Acórdão Nº 5001733-51.2020.8.24.0104 do Segunda Câmara Criminal, 26-10-2021

Número do processo5001733-51.2020.8.24.0104
Data26 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5001733-51.2020.8.24.0104/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: LINDAURIO MARCHIORI (RÉU) ADVOGADO: EDILEIA BUZZI (OAB SC027209) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na Comarca de Ascurra, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Lindaurio Marchiori, imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos arts. 121, § 2º, IV, do Código Penal e 305 da Lei 9.503/97, nos seguintes termos:

Fato 1

No dia 13 de setembro de 2020, por volta das 18h20min., o denunciado Lindaurio Marchiori conduzia o automóvel Honda/Civic LXS, placas JSC-8276, pela Rodovia SC-110, km 135, Rodeio 12, em Rodeio/SC, com sua capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, fato constatado pelos policiais militares que atenderam a ocorrência, por meio do Auto de Constatação de Sinais de Alteração da Capacidade Psicomotora (fl.10), posto que apresentava desordem nas vestes, hálito alcoólico, olhos vermelhos, agressividade, dificuldade no equilíbrio e fala alterada.

Assim, mesmo com seus reflexos e coordenação motora prejudicados em virtude de seu elevado grau de embriaguez, o denunciado resolveu dirigir, invadindo a pista contrária e passando a transitar na contramão de direção, colidindo frontalmente com a motocicleta Honda/CG 125 Titan Ks, placa MCO-8999, conduzida pela vítima Wilson Krüger.

Devido ao sinistro, a vítima Wilson Krüger sofreu as graves lesões descritas no Laudo Pericial n. 9415.20.01852, as quais, ao resultarem em choque hemorrágico por múltiplas fraturas, foram a causa determinante da sua morte.

Por todo o exposto, ou seja, pelo fato de estar dirigindo embriagado e por invadir deliberadamente a contramão de direção por longo trajeto, é inequívoco que o denunciado Lindaurio agiu com dolo eventual, já que com sua conduta (dirigir bêbado na contramão) assumiu o risco de produzir o resultado (atropelar e matar alguém).

Ademais, estas mesmas circunstâncias em que os fatos ocorreram demonstram que a conduta do denunciado atingiu a vítima totalmente de surpresa, impossibilitando sua defesa, pois, ao perceber a colisão iminente, vítima Wilson Krüger ainda tentou arremeter sua motocicleta para a pista contrária e, mesmo tendo realizado tal manobra evasiva, não conseguiu evitar o abalroamento que resultou em seu óbito.

Fato 2

Ainda, nas mesmas condições de tempo e local, Lindaurio Marchiori, agindo de forma voluntária e consciente da sua ilicitude, após a colisão, tentou se afastar do local do acidente para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe podia ser atribuída. Ressalta-se que o denunciado somente não fugiu do local do acidente por circunstâncias alheias à sua vontade, pois foi detido por populares. Ainda, mesmo com a chegado dos policiais militares, o denunciado, embriagado conforme Auto de Constatação de Sinais de Alteração da Capacidade Psicomotora (fl.10), se negou a realizar o teste do bafômetro (etilômetro) (Evento 1).

Concluída a instrução preliminar, o Doutor Juiz de Direito julgou parcialmente procedente a exordial acusatória, desclassificou as condutas narradas na denúncia e condenou Lindaurio Marchiori à pena de 6 anos e 8 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e 3 meses de suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, pelo cometimento do delito previsto no art. 302, § 3º, c/c seu § 1º, III, da Lei 9.503/97 (Evento 139).

Insatisfeitos, o Ministério Público e Lindaurio Marchiori deflagraram recursos de apelação criminal.

O Parquet, preliminarmente, aponta a nulidade parcial da sentença resistida, sob a alegação de que o Magistrado de Primeiro Grau não poderia, na mesma decisão, ter desclassificado a conduta imputada como crime doloso contra a vida para delito que não é da competência do Tribunal de Júri e, imediatamente, sem abrir prazo para a impugnação da sentença desclassificatória, ter proferido sentença condenatória relativa ao crime de competência do juiz singular.

Em questão de fundo, argumenta que "há elementos suficientes nos autos para indicar a presença do dolo eventual, de modo que a" "submissão" do Acusado "a julgamento perante o Júri Popular é medida que se impõe".

Pondera que os elementos de prova colhidos revelam ter o Acusado "trafegado pela contramão de direção por longo trecho, inclusive jogando outros carros para fora da via, além do descaso do apelado em relação ao fato/morte que causou", de modo que, "agindo como agiu (e agia), assumiu o risco de sua conduta", e assim "se justificava a sua pronúncia por homicídio na modalidade do dolo eventual".

Aponta que "o crime previsto no artigo 305 do Código de Trânsito Brasileiro também deve ser submetido a julgamento pelo Conselho de Sentença, por se tratar de crime conexo ao de homicídio analisado acima, a teor do que estabelece o artigo 78, inciso I, do Código de Processo Penal".

Afirma que, "havendo a reforma da primitiva sentença, o que se espera, há necessidade da decretação da prisão preventiva do acusado, conforme já anteriormente decidido por esse Tribunal de Justiça", uma vez que está presente a necessidade de garantir-se a ordem pública, seja por causa da gravidade concreta da conduta do Acusado, seja por que ele "já foi preso anteriormente por dirigir embriagado (Evento 2), o que demonstra que o fato não é isolado e sim uma reiteração da conduta criminosa".

Sob tais argumentos, requer o provimento do recurso para que seja declarada "a nulidade parcial da sentença [...] no que tange à condenação de Lindaurio Marchiori pela prática do delito descrito no artigo 302, § 3º, c/c § 1°, III, do Código de Trânsito Brasileiro" ou, sucessivamente, seja reformada a sentença resistida "no tocante à desclassificação do crime de homicídio simples para outro não doloso contra a vida, com a consequente pronúncia [...] nos exatos termos da acusação", bem como que seja decretada a prisão preventiva do Acusado (Evento 151).

Lindaurio Marchiori, por sua vez, assevera que "a área do acidente não foi devidamente isolada, e em que pese o carro não tenha mais andado após o sinistro, o ponto de impacto não consta no BOAT", e "também não constou a posição final da motocicleta e nem foram feitas as medições e triangulações acerca das paradas definitivas dos veículos envolvidos", de modo que "a cadeia de custódia da prova não foi preservada".

Pontua que "a maior concentração de fragmentos dispersados estava na" sua "mão de direção, [...] o que indica que o impacto se deu na mão de direção dele", "viu a moto vindo em sua direção e tentou desviar, vindo a colidir, e o laudo técnico corrobora neste sentido", bem como que "a vítima sequer era habilitada para dirigir motocicleta, e seu exame toxicológico não aportou aos autos, em que pese duas vezes requerido".

Aponta a fragilidade da prova oral e que jamais tentou fugir do local, somente estava atordoado em razão do impacto com o airbag...

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