Acórdão Nº 5001743-53.2021.8.24.0042 do Primeira Câmara Criminal, 22-07-2021

Número do processo5001743-53.2021.8.24.0042
Data22 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 5001743-53.2021.8.24.0042/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: DEIVIZ RODRIGO DE CASTRO DALLAGNOL (AGRAVADO) ADVOGADO: DANIEL DECESARO (OAB SC047956)


RELATÓRIO


Pronunciamento judicial agravado: o juiz de direito Guilherme Augusto Portela de Gouvêa, da 2ª Vara da comarca de Maravilha, acolheu o pedido de reconsideração e declarou a remição de 100 dias pela aprovação no ENEM/2020, nos seguintes termos:
1. Relatório
Trata-se de pedido de reconsideração da decisão que indeferiu a homologação da remição pela aprovação no ENEM 2020 (Seq. 84), juntado no Seq. 107.
Instado, o Ministério Público reiterou a manifestação contida no Seq. 93 e opinou pela não homologação da remição (Seq. 110).
Vieram conclusos.
DECIDO.
2. Fundamentação
A despeito da manifestação contrária do douto representante do Ministério Público, analisando o feito tenho que o pedido deve ser deferido.
Consoante consignado na decisão questionada, o apenado já teve homologada a remição pela aprovação nas quatro áreas de conhecimento e na redação no ENEM 2019 (Seq. 1.219). Entretanto, conforme se verifica no Seq. 1.324, a decisão foi revogada pelo e. Tribunal de Justiça Catarinense, após interposição de Agravo de Execução Penal pelo órgão ministerial.
Oportuno frisar que, em que pese o apenado tenha impetrado Habeas Corpus para restabelecer a decisão proferida por este juízo, o pedido liminar não foi deferido (Seq. 1.352) e o writ está pendente de decisão, conforme consulta realizada na presente data.
Por outro lado, ressalto que, ainda que o juízo ad quem tenha revogado a decisão anterior, o apenado realizou novo exame, referente ao ano de 2020, e novamente obteve a pontuação mínima em todas as áreas de conhecimento e na redação, de sorte que faz jus à homologação pela nova aprovação no ENEM (novas circunstâncias).
Destaco que tal decisão não afronta a coisa julgada, já que se trata de novo exame realizado pelo apenado (novas circunstâncias), de maneira que não há objeção à apreciação do novo pedido.
Pois bem.
Com feito, o tema em análise ainda é muito controverso, contudo já existem inúmeros julgados favoráveis à homologação da remição pela aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, inclusive, independentemente de conclusão do ensino médio em momento anterior ao início do cumprimento da pena e, até mesmo se o apenado já for portador de diploma de nível superior. Veja-se, pois:
EXECUÇÃO PENAL. APROVAÇÃO NO EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO. VALORAÇÃO DOS ESTUDOS REALIZADOS POR CONTA PRÓPRIA. CABIMENTO. 1. O c. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de admitir a possibilidade de abreviação da reprimenda em razão de atividades que não estejam expressas no art. 126 da LEP, como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma inserta na Recomendação n. 44/2013 do CNJ - que indica aos Tribunais a possibilidade de remição por aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). 2. Outrossim, ao se interpretar a remição pela leitura e/ou estudo sob a égide constitucional, vemos que tanto o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os objetivos fundamentais da Constituição Federal que é o de construir uma sociedade livre, justa e solidária e erradicar a pobreza e a marginalização (art. 3º I e III) alicerçam a compreensão no sentido da possibilidade de aplicação analógica in bonam partem do artigo 1º, IV, da recomendação 44/2013 do CNJ para as situações nas quais o reeducando por conta própria realiza estudos, durante o cumprimento da pena, notadamente se esse reeducado se submete a exame nacional e logra êxito. 3. Ademais, é sabido que o ENEM tem como fator primordial não a conclusão do ensino médio, mas sim a viabilização do ingresso do aprovado em universidades públicas ou particulares através de concessão de bolsa de estudos total ou parcial. Assim, o fato de o reeducando já ter concluído o ensino médio antes do início do cumprimento da pena se mostra irrelevante para fins de aproveitamento dos estudos realizados durante o encarceramento. 4. Agravo conhecido e provido. (TJDF, Acórdão 1147877, 20180020075203RAG, Relator: J.J. COSTA CARVALHO, 1ª TURMA CRIMINAL, data de julgamento: 24/1/2019, publicado no DJE: 12/2/2019. Pág.: 70/77) (sem grifos no original)
