Acórdão Nº 5001774-36.2020.8.24.0001 do Terceira Câmara de Direito Civil, 04-04-2023

Número do processo5001774-36.2020.8.24.0001
Data04 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5001774-36.2020.8.24.0001/SC



RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO


APELANTE: IZULINA ANTUNES DE LIMA (AUTOR) APELADO: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU)


RELATÓRIO


IZULINA ANTUNES DE LIMA interpôs recurso de apelação em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Abelardo Luz, o qual, nos autos da "ação declaratória de nulidade/inexigibilidade de desconto em folha de pagamento cumulada com repetição de indébito e danos morais" n. 50017743620208240001, movida em face de BANCO VOTORANTIM S.A., julgou extinto o feito (art. 485, IV do CPC).
Sustentou o recorrente, em suma, que o instrumento de procuração é regular e não padece de qualquer defeito a autorizar a extinção do feito. Reputou desnecessária a exigência de procuração específica e com firma reconhecida em cartório oposta pelo julgador.
Requereu, nessa senda, o provimento do reclamo e o retorno dos autos à origem para regular processamento do feito.
Contrarrazões pela adversa (evento 41).
Neste grau, as partes foram intimadas a se manifestar sobre a incidência da prescrição.
É o relatório

VOTO



Trata-se de ação proposta ao argumento de que a parte autora vem sofrendo descontos em seu benefício previdenciário referentes a contrato de empréstimo consignado desconhecido, razão pela qual pretende a declaração de invalidade do ajuste, a restituição em dobro dos valores descontados de seus proventos e a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais.
A sentença, como dito, extinguiu o feito, porquanto não atendida a determinação exarada em despacho anterior para regularização da representação processual, mediante juntada de procuração com firma reconhecida em cartório e outorga de poderes específicos ao seu patrono para litigar em desfavor da parte ré.
A parte recorrente, em síntese, defende que a providência é incabível, inexistindo razão apta à extinção do feito.
Porquanto atende aos requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, o recurso comporta conhecimento.
E, no mérito, razão lhe assiste.
Segundo dispõe o art. 654 do Código Civil, "todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante."
Em relação às procurações outorgadas a advogado(a) para representação da parte em juízo, o art. 105 do Código de Processo Civil dispõe:
A procuração geral para o foro, outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica, que devem constar de cláusula específica.
A lei, portanto, não impõe maiores formalidades para a outorga da procuração, exigindo a capacidade do outorgante e a aposição de sua assinatura. Por seu turno, a procuração geral para o foro - admitida por instrumento público ou particular assinado pela parte- habilita o causídico a praticar todos os autos do processo, exceto aqueles reservados a cláusula específica.
Nessa toada, "a procuração geral para o foro revela-se suficiente a autorizar o patrono a atuar judicialmente em favor da parte outorgante dentro de um determinado contexto - no caso, o contexto refere-se aos contratos de empréstimo cuja existência ou validade pretende-se questionar -, ainda que esse encargo exija o ajuizamento de mais de uma ação, com mais de uma parte acionada" (TJSC, Apelação n. 5032049-17.2021.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 23-08-2022).
Isso dito, a procuração amealhada aos autos pela parte autora preenche os requisitos formais necessários à sua validade. Inexiste, ademais, divergência visível entre a assinatura exarada no instrumento e aquela constante dos documentos pessoais da parte outorgante.
Portanto, a determinação de apresentação do instrumento com firma reconhecida em cartório e com poderes específicos para litigar contra a parte ré não encontra amparo na legislação, não justificando o indeferimento da exordial.
Não se ignora que a exigência foi lançada em contexto excepcional, referente à existência de múltiplas demandas semelhantes patrocinadas pelo mesmo profissional. Demonstra, portanto, cautela do julgador.
A situação, inclusive, gerou certa divergência no âmbito deste juízo ad quem. Prevalece, porém, a compreensão de que a exigência não encontra respaldo legal e que não há indicativos sólidos a controverter a idoneidade do mandato, pelo que deve ser reconhecido válido, muito embora elogiosa a atenção e preocupação delineada pelo julgador a quo. Prestigia-se, assim que as partes não sejam oneradas com exigência diversa daquela apresentada aos casos ordinários.
Saliente-se que esta linha intelectiva foi confirmada por esta Terceira Câmara na sessão extraordinária realizada no dia 19/07/2022, pelo regime do julgamento estendido do artigo 942 do CPC, ocasião em que se decidiu não ser idônea a exigência de comprovação de instrumento de mandato público e com poderes específicos para o ajuizamento de ação de nulidade de contrato de empréstimo consignado, sobretudo porque ausentes elementos sólidos capazes de materializar indício de advocacia predatória.
Registro a respectiva ementa:
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. MATÉRIA DE COMPETÊNCIA DA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO CIVIL POR DETERMINAÇÃO DO GRUPO DE CÂMARAS NO INCIDENTE DE REUNIÃO DE PROCESSOS DEFLAGRADO NA APELAÇÃO PARADIGMA N. 0300657-27.2017.8.24.0001. DESPACHO DO RELATOR DETERMINANDO QUE O ADVOGADO DA PARTE EXIBA COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA DA PARTE AUTORA POR MEIO DE DOCUMENTOS OFICIAIS E ATUALIZADOS E JUNTE INSTRUMENTO DE MANDATO ATUAL, COM PODERES ESPECÍFICOS E COM FIRMA RECONHECIDA DO CLIENTE. DESNECESSIDADE. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE ADVOCACIA PREDATÓRIA. MATÉRIA DEFINIDA EM JULGAMENTO ESTENDIDO NOS TERMOS DO ARTIGO 942 DO CPC. NECESSIDADE DE QUE O APELO SEJA REGULARMENTE PROCESSADO PELO RELATOR ORIGINÁRIO INDEPENDENTEMENTE DAS PROVIDÊNCIAS SOLICITADAS.(TJSC, Apelação n. 5002236-10.2020.8.24.0060, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Fernando Carioni, rel. designado (a) Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 19-07-2022).

Ademais, sobre o tema, convém citar excerto de voto da lavra do Exmo. Des. Saul Steil:
A prática denominada advocacia predatória, contudo, caracteriza-se não pelo simples ajuizamento massivo de demandas similares por um mesmo representante, envolvendo, em realidade, formas ilegais de captação dos clientes e até mesmo a prática de fraude na confecção dos instrumentos de mandato. Dentro dessa seara verdadeiramente criminosa, é comum que as partes desses processos não tenham sequer conhecimento da existência de ações ajuizadas em seu nome.
E quanto a essas circunstâncias mais graves envolvendo a advocacia predatória, não se tem até o momento elementos que sejam robustos a ponto de colocar em efetiva suspeita a lisura da atuação do Dr. Luiz Fernando Cardoso Ramos nos processos por ele patrocinados, de modo a justificar maiores rigores na apuração da representação processual dos seus clientes.
Vale salientar, nesse raciocínio, que este Tribunal de Justiça há tempos já tem ciência do ajuizamento massivo de ações dessa estirpe pelo aludido patrono em diversas comarcas do Estado, e tanto é assim que, por meio de deliberação do Grupo de Câmaras de Direito Civil,...

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