Acórdão Nº 5001898-13.2021.8.24.0024 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 11-08-2022

Número do processo5001898-13.2021.8.24.0024
Data11 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001898-13.2021.8.24.0024/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: OSVALDO ALVES DE MATOS (AUTOR) ADVOGADO: NERIANE OGNIBENE (OAB SC036127) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: SIGISFREDO HOEPERS (OAB SC007478) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Da ação

Adota-se o relatório da sentença recorrida (Evento 19), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Osvaldo Alves de Matos, por meio de sua procuradora legalmente constituída, ingressou com "ação de repetição de indébito c/c indenização por danos morais" em face de Banco BMG S/A, ambas as partes qualificadas nos autos.

A parte autora alegou, em resumo, que: i) firmou contrato de empréstimo com a parte ré, na modalidade consignação em folha; ii) no entanto, disse que não tinha conhecimento de que, juntamente com o empréstimo, adquiriu, também um cartão de crédito com reserva de margem (RMC); iii) a contratação realizada não foi solicitada; iv) em razão disso, desde o mês de janeiro de 2018, a parte ré vem realizando descontos ilegais em seu benefício previdenciário.

Ao final, além dos requerimentos de praxe, pleiteou a inversão do ônus da prova, a declaração de nulidade dos débitos cobrados indevidamente, a repetição de indébito, no valor de R$ 3.960,00 (três mil novecentos e sessenta reais), e a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) (Evento 1, INIC1).

Juntou documentos (Evento 1).

Os pedidos de gratuidade judicial e de inversão do ônus da prova foram deferidos (Evento 5, DESPADEC1).

Devidamente citada (Evento 10, AR1), a parte ré habilitou-se aos autos (Evento 8) e apresentou contestação (Evento 9, CONT1), na qual alegou, preliminarmente, a prescrição da pretensão de repetição de indébito e de indenização por danos morais, bem como a falta de interesse processual, ao argumento de que não houve comprovação da existência de fatos constitutivos do direito da parte autora. No mérito, aduziu que: i) a parte autora contratou cartão de crédito em 18.01.2018 (adesão n. 50757971), oportunidade em que foi acordada a averbação de reserva de margem consignável (RMC), destinada ao desconto do valor mínimo das faturas geradas, conforme a utilização do cartão; ii) a parte autora efetuou dois saques, em 19.01.2018 e em 08.04.2020, nos valores, respectivamente, de R$ 1.198,90 (um mil cento e noventa e oito reais e noventa centavos) e de R$ 415,28 (quatrocentos e quinze reais e vinte e oito centavos), cujos créditos foram disponibilizados em conta bancária de sua titularidade. No mais, teceu considerações acerca da modalidade pactuada. Sustentou a inviabilidade da inversão do ônus da prova, a inexistência de dano moral, e a impossibilidade de restituição dos valores descontados, requerendo a improcedência dos pedidos. Alternativamente, requereu a devolução ou compensação dos valores disponibilizados à parte autora.

Juntou documentos (Evento 10).

A parte autora apresentou réplica (Evento 17).

Vieram os autos conclusos.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. FERNANDA PEREIRA NUNES, da 1ª Vara da Comarca de Fraiburgo, julgou procedente os pedidos iniciais, nos seguintes termos:

Ante ao exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo procedentes os pedidos formulados por Osvaldo Alves de Matos na presente ação ajuizada em desfavor de Banco BMG S/A, extinguindo o feito com resolução do mérito, para:

a) declarar a nulidade a contratação do cartão de crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC;

b) condenar a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, da importância de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de indenização por danos morais, com a incidência de correção monetária pelo INPC, a contar da data da publicação da presente sentença, e de juros de mora na monta de 1% ao mês, a partir do evento danoso, no caso, o primeiro desconto indevido;

c) condenar a parte ré a restituir em favor da parte autora, em dobro, os valores que lhe foram indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, e cujo pagamento seja efetivamente comprovado pela parte autora em fase de liquidação de sentença, por mero cálculo aritmético, na forma do art. 509, § 2°, do novo Código de Processo Civil, com a incidência de correção monetária pelo INPC, a partir de cada desembolso indevido, e de juros de mora na monta de 1% ao mês a contar da citação, admitida a compensação entre créditos e débitos, nos termos da fundamentação. Os valores recebidos pela parte autora por meio dos saques deverão ser devolvidos devidamente corrigidos pelo índice da Corregedoria Geral de Justiça desde a data de cada saque, sem, contudo, a incidência de juros de mora.

