Acórdão Nº 5001805-40.2021.8.24.0092 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 08-12-2022

Número do processo5001805-40.2021.8.24.0092
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001805-40.2021.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: BANCO AGIBANK S.A (RÉU) ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR (OAB SC029708) APELADO: MARIA JOSE SILVA LEITE (AUTOR) ADVOGADO: LUIZ FELIPE LOURES MIRANDA FILHO (OAB SC034937) ADVOGADO: JOSE GUILHERME DAMBROS MIRANDA (OAB SC057411)

RELATÓRIO

Maria Jose Silva Leite opôs embargos de declaração (Evento 21) em face de acórdão deste órgão colegiado (Evento 15) que conheceu e deu parcial provimento ao recurso de apelação interposto pela instituição financeira embargada.

Cuida-se, inicialmente, apelação interposta pelo Banco Agibank S/A contra a sentença do Evento 20 dos autos de origem, que, proferida em 20-8-2021 pelo juízo da 1ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis, julgou procedentes os pedidos formulados em ação Revisional ajuizada por Maria José Silva Leite em face da instituição financeira apelante, o que se deu nos seguintes termos:

Maria Jose Silva Leite ajuizou ação de revisão de taxa de juros c/c restituição de valores contra Banco Agibank S.A. Alegou que as partes celebraram contrato de empréstimo, e que foram excessivos os valores cobrados a título de juros remuneratórios. Requereu a procedência do pedido para: a) determinar a aplicação da taxa média de juros divulgada pelo Bacen ao contrato entabulado entre as partes; b) condenar a ré à repetição do indébito.

Citada (evento 9), a instituição financeira contestou arguindo preliminares de falta de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, defendeu a impossibilidade de revisão do contrato e a regularidade das cláusulas, postulando a rejeição do pleito (evento 10).

Houve réplica (evento 17).

É o relatório.

Decido.

1. Julgamento antecipado.

Julgo antecipadamente o mérito, na forma do art. 355, I, do CPC, por se cuidar de matéria essencialmente de direito, sendo desnecessária a produção de provas.

2. Falta de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido

Tais teses não tratam de questões processuais, relacionadas às condições da ação, e sim temas meritórios, tanto que fundadas em súmulas do STJ a respeito de Direito Bancário, motivo pelo qual devem ser afastadas.

3. Introdução ao mérito. Argumentação jurídica.

Trata-se de ação revisional de contrato de empréstimo.

O órgão julgador não pode ser submetido a verdadeiro questionário, não sendo o Poder Judiciário instituição de consulta da parte (STJ - EDREsp. n. 28.209-7/SP, Min. Garcia Vieira, DJU de 10.05.93, p. 8.610).

O Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar o art. 489, § 1o, IV, do NCPC, assentou:

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE, ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA.

1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado, o que não ocorre na hipótese em apreço.

2. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida.

(...)

4. Percebe-se, pois, que o embargante maneja os presentes aclaratórios em virtude, tão somente, de seu inconformismo com a decisão ora atacada, não se divisando, na hipótese, quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do Código de Processo Civil, a inquinar tal decisum.

5. Embargos de declaração rejeitados" (EDcl no MS 21.315/DF, Rel. Ministra Diva Malerbi, julgado em 08/06/2016, DJe 15/06/2016).

Portanto, a sentença não precisa enfrentar e rebater todos os argumentos, teses e dispositivos legais invocados pelas partes. Basta a apreciação dos fatos e dos pedidos, expondo-se as razões de decidir cada ponto. Caso contrário, o juízo estaria submetido à sabatina do litigantes.

4. Da Possibilidade de Revisão.

O contrato deve ser respeitado, a fim de atingir o ideal de paz social, até porque do contrário as relações jurídicas não teriam estabilidade. Logo, deve ser cumprido, sob pena de execução forçada através do Poder Judiciário, nos termos do art. 421 do Código Civil, que consagra o princípio da liberdade contratual (pacta sunt servanda).

