Acórdão Nº 5001937-13.2020.8.24.0002 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 09-06-2022

Número do processo5001937-13.2020.8.24.0002
Data09 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001937-13.2020.8.24.0002/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: MARIA JOSE VAIS FLORES (AUTOR) ADVOGADO: ADILSON NARCISO (OAB SC032464) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU) ADVOGADO: ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO (OAB SC043613)

RELATÓRIO

Maria José Vais Flores interpôs recurso de apelação cível da sentença do Evento 31 dos autos de origem, proferida pelo juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário, que julgou improcedentes os pedidos por ela formulados em ação Revisional ajuizada em face do Banco Pan S/A.

Cuida-se, na origem, de ação revisional aforada 3-4-2020 por Maria José Vais Flores, tendo por objetivo a modificação de contrato de empréstimo consignado pactuado com a instituição financeira demandada, na qual alegou a autora a existência de abusividades contratuais referentes à taxa de juros remuneratórios aplicada acima da média de mercado e a respectiva capitalização. Suscitou a aplicação do código consumerista com a inversão do ônus probatório e apresentação de documentos pela parte demandada, pugnando pelo afastamento das cláusulas reputadas abusivas e a devolução do valor que considera ter pago a maior.

Recebida a inicial, foi concedido o benefício da justiça gratuita (Evento 8 dos autos de origem).

Devidamente citado, o Banco Pan S/A, em contestação (Evento 13 - OUT1 dos autos de origem), argumentou, inicialmente, a manutenção do contrato nos termos pactuados, alegando, neste sentido, a ausência de cláusulas contratuais que violassem disposições da legislação consumerista. Sustentou a legalidade das taxas de juros contratadas e da respectiva forma de capitalização. Suscitou a ausência de fundamentos para o dever de repetição de indébito, pugnando, ao final, pela improcedência da demanda.

Intimada, a parte autora não se manifestou sobre a contestação (Evento 20 dos autos de origem).

Sobreveio sentença de mérito, prolatada em 24-10-2021 pela magistrada Karina Maliska Peiter, da Unidade Estadual de Direito Bancário, que julgou improcedentes os pedidos revisionais, o que se deu nos seguintes termos (Evento 31 dos autos de origem):

Trata-se de ''ação de revisão contratual de empréstimo consignado c/c pedido de exibição de documentos'' ajuizada por MARIA JOSE VAIS FLORES em face de BANCO PAN S.A., ambos já qualificados na inicial.

Alegou, em suma, que celebrou com a parte ré um contrato de empréstimo pessoal consignado para aposentados e pensionistas do INSS, todavia, foram incluídas no pacto cláusulas abusivas e que merecem revisão.

Assim, requereu a adequação do contrato aos parâmetros permitidos pela lei, com a revisão das cláusulas abusivas, especialmente aquelas relacionadas à capitalização mensal de juros, aos juros remuneratórios e a exclusão de todas as taxas abusivas, bem como a parte adversa seja condenada à restituição dos valores indevidamente pagos.

Citada (evento 12), a parte ré contestou (evento 13), defendendo a legalidade do contrato firmado entre as partes.

Não houve réplica (evento 20).

É o relatório.

DECIDO.

A prova pericial é desnecessária, pois a compreensão da (i)legalidade de disposições contratuais pode ser feita sem a participação de profissional habilitado em contabilidade.

A solução do feito passa unicamente pelo exame de prova documental, que possui momento oportuno para produção, mais especificamente a primeira oportunidade que couber a cada parte se manifestar nos autos (art. 434 do CPC).

Por essa razão, resta autorizado o julgamento antecipado da lide, sem que se possa cogitar de cerceamento de defesa.

Nesse norte:

EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DOS EMBARGANTES-EXECUTADOS. CERCEAMENTO DE DEFESA EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE PERÍCIA. TESE REJEITADA. FEITO QUE SE ENCONTRA INSTRUÍDO PARA O SEU DESLINDE, COM O ARCABOUÇO PROBATÓRIO NELE AMEALHADO.O instituto do julgamento antecipado da lide não ocasiona cerceamento de defesa; ao contrário, evita a produção de atos dispensáveis para a resolução da demanda, notadamente quando o feito está instruído com documentos suficientes para o deslinde da questão (TJSC, AC 0307466-34.2017.8.24.0033, Rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 05.03.2020).

Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor

Em se tratando de contrato bancário, incidente o Código de Defesa do Consumidor, figurando a parte autora, pessoa física ou jurídica, como consumidora e a instituição financeira como prestadora de serviços.

O Superior Tribunal de Justiça assim se pronunciou:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras (Súmula 297).

Dessa forma, o contrato será examinado à luz dos princípios norteadores do Direito do Consumidor, fato que viabiliza a revisão das cláusulas eivadas de nulidade (arts. 6º, V, e 51, IV, do CDC), sem que se possa cogitar de violação ao princípio "pacta sunt servanda".

Dos juros remuneratórios

O revogado art. 192, § 3º, da Constituição Federal previa a limitação de juros em 12 ao ano, mas a sua aplicabilidade sempre esteve condicionada à edição de lei complementar.

A esse respeito:

A norma do §3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar (Súmula Vinculante 7 do STF).

De igual forma, o Supremo Tribunal Federal afastou as instituições integrantes do sistema financeiro nacional das disposições do Decreto 22.626/33:

As disposições do Decreto 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional (Súmula 596).

O Superior Tribunal de Justiça traçou tese semelhante em julgado sob o rito do recurso repetitivo:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade (STJ, Resp 1061530, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22.10.2008).

Ainda, definiu a utilização da taxa média como parâmetro a ser adotado quando o contrato é omisso acerca da taxa contratada:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE PROVA DOS JUROS CONTRATADOS. TAXA MÉDIA. REDUÇÃO DA MULTA MORATÓRIA. CONTRATOS CELEBRADOS A PARTIR DA LEI 9.298/96. PRECEDENTES. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO.1. A atual jurisprudência do STJ dispõe que, nos casos em que não estipulada expressamente a taxa de juros ou na ausência do contrato bancário, deve-se limitar os juros à taxa média de mercado para a espécie do contrato, divulgada pelo Banco Central do Brasil (STJ, AgInt no REsp 1598229, Rel. Min. Raul Araújo, j. 10.12.2019).

Também, reconheceu serem devidos os juros quando não forem significativamente superiores à taxa média do Banco Central:

No caso concreto, não há significativa discrepância entre a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central e o índice pactuado entre as partes, de modo que não é possível reconhecer a alegada abusividade (STJ, AgRg no AREsp 745677, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, j. 3.3.2016).

Nesse diapasão, as instituições financeiras podem praticar juros superiores a 12% ao ano, servido a taxa média de juros do Banco Central como mero parâmetro para...

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