Determino a imediata suspensão dos descontos relativos à reserva de margem consignável do benefício previdenciário da parte autora (n.149.119.621-9).

Oficie-se ao INSS para suspender os descontos, em 10 (dez) dias, sob pena de desobediência.

Nada obstante a ordem ao INSS, determino ao requerido que promova os atos para suspender os descontos no prazo de 10 dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00, limitada a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), sem prejuízo de, na eventual omissão, caracterizar ato de desobediência.

Registro, em tempo, que "É possível a cominação de multa diária para garantir a eficácia de provimento judicial que implique reconhecimento de obrigação de fazer ou de não fazer, na forma do art. 536, § 1º, do CPC e do art. 84 do CDC" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4020105-91.2017.8.24.0000, de Criciúma, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 16-08-2018).

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes últimos arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. (Evento 19).

Da Apelação de OSVALDO ALVES DE MATOS

Inconformado com a prestação jurisdicional, o autor OSVALDO ALVES DE MATOS, interpôs recurso de Apelação (Evento 24), sustentando, em síntese, que ao ser ludibriado com a forma de contração proposta pelo Banco Apelado, faz jus a majoração da indenização do dano moral por ele suportado.

Da Apelação do BANCO BMG S/A

Também inconformado, o réu BANCO BMG S/A, interpôs recurso de Apelação (Evento 29), sustentando, preliminarmente, a ocorrência da prescrição e a inaplicabilidade da multa cominatória. No mérito, argumenta, em síntese, que a lide versa sobre a existência de suposto dano, desamparada de qualquer meio de prova, não sendo argumento suficiente para ensejar a alteração do contrato firmado, devendo a demanda ser julgada improcedente pela falta de comprovação do fato constitutivo do direito.

Aduz que o Autor não foi ludibriado na contratação, pois anuiu com todas as informações prestadas no instrumento contratual.

Defende a inexistência de qualquer defeito no negócio jurídico, devendo ser mantido o contrato nos termos pactuados, sob pena de violar o princípio da boa-fé contratual, pois o Autor busca apenas eximir-se das responsabilidades assumidas.

Sustenta a legalidade do saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado, conforme prevê a Lei n. 10.820/2003, com alterações dadas pela Lei n. 13.172/2015. Ainda, argumenta que a margem para empréstimos consignados já havia sido consumida, tornando o cartão de crédito o único meio viável para conseguir os valores sacados.

Com relação ao dano moral, alega não estar caracterizada qualquer agressão aos direitos da personalidade do consumidor. Alega, ainda, o descabimento da repetição do indébito em dobro, visto que os descontos decorreram de contratação legítima.

Requer, nesses termos, a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais.

Das contrarrazões

Devidamente intimados, o Autor apresentou contrarrazões de Apelação no Evento 34 e o Réu no Evento 37.

Após, vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merecem ser conhecidos.

II - Do julgamento conjunto dos recursos

a) Da prejudicial de mérito (prescrição) arguida pela Instituição Financeira

Suscita o Banco, em preliminar de Apelação, a ocorrência da prescrição da pretensão do Requerente.

Contudo, sem razão.

Isso porque, "a presente demanda visa à reparação dos danos decorrentes de descontos supostamente indevidos lançados em benefício previdenciário, o que sujeita a aplicação ao caso do aludido art. 27 do Código de Defesa do Consumidor." (Apelação Cível n. 0302438-71.2019.8.24.0015, de Canoinhas, rel. Des. ROBERTO LUCAS PACHECO, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21/05/2020).

Assim, considerando que entre a data do ajuizamento da ação (29/04/2021) e a data do último desconto mencionado nos autos (maio de 2021, Evento 9 - ANEXO 3) não transcorreu prazo superior a 5 (cinco) anos, não há falar em prescrição.

Segundo a orientação do Superior Tribunal de Justiça:

[...] em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido...

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