Acórdão Nº 5001998-20.2021.8.24.0039 do Terceira Câmara de Direito Público, 22-11-2022

Número do processo5001998-20.2021.8.24.0039
Data22 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5001998-20.2021.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: CARLOS FABRICIO PIRES PADILHA (RÉU) APELADO: MUNICÍPIO DE LAGES/SC (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Lages, respectivo Município ajuizou ação de "nunciação de obra nova c/c pedido de tutela de urgência e demolição" contra Carlos Fabrício Pires Padilha, objetivando a demolição de obra irregular.

Aduz que o requerido está realizando obra de ampliação e reforma "sem, no entanto possuir projeto aprovado pela secretaria competente, bem como não possui alvará de construção"; que "a obra embargada administrativamente, encontra-se em total estado de irregularidade, estando em desacordo com o que preceitua o Código de Obras e o Plano Diretor do Município de Lages"; que "a ausência de projetos devidamente aprovados pelo ente público e consequentemente a também ausência de alvará de construção", ofende o Código de Obras Municipal e, por isso, "o requerido foi administrativamente notificado, como pode ser observado pela notificação n. 07/2021, emitida em data de 08/02/2021, devidamente recebida e assinada, e mesmo diante a notificação, pela não paralização e posterior regulamentação, houve a necessidade de efetivar-se o embargo administrativo da obra, o qual foi realizado em data de 08 de fevereiro de 2021, preenchendo todos os requisitos necessários e obrigatórios para sua plena validade legal"; que, mesmo com o embargo administrativo, o requerido deu seguimento à sua obra.

Requereu a concessão de tutela provisória para que seja determinado "o embargo judicial da obra que ainda encontra-se em fase de construção" e, ao final, a procedência do pedido inicial, "para determinar a DEMOLIÇÃO da obra na sua parte que encontra-se irregular".

Deferido o pedido de tutela provisória, determinou-se a citação do demandado.

Citado, o demandado apresentou contestação alegando que "não é caso de demolição, pois a obra não apresenta risco de dano à sociedade, não tendo risco de implosão ou de qualquer outra espécie"; que, "não obstante a alegada ausência de projeto, a obra resguarda as medidas e elementos compatíveis com as normas legais de construção"; que a obra "está em fase de realização de planta (projeto) para pedir o alvará de construção perante a prefeitura" e, por isso, "caberia a cominação legal de formalização traduzida na realização do projeto e obtenção de alvará de construção, mas não de demolição"; que o valor arbitrado a título de astreintes é abusivo, pois "o Réu trata-se de pessoa humilde, não tendo condições de arcar com penalidade diária nessa importância". Requereu a concessão da justiça gratuita e, ao fim, a improcedência do pedido inicial.

O Município demandante apresentou réplica à contestação.

Após, sentenciando o feito, o digno Magistrado, Dr. Rafael Steffen da Luz Fontes, julgou procedente o pedido inicial, inscrevendo da parte dispositiva do "decisum":

Ante o exposto, julgo procedente o pedido formulado para determinar a demolição da obra indicada na petição inicial, confirmando os efeitos da tutela provisória anteriormente concedida.

Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado da parte adversa, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.

Indefiro a justiça gratuita, uma vez que a própria natureza da edificação demonstra que o réu possui condições de custear o processo sem prejuízo de seu sustento.

P.R.I.

Transitada em julgado, expeça-se mandado de demolição, destacando que é obrigação da parte demandada promover os meios para cumprimento da ordem ou regularização, no prazo de dez dias, sob pena de multa diária de R$ 200,00, até o limite de R$ 50.000,00.

A partir do sexagésimo dia após o trânsito em julgado, havendo risco à integralidade física de pessoas, fica o Município autorizado a executar a demolição sob as expensas do proprietário da obra, sem prejuízo da multa. Após sua expedição, nenhuma outra providência deverá ser tomada no processo judicial, eis que, por se tratar o autor de órgão da Administração Pública, dispõe das condições necessárias para operacionalizar a execução da ordem, dando suporte necessário ao fiel cumprimento por parte do meirinho, o qual, se necessário, deverá requisitar força policial.

Na hipótese de haver a regularização da obra, nenhum impedimento há para o recolhimento do mandado.

Transitada em julgado, pagas as custas, arquive-se.

Não resignado, o demandado interpôs recurso de apelação, arguindo, preliminarmente, a necessidade de concessão da justiça gratuita; e que há nulidade na sentença, porquanto operou em cerceamento de defesa ao julgar a causa antecipadamente. No mérito, reiterou os termos expostos em sua contestação, no sentido de que a obra pode ser regularizada e de que o valor das astreintes arbitradas é abusivo. Ao fim, requereu o provimento do seu recurso.

Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Guido Feuser, opinou "pelo conhecimento e desprovimento do recurso".

Indeferida a justiça gratuita, a parte autora recorrente efetuou o recolhimento do preparo recursal.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença que, nos autos da ação de "nunciação de obra nova c/c pedido de tutela de urgência e demolição", ajuizada pelo Município de Lages em face de Carlos Fabrício Pires Padilha, julgou procedente o pedido formulado "para determinar a demolição da obra indicada na petição inicial".

Com seu recurso, a parte apelante defende, preliminarmente, que a sentença é nula por cerceamento de defesa. No mérito, reiterou os termos expostos em sua contestação, no sentido de que a obra é regularizável e, por isso, não cabe sua demolição.

Pois bem.

Do alegado cerceamento de defesa

Defende a parte recorrente que a sentença seria nula, porquanto solicitou "expressamente na contestação a produção de todos os meios de prova juridicamente admissíveis, especialmente a documental e pericial, no sentido de demonstrar que a obra não apresenta risco à sociedade e possui as metragens e elementos das normas técnicas legais, não obstante a suposta ausência de projeto e alvará de construção, de forma a ser julgado improcedente o pedido de demolição, quando muito procedente a cominação para a regularização".

Contudo, razão não lhe assiste.

Isso porque o julgamento antecipado da lide sem a produção das referidas provas requeridas pela parte apelante não violou os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal de 1988), e nem sequer as normas insertas nos arts. 355, inciso I, 370 e 369, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015).

É que, nos termos do que dispõem o art. 370 e seu § 1º do CPC/2015, cabe ao Juiz, na condição de presidente do processo e destinatário da prova, decidir sobre a necessidade ou não da realização de provas, não implicando cerceamento de defesa ou violação dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, o julgamento com base em prova exclusivamente documental, se ela for suficiente à formação do convencimento do julgador que, em face disso, tem o poder discricionário de dispensar as demais provas, inclusive, como lhe autoriza o inciso I do art. 470 combinado com o parágrafo único do art. 464 do CPC/2015.

O art. 355, inciso I, do CPC/2015, autoriza o Juiz a proferir sentença independentemente da coleta de provas, se estas forem desnecessárias ao deslinde da causa, até mesmo após saneado o processo.

HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, ao comentar o art. 355 CPC/2015, registrou:

"Em todas as três hipóteses arroladas no art. 330, o juiz, logo após o encerramento da fase postulatória, já se encontra em condições de decidir sobre o mérito da causa, pois:

"a) não se realiza a audiência por desnecessidade de outras provas, além daquelas que já se encontram nos autos (o juiz não deve, segundