Acórdão Nº 5001693-32.2021.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 02-06-2022

Número do processo5001693-32.2021.8.24.0008
Data02 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001693-32.2021.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: ALVINO DA SILVA (AUTOR) APELADO: BANCO INTER S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Alvino da Silva interpôs recurso de apelação cível da sentença proferida pelo juízo da Unidade Regional de Direito Bancário da Comarca de Florianópolis, que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação restituição de valores cumulada com indenização por danos morais por ele ajuizada em face da instituição financeira apelada, Banco Inter S/A, nos seguintes termos (evento 31, autos do 1º grau):

Cuida-se de ação movida por ALVINO DA SILVA em face de BANCO INTER S.A..

Alegou que assinou contrato de empréstimo consignado junto à parte contrária, com pagamento através de desconto em seu benefício previdenciário.

Todavia, constatou posteriormente que foi induzido em erro, pois não se tratava propriamente do empréstimo consignado desejado, mas sim da aquisição de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), com encargos/retenção de valores não esperados, o que seria ilegal.

Requereu a declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito com RMC, igualmente da reserva de margem consignável, com a restituição em dobro do que foi descontado a título do RMC e condenação da parte ré ao pagamento de danos morais.

Sucessivamente, postulou a readequação/conversão do contrato para a modalidade de empréstimo consignado.

A tutela de urgência foi apreciada.

Citada, a instituição financeira contestou defendendo a higidez do contrato e da validade da reserva de margem consignável por terem sido confeccionados de acordo com a vontade dos envolvidos.

Discorreu sobre a repetição de indébito e sobre danos morais.

Houve réplica.

É o relatório.

DECIDO.

[...]

ANTE O EXPOSTO, revogo a tutela de urgência e julgo improcedentes os pedidos.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.

Em suas razões recursais (evento 39, autos do 1º grau), sustenta o demandante, em suma: (a) a invalidade do contrato firmado entre as partes. Neste sentido, informa que foi ludibriado pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, operação com natureza e sujeita a encargos diversos, e superiores, aos do empréstimo pretendido. Alega que, diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada, tendo em vista que apenas pretendia a contratação de empréstimo e não fornecimento de cartão, o qual alega nunca ter solicitado e, muito menos utilizado. Pugna, assim, pelo cancelamento da operação com a suspensão dos descontos em sua folha de pagamento e a devolução da quantia que entende indevidamente cobrada. Defende, por fim, (b) a condenação da parte demandada ao pagamento de danos morais decorrentes do abalo sofrido em relação à suposta atitude fraudulenta e aos descontos irregulares perpetrados pela casa bancária. Requer o provimento do recurso com a reforma da decisão objurgada.

Em contrarrazões (evento 48, autos do 1º grau), a parte apelada pugnou pela revogação dos benefícios da justiça gratuita concedidos ao autor e, no mérito, pugnou pela manutenção da decisão guerreada e o respectivo desprovimento do recurso.

Por meio de despachos vinculado ao eventos 9, autos do 2º grau, foi determinada a expedição de ofício para a(o) Sr(a). Superintendente Regional do INSS, requisitando o envio de cópias de extratos de pagamento e de consignações referentes ao benefício do autor, os quais foram juntados aos autos e vinculados ao evento 12, autos do 2º grau.

Vieram os autos conclusos (evento 13, autos do 2º grau).

Este é o relatório.

VOTO

1. Do exame de admissibilidade do recurso

Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isto, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Da preliminar em contrarrazões

Em suas contrarrazões, o banco réu impugnou a gratuidade da justiça concedida ao autor.

Com efeito, o art. 100, do CPC, determina:

Art. 100. Deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso.Parágrafo único. Revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que tiver deixado de adiantar e pagará, em caso de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa.

A respeito do tema, Daniel Amorim Assumpção Neves, ensina:

A forma procedimental de impugnação à decisão concessiva da gratuidade de justiça dependerá da forma como o pedido foi elaborado: pedido na petição inicial, impugnação na contestação; pedido na contestação, impugnação na réplica; pedido no recurso, impugnação nas contrarrazões; pedido superveniente por mera petição ou elaborado por terceiro, por petição simples no prazo de quinze dias.Embora o momento de impugnação dependa do momento do pedido deferido, a reação da parte contrária é preclusiva, de modo que, não havendo a devida impugnação dentro do prazo legal, não caberá mais a impugnação.[...].Por outro lado, se a decisão sobre a gratuidade for capítulo de sentença, o recurso cabível será a apelação. (Novo Código de Processo Civil - Leis 13.105/2015 e 13.256/2016 / Daniel Amorim Assumpção Neves. - 3. ed. rev., atual. e ampl., - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, p. 107).

No caso concreto, a gratuidade da justiça foi concedida ao autor na decisão que recebeu a petição inicial, proferida em 29-01-2021 (evento 3/1G), logo, a impugnação à benesse deveria ocorrer na contestação, conforme, de fato, realizado pela parte ré.

Na sentença, o juiz da causa rejeitou a impugnação e manteve a gratuidade anteriormente concedida, portanto, o meio adequado para se insurgir quanto à matéria decicida pelo juiz de primeiro grau, seria a apelação cível.

A ausência de recurso de apelação contra o capítulo da sentença que rejeitou a gratuidade da justiça demonstra que com ela a parte impugnante se conformou, não sendo possível impugná-la nas contrarrazões ao recurso de apelação da parte adversa.

Desse modo, este não é o meio adequado para impugnar a benesse concedida ao demandante, o que obsta o conhecimento da matéria.

3. Da (ir)regularidade da operação contratada entre as partes

Sustenta o autor, inicialmente em seu recurso, a invalidade da operação pactuada com a casa bancária, na medida em que teria sido por ela ludibriado, pois pretendia contratar unicamente empréstimo pessoal consignado, e não saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada.

Analisados os autos, verifica-se, todavia, que sem razão a parte demandante.

A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).

As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):

Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.

[...]

Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1o Para os fins do caput, fica o INSS...

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