Orlando Gomes explica:

"Na justificação moderna da relatividade do poder vinculante do contrato, a idéia da imprevisão predomina. Exige-se que a alteração das circunstâncias seja de tal ordem que a excessiva onerosidade da prestação não possa ser prevista. Por outras palavras, a imprevisão há de decorrer do fato de ser a alteração determinada por circunstâncias extraordinárias. As modificações por assim dizer normais do estado de fato existente ao tempo da formação do contrato devem ser previstas, pois constituem, na justa observação de RIPERT, uma das razões que movem o indivíduo a contratar, garantindo-se contra as variações que trariam insegurança às suas relações jurídicas. Quando, por conseguinte, ocorre a agravação da responsabilidade econômica, ainda ao ponto de trazer para o contratante muito maior onerosidade, mas que podia ser razoavelmente prevista, não há que pretender a resolução do contrato ou a alteração do seu conteúdo. Nesses casos, o princípio da força obrigatória dos contratos conserva-se intacto. Para ser afastado, previsto é que o acontecimento seja extraordinário e imprevisível.

"Mas, não basta. Necessário ainda que a alteração imprevisível do estado de fato determine a dificuldade de o contratante cumprir a obrigação, por se ter tornado excessivamente onerosa a prestação. A modificação quantitativa da prestação há de ser tão vultosa que, para satisfazê-la, o devedor se sacrificaria economicamente. Chega-se a falar em impossibilidade. Pretende-se, até, criar a categoria da impossibilidade econômica, ao lado da física e da jurídica, para justificar a resolução do contrato, mas se a equiparação procedesse, estar-se-ia nos domínios da força maior, não cabendo, em conseqüência, outra construção teórica. A onerosidade excessiva não implica, com efeito, impossibilidade superveniente de cumprir a obrigação, mas apenas dificulta, embora extremamente, o adimplemento. Porque se trata de dificuldade, e não de impossibilidade, decorre importante conseqüência, qual seja a da necessidade de verificação prévia, que se dispensa nos casos de força maior.

"Portanto, quando acontecimentos extraordinários determinam radical alteração no estado de fato contemporâneo à celebração do contrato, acarretando conseqüências imprevisíveis, das quais decorre excessiva onerosidade no cumprimento da obrigação, o vínculo contratual pode ser resolvido ou, a requerimento do prejudicado, o juiz altera o conteúdo do contrato, restaurando o equilíbrio desfeito. Em síntese apertada: ocorrendo anormalidade da álea que todo contrato dependente de futuro encerra, pode-se operar sua resolução ou a redução das prestações" (Contratos, Forense, 1989, 12ª ed., p. 41 e 42).

Contudo, o princípio do pacta sunt servanda não pode ser tratado de forma absoluta, sendo permitida a intervenção estatal nas avenças, sempre que detectado algum desequilíbrio ou ilegalidade.

Neste rumo:

"MÉRITO: POSSIBILIDADE DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INCIDÊNCIA DA LEI 8.078/90. SÚMULA 297 DO STJ. MITIGAÇÃO DO PACTA SUNT SERVANDA E DO PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE. "Estando a relação negocial salvaguardada pelos ditames da legislação consumerista, mitiga-se a aplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda obstando a viabilidade de revisão dos termos pactuados, uma vez que a alteração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, ou até mesmo as que se tornem excessivamente onerosas em decorrência de fato superveniente à assinatura do instrumento, configura direito básico do consumidor, nos moldes do inc. V do art. 6º da Lei n. 8.078/90. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2014.021514-7, da Capital, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 10-06-2014)." (...) RECURSO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO". (Agravo (§ 1º art. 557 do CPC) em Apelação Cível n. 2015.070933-1, de Blumenau. Rela. Desa. Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer, j. 14-01-2016).

No mais, além da força obrigatória, o direito contratual também é regido por outros princípios, tais como o da boa-fé e do equilíbrio.

5. Juros remuneratórios.

O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o procedimento dos recursos repetitivos, fixou as seguintes teses quanto aos juros remuneratórios:

"I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS."a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;"b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;"c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;"d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art....

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