Acórdão Nº 5001807-94.2021.8.24.0064 do Primeira Câmara Criminal, 17-06-2021

Número do processo5001807-94.2021.8.24.0064
Data17 Junho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5001807-94.2021.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

AGRAVANTE: IGOR NATHAN PIRES DE MATTOS FINKES (AGRAVANTE) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Pronunciamento judicial agravado: a juíza de direito Karina Maliska Peiter, da Vara de Execuções Penais da comarca de São José, declarou remidos 52 (cinquenta e dois) dias em favor do apenado Igor Nathan Pires de Mattos Finkes, pela aprovação parcial no Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos - 2019 do Ensino Fundamental, nos moldes do art. 126, § 1º, da Lei de Execução Penal e da Recomendação 44/2013 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ (evento 256 dos autos originários - em 4-2-2021).

Recurso de Agravo de Execução Penal: o apenado, por intermédio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, interpôs recurso e argumentou, em síntese, que "a pessoa que for aprovada no ENCCEJA terá direito à remição de pena de 50% da carga horária legalmente definida, o que implica, para o Ensino Fundamental, em 1600 (mil e seiscentas) horas, [...] o que importa em 133 dias de remição. [...] No caso concreto, a pessoa presa logrou êxito em ser aprovada em 4 campos de conhecimento, motivo pelo qual tem direito a remir 104 dias de sua pena."

Requereu o conhecimento e provimento do presente recurso a fim de reformar a decisão impugnada para conceder ao apenado a remição de 104 dias, pela aprovação no ENCCEJA 2019 (evento 1, Eproc/PG - em 4-2-2021).

Contrarrazões: o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por meio do promotor de justiça João Carlos Teixeira Joaquim, impugnou os argumentos apresentados sob o fundamento de que, "diferentemente do ensino regular, no qual é estabelecido carga horária mínima de 3.200 horas para o ensino fundamental e 2.400 horas para o ensino médio, a teor do art. 24 da Lei nº 9.394/96, no ensino referente à Educação de Jovens e Adultos a carga horária mínima prevista é de 1.600 e 1.200 horas respectivamente, o que deve ser levado em consideração para cálculo da remição mediante aprovação, parcial ou total".

Portanto, "os 50% devem ser considerados da carga horária mínima do ensino fundamental referente ao EJA, ou seja, 800 horas totais (1.600/2 = 800), o que consistiria em 66 dias remidos, ou 13 dias de remição para cada área de conhecimento em que o agravante tenha aprovação".

Postulou a manutenção da decisão objurgada (evento 9, Eproc/PG - em 22-2-2021).

Juízo de retratação: a juíza de direito Karina Maliska Peiter Gerent manteve a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos (evento 11, Eproc/PG - em 18-3-2021).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Gercino Gerson Gomes Neto manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (evento 8 - em 25-5-2021).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se aos argumentos expostos em sede recursal.

O recurso, adianta-se, comporta provimento.

O instituto da remição está previsto no art. 126 da Lei de Execução Penal:

Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.

§ 1º A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:

I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;

II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.

§ 2º As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.

§ 3º Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.

§ 4º O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.

§ 5º O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.

§ 6º O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo.

§ 7º O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.

§ 8º A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.

A remição é um benefício que consiste no "desconto na pena do tempo relativo ao trabalho ou estudo do condenado, conforme a proporção prevista em lei. É um incentivo para que o sentenciado desenvolva uma atividade laboterápica ou ingresse em curso de qualquer nível, aperfeiçoando a sua formação. Constituindo uma das finalidades da pena a reeducação, não há dúvida de que o trabalho e o estudo são fortes instrumentos para tanto, impedindo a ociosidade perniciosa no cárcere. [...] A remição somente é viável quando o sentenciado estiver nos regimes fechado e semiaberto, pois, nessas hipóteses, como regra, deve trabalhar ou estudar no próprio estabelecimento penitenciário. No regime aberto, não cabe remição pelo trabalho, pois é obrigação do condenado, como condição para permanecer no mencionado regime, o exercício de atividade laboral honesta. Entretanto, a Lei 12.433/2011 permitiu a remição, em regime aberto, pelo estudo, como forma de incentivo ao sentenciado para tal atividade (art. 126, § 6º, LEP)" (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. v. 2. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 308).

Ainda, a doutrina esclarece que "a disposição normativa do artigo 126 da LEP não deixava dúvida de que o legislador pretendeu beneficiar, pela remição, o condenado que desenvolvesse atividade laborativa no presídio. No entanto, foram desenvolvidas teses doutrinárias e jurisprudenciais, estendendo o benefício da remição àqueles matriculados em curso de instrução (ensino fundamental, médio e superior). A aludida tese encontrava-se cristalizada no Superior Tribunal de Justiça, que editou a Súmula 341 [A frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo da execução da pena sob regime fechado ou semiaberto]. Como consolidação desses posicionamentos jurisprudenciais e doutrinário, a Lei 12.433/2011 alterou o artigo 126 da LEP, para o fim de incluir o estudo, como uma das formas de o preso poder ser beneficiado com o instituto da remição" (COIMBRA, Mário; HAMMERSCHMIDT, Denise; MARANHÃO, Douglas Bonaldi; PRADO, Luiz Regis. Direito de execução penal. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 174/175).

A redação do art. 126, I, da LEP, delimita o abreviamento de 1 (um) dia pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar, atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, superior, ou, ainda, de requalificação profissional.

A interpretação literal do referido artigo de lei sugere que apenas será beneficiado com a remição por estudo aquele apenado que tiver frequência escolar, seja atividade de ensino fundamental, médio, profissionalizante, superior ou requalificação profissional.

Todavia, o Superior Tribunal de Justiça, sob a ótica da finalidade da pena, admite a interpretação extensiva in bonam partem do art. 126 da LEP, vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO A QUE SE NEGOU SEGUIMENTO. EVIDENCIADO CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM EXPEDIDA DE OFÍCIO. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELA LEITURA. POSSIBILIDADE. 1. Apesar de se ter solidificado o entendimento da impossibilidade de utilização do habeas corpus como substitutivo do meio cabível, o Superior Tribunal de Justiça analisa, com a devida atenção e caso a caso, a existência de manifesta coação à liberdade de locomoção. 2. A jurisprudência da Sexta Turma é firme quanto a admitir a remição da pena pela leitura nos termos da Portaria conjunta n. 276/2012, do Departamento Penitenciário Nacional/MJ e do Conselho da Justiça Federal, bem como da Recomendação n. 44/2013 do Conselho Nacional de Justiça. 3. A norma do art. 126 da LEP, ao possibilitar a abreviação da pena, tem por objetivo a ressocialização do condenado, sendo possível o uso da analogia in bonam partem, que admita o benefício em comento, em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal (REsp n. 744.032/SP, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 5/6/2006). 4. Sendo um dos objetivos da Lei de Execução Penal, ao instituir a remição, incentivar o bom comportamento do sentenciado e sua readaptação ao convívio social, a interpretação extensiva do mencionado dispositivo impõe-se nessas circunstâncias, o que revela, inclusive, a crença do Poder Judiciário na leitura como método factível para o alcance da harmônica reintegração à vida em sociedade. 5. Na espécie, embora não fosse cabível o habeas corpus no lugar do recurso especial, diante dos precedentes a respeito do tema, ficou caracterizada a existência de manifesto constrangimento ilegal a ser reparado, justificando-se, assim, a concessão, de ofício, da ordem para restabelecer o decisum do Juízo da execução que declarou remidos 8 dias da pena do paciente. 6. Agravo regimental improvido (AgRg no HC 323.766/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. em 17.9.2015, v.u.). (grifado)

Nesses termos, é legítimo concluir que a ausência de expressa menção legal não constitui elemento impeditivo para a remição da pena por outros meios não...

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