9% a.m., resultando em prestações de R$ 202,44, que multiplicado por 12 totaliza R$ 2.429,28, sendo R$ 275,23 de juros. E como já pagou 10 parcelas de R$ 439,71, totalizando R$ 4.397,10, resta uma diferença de valor cobrado a maior de R$ 1.967,94. Acontece entretanto que não recebeu o valor de R$ 2.154,00, mas apenas R$ 926,16, eis que a diferença deste valor R$ 1.227,84, foi para quitação de suposto debito ainda existente do primeiro empréstimo de R$ 1.756,00, o qual já havia pago 8 parcelas. Contudo, comprovado que quando foi refinanciado o primeiro contrato, diante do valor absurdo cobrado, já estava quitado, razão pela qual a quantia incluída como divida não era devida e também não foi recebida, devendo igualmente ser restituída em dobro. Também, os valores relativas ao cartão de crédito devem ser devolvidos em dobro, porque não solicitado ou utilizado, tendo pago 18 parcelas de R$ 14,90, totalizando R$ 268,20. Assim, não existe parcela a ser incontroversa, devendo ser restituído do montante de R$ 5.174,18 (sendo, R$ 1.710,20 cobrado a mais no primeiro contrato, R$ 1.967,94 cobrado a mais no refinanciamento, R$ 1.227,84, que foi usado no refinanciamento para quitação do primeiro contrato e R$ 268,20 da cobrança de cartão de credito), tudo atualizado desde o efetivo pagamento e em dobro pela repetição do indébito. Alegou ocorrência de dano moral, mormente porque a ré, com atitude fraudulenta, privou-o de seu benefício, salientando tratar-se de pessoa de poucos recursos financeiros e doente, que necessita do dinheiro para sobreviver, sendo que precisou inclusive da caridade de terceiros até para se alimentar. Após algumas considerações, requereu a concessão de tutela de urgência, para exclusão de qualquer desconto relacionado à ré, de seu beneficio previdenciário. Concluiu pela procedência da ação, com a condenação da demandada à repetição do indébito dos valores descontados indevidamente, R$ 5.174,18, em duplicidade e atualizados desde a data do pagamento até efetiva suspensão destes, bem como ao pagamento de indenização por danos morais pela cobrança de juros abusivos e valores indevidos, reduzindo sua capacidade de sobrevivência, no valor R$ 20.000,00. Pugnou ainda pela inversão do ônus da prova.

A tutela de urgência foi indeferida.

Citado, o requerido contestou. Inicialmente, solicitou a retificação do polo passivo da ação, para nele constar Banco Agibank S/A. Em preliminar, impugnou o valor da causa, R$ 30.348,00, considerando que entre os pleitos autorais não há nenhum que seja quantificado de fato, além do autor requerer indenização claramente incoerente, na monta de R$ 20.000,00. Que houve quantificação exorbitante do valor da causa, com o fito de impor-lhe o desembolso desproporcional em custas processuais para acesso à via recursal, caso a demanda seja julgada procedente, bem como trata-se de maneira ardilosa do patrono auferir eventuais honorários em valor exorbitante, sendo imperiosa a correção do valor da causa. No mérito, afirmo que o autor possui pelo conhecimento do contrato de refinanciamento, bem como de que não se trata de empréstimo consignado, assim como igualmente firmou o documento denominado autorização de débito, permitindo o desconto diretamente de sua conta corrente, produzindo o pacto seus jurídicos e legais efeitos, devendo prevalecer os princípios pacta sunt servanda e da autonomia da vontade das partes. Esclareceu ter celebrado com o autor em 30/01/18 contrato n.º 1210944142, a ser adimplido em 12 prestações de R$ 462,85, a primeira em 04/03/18 e a última em 04/02/19. Que o primeiro contrato foi refinanciado pelo segundo, de n.º 1211809564, celebrado em 08/10/18, a ser adimplido em 12 prestações de R$ 439,71, a primeira em 04/11/18 e a última em 04/10/19. Que este último contrato foi firmado por meio de ligação entre o autor e a central de atendimento do réu, destacando que os valores contratados pelo requerente foram devidamente disponibilizados em sua conta corrente. Teceu esclarecimentos fáticos acerca do risco do negócio, salientando não se tratar de empréstimos consignados, de modo que as chances de inadimplência são consideravelmente maiores, justificando assim os juros estipulados. Alegou não haver obrigatoriedade quanto à limitação dos juros remuneratórios à taxa média praticada no mercado, pois esse indicador serve apenas como referencial adotado pela jurisprudência, mas que não possui utilidade enquanto ponto balizador hígido para limitação dos percentuais de juros aplicados pelas instituições financeiras que ofertam operações de crédito, tanto que inexiste norma jurídica específica que estabeleça regra nesse sentido, tampouco limite pré-definido para o percentual de juros remuneratórios. Que não há abusividade no contrato, posto que existindo vasta possibilidade de escolha quanto às instituições financeiras que oferecem operações de crédito idênticas, tendo o consumidor a liberdade de escolher e contratar entre as opções que se apresentam mais adequadas ao seu orçamento. Que precisa ser afastado qualquer tipo de vinculação entre a taxa contratada e a média informada pelo Bacen, sob pena de violação ao princípio da livre concorrência. Aduziu não haver que se falar em redução do percentual de juros remuneratórios, já que acordado pelas partes e em patamar que não se mostra abusivo ou lesivo. Subsidiariamente, seja aplicado o dobro da taxa média na revisão. Impugnou os cálculos realizados pelo autor através da utilização de calculadora cidadã, por...

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