Acórdão Nº 5001879-05.2019.8.24.0015 do Segunda Câmara de Direito Civil, 27-01-2022

Número do processo5001879-05.2019.8.24.0015
Data27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001879-05.2019.8.24.0015/SC

RELATOR: Desembargador RUBENS SCHULZ

APELANTE: JANICE HAAS DE SOUZA CASTILHO (AUTOR) APELANTE: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Janice Haas de Souza Castilho e Celesc Distribuição S/A interpuseram recurso de apelação contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de indenização por danos materiais, condenando a ré a pagar ao autor o valor de R$ 22.551,88 (vinte e dois mil quinhentos e cinquenta e um reais e oitenta e oito centavos), bem assim ao reembolso dos honorários do perito extrajudicial (R$ 1.200,00), corrigidos, pelo INPC, desde a data do prejuízo/desembolso até a data do efetivo pagamento e acrescidos de juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação. Diante da sucumbência recíproca, condenou as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 30% (trinta por cento) devidos pela parte autora e 70% (setenta por cento) pela parte ré, e dos honorários advocatícios, esses arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, em favor do procurador da parte autora, e em 15% (quinze por cento) sobre a diferença da condenação e o valor pleiteado na petição inicial, em favor do procurador da parte ré, vedada a compensação (art. 85, § 16, CPC), corrigidos monetariamente, pelo INPC, a contar da data do arbitramento e acrescidos de juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, a partir do trânsito em julgado (art. 85, § 16, CPC). No mais, considerando o valor da indenização e a situação de ter adiantado valores periciais (ao perito extrajudicial) em montante expressivo, o juiz de primeiro grau revogou a gratuidade outrora concedida à parte autora (ev. 72).

Em suas razões recursais, a ré se insurge contra a condenação ao pagamento de indenização por danos materiais atinentes à perda da qualidade/quantidade do fumo. Para tanto, sustenta que cumpre todas as metas estabelecidas pela ANEEL, sua agência reguladora, quanto aos limites de interrupção por consumidor (DIC), à frequência de interrupção (FIC) e à duração máxima de interrupção por consumidor (DMIC), satisfazendo, assim, os índices de qualidade impostos pelo Poder Concedente e, consequentemente, prestando um serviço adequado nos termos da lei; que outros fatores podem ter contribuído para a perda da qualidade do fumo, como a própria qualidade da construção da estufa, sua temperatura, a qualidade do fumo extraído da lavoura, dentre outros; que o laudo técnico não possui liquidez e certeza no que diz respeito ao quantum debeatur, porquanto não é capaz de afirmar qual foi o prejuízo experimentado com a perda do fumo, além de se tratar de prova unilateral; que, mesmo na hipótese do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, admitem-se as excludentes de responsabilidade, como o caso fortuito e a força maior, sendo imprescindível, no caso, a comprovação do dolo ou culpa da concessionária pelo evento descrito nos autos; que a queda de energia se deu em razão eventos naturais, imprevisíveis e inevitáveis pela acionada; que o risco do dano em comento não é inerente à atividade desenvolvida pela concessionária ré; que o fornecimento de energia elétrica não é classificado como serviço essencial e, por isso, admite interrupções, o que não viola o princípio da continuidade; que é dever do agricultor adotar precauções mínimas, a fim de mitigar o próprio prejuízo; que a perícia não pode ser recebida com 100% (cem por cento) de confiabilidade pelo órgão julgador, pois mesmo que o perito seja de confiança, este jamais poderá atestar que o fumo periciado é realmente daquela propriedade vistoriada; que a produção de fumo possui várias etapas, o que resulta em classificações diversas de tabaco; que, para a correta avaliação dos prejuízos, é necessário se conferir as médias anteriores em caso de perda total e a efetiva comercialização dos fumos alegados como desclassificados em caso de perda de qualidade. Assim, requer a reforma da sentença, para que os pedidos formulados na petição inicial sejam julgados totalmente improcedentes, redistribuindo-se, por decorrência lógica, os ônus de sucumbência, e, subsidiariamente, que se remeta à liquidação a apuração dos danos (ev. 78).