Ainda:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELA APROVAÇÃO NO EXAME NACIONAL DO E N S I N O M É D I O ( E N E M ) . REEDUCANDO PORTADOR DE DIPLOMA DE NÍVEL SUPERIOR EM MOMENTO ANTERIOR AO INÍCIO DO RESGATE DA REPRIMENDA. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA IN BONAM PARTEM DO ART. 126 DA LEP E DA RECOMENDAÇÃO N. 44 DO CNJ. INEXISTÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O art. 126 da Lei de Execução Penal determina que o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. 2. Esta Corte Superior de Justiça firmou entendimento e tem admitido a possibilidade de abreviação da reprimenda em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal, como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma inserta no art. 126 da LEP. De outro lado, a Recomendação n. 44/2013 do CNJ indica aos Tribunais a possibilidade de remição por aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino Médio ( ENEM). Verifica-se, portanto, que o objetivo deste conjunto de regras acerca da remição da pena por aproveitamento dos estudos é o de incentivar os apenados aos estudos, bem como sua readaptação ao convívio social. 3. In casu, há razões suficientes para a excepcional concessão da remição ao apenado, pois, a aprovação do paciente no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) configura aproveitamento dos estudos realizados durante a execução da pena, conforme o art. 126 da LEP e Recomendação n. 44/2013 do CNJ. 4. O fato de o paciente já ter nível superior concluído antes do início da execução da pena, apenas o impede de receber o acréscimo de 1/3 (um terço) no tempo a remir em função das horas de estudo, conforme a inteligência do art. 126, § 5º, da Lei de Execução Penal. 5. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no REsp 1673847/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 18/09/2018, DJe 26/ 09/2018) (sem grifos no original)
Do corpo do acórdão, extrai-se:
Em suma, a não concessão do benefício seria ir de encontro aos objetivos do conjunto de regras acerca da remição da pena, por aproveitamento dos estudos . O fato de o paciente já ter nível superior concluído antes do início da execução da pena apenas o impede de receber o acréscimo de 1/3 (um terço) no tempo a remir em função das horas de estudo, conforme a inteligência do art. 126, § 5º, da Lei de Execução Penal. (sem grifos no original)
E mais:
AGRAVO EM EXECUÇÃO. REMIÇÃO DA PENA PELO ESTUDO. APROVAÇÃO NO ENEM. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DECISÃO MANTIDA. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já externou entendimento no sentido de que, na busca pela ressocialização do condenado, torna-se possível a utilização da analogia in bonam partem, a fim de que se admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas na Recomendação nº 44/2013. AGRAVO IMPROVIDO.(Agravo de Execução Penal , Nº 70083003442, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em: 18-12-2019) (sem grifos no original)
Não bastasse:
RECURSO DE AGRAVO EM EXECUÇÃO - REMIÇÃO DA PENA - ARTIGO 126 DA LEP - RECOMENDAÇÃO Nº 44/2013 DO CNJ - APROVAÇÃO NO EXAME NACIONAL PARA INGRESSO NO ENSINO SUPERIOR - INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA IN BONAM PARTEM - DECISÃO MODIFICADA - RECURSO PROVIDO. Conforme jurisprudência das Cortes Superiores (precedentes), é possível o reconhecimento da remição de pena quando o agente, mesmo vinculado a atividades educacionais dentro do estabelecimento prisional, obtém êxito no ENEM e o utiliza para ingressar no ensino superior. Recurso conhecido e provido. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0003158 -54.2019.8.16.0009 - Curitiba - Rel.: Desembargador Jorge Wagih Massad - J. 26.01.2020) (sem grifos no original)
Por fim, oportuno citar dois julgados que chancelaram o entendimento adotado por este Magistrado. O primeiro é proveniente do E. Tribunal de Justiça Catarinense, veja-se pois:
AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO POR ESTUDO. EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO - ENEM. DECISÃO QUE DEFERIU O PLEITO. INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRETENSÃO DESACOLHIDA. ADOÇÃO DE INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO REEDUCANDO. INCIDÊNCIA DA RECOMENDAÇÃO N. 44/2013 DO CNJ, DA RESOLUÇÃO N. 3/2010 DO CNE E DO ART. 126 DA LEP. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. - Negar o direito à remição aos apenados que obtiveram aprovação no exame do ENEM em razão de reforma implementada pelo MEC não é razoável, nem consentâneo com a intenção do legislador, tampouco com a recomendação do CNJ e ainda menos com a interpretação jurisprudencial que, em primeiro lugar, passou a reconhecer o próprio direito à remição de pena por atividades não expressas no texto legal. Necessário resgatar aquilo que orientou, no princípio, o próprio reconhecimento do direito à remição na hipótese em específico, que nunca foi a certificação formal de conclusão de etapa de ensino segundo os editais vigentes do MEC, e sim a verificação do esforço e da dedicação a atividades e valores necessários à melhor reintegração do indivíduo à sociedade. Em se verificando que o apenado se dedicou e conseguiu sua aprovação no ENEM, pelo seu próprio...

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