No recurso interposto pela autora, essa se insurge contra o capítulo decisório que rejeitou o pedido de indenização pelos danos advindos da contratação de mão de obra e da compra de lenha. Para tanto, afirma que referidos prejuízos materiais foram suficientemente comprovados tanto pelo laudo extrajudicial como pelo laudo pericial elaborado sob o crivo do contraditório; que os gastos com mão de obra e lenha fazem parte dos custos de produção e estão embutidos no preço final de venda; que aludidos gastos, embora estimáveis, não são mensuráveis documentalmente por meio de recibos ou contratos, sobretudo diante da informalidade em que se realiza a contratação da mão de obra e a compra da lenha - muitas vezes, de outros produtores vizinhos; que referidas despesas se caracterizam como extras, justamente porque decorrem do evento danoso causado pela ré, ou seja, não estão compreendidas no custo normal da produção. A autora também se insurge contra a revogação do benefício da gratuidade da justiça. Para tanto, afirma que realizou o pagamento do profissional técnico de forma parcelada; que o valor da causa corresponde ao numerário devido a título de reparação civil dos prejuízos acarretados pela falha na prestação do serviço, e não ao lucro e/ou rendimento auferido pela autora com a atividade produtiva; que o lucro líquido obtido com a comercialização do fumo equivale a cerca de apenas 15% (quinze por cento) do valor do produto, sendo o restante utilizado para pagar os custos da produção; que, nessa linha, do valor da condenação (R$ 22.551,88), cerca de R$ 19.196,10 (dezenove reais e vinte centavos e dez centavos) é destinado aos custos de produção. Assim, requer a reforma da sentença, a fim de que a) a ré seja condenada à reparação civil por danos materiais no valor total de R$ 32.255,98 (trinta e dois mil duzentos e cinquenta e cinco reais e noventa e oito centavos) - R$ 26.835,98 (vinte e seis mil oitocentos e trinta e cinco reais e noventa e oito centavos) pela perda do produto e R$ 5.420,00 (cinco mil quatrocentos e vinte reais) pelas despesas com mão de obra e lenha -, acrescido dos consectários legais, redistribuindo-se, por consequência, os ônus de sucumbência e b) seja mantida a benesse da gratuidade da justiça em favor da autora (ev. 85).

Apresentadas as contrarrazões (ev. 83 e 87), os autos ascenderam a esta eg. Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se ao exame do seu objeto.

Ademais, destaca-se que a apreciação do presente recurso, em detrimento de outros que estão há mais tempo conclusos neste gabinete, não afronta o critério cronológico de julgamento dos processos, previsto no artigo 12 do Código de Processo Civil. Ao revés, valendo-se da interpretação do parágrafo 2º do referido artigo, tratando-se de causa relativamente simples, antecipar o seu julgamento privilegia a celeridade e a economia processual e contribui para o desafogamento do Judiciário, uma das diretrizes da novel legislação.

1 RECURSO DA RÉ

Cuida-se de apelação cível interposta contra sentença que, nos autos da ação de responsabilidade civil por danos materiais ajuizada por Janice Haas de Souza Castilho, condenou a requerida, Celesc Distribuição S/A, ao pagamento de indenização por danos materiais, decorrentes da interrupção do fornecimento de energia elétrica, no valor de R$ 22.551,88 (vinte e dois mil quinhentos e cinquenta e um reais e oitenta e oito centavos), corrigido monetariamente, pelo INPC, a partir do prejuízo e acrescido de juros de mora, à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da data da citação, bem assim ao reembolso dos honorários do perito extrajudicial (R$ 1.200,00), corrigidos, pelo INPC, desde a data do desembolso até a data do efetivo pagamento e acrescidos de juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação.

Indiscutível que, no caso, a relação existente entre a concessionária prestadora de serviço público e o produtor de fumo é de consumo e, assim, regida pelo Código de Defesa do Consumidor, bem como que o fornecimento de energia elétrica é classificado como serviço público essencial. É esse o entendimento emanado do Superior Tribunal de Justiça:

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece ser aplicável o Código de Defesa do Consumidor às relações entre concessionária de serviço público e o usuário final, para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como energia elétrica (AgRg no REsp 1421766/RS, rel. Min. Olindo Menezes, Primeira Turma, j. 17-12-2015).

Na mesma linha, consulte-se: AgRg no AREsp 479.632/MS, rela. Mina. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 3-12-2014; AgRg no AREsp 372.327/RJ, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 18-6-2014; AgRg no AREsp 483.243/rj, rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 2-6-2014 e AgRg no AREsp 354.991/RJ, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 11-9-2013.

Deste eg. Tribunal, conferir: Apelação Cível n. 0300789-25.2016.8.24.0032, de Itaiópolis, rel. Des. Saul Steil, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 23-2-2017).

A ré defende que interrupções episódicas na prestação do serviço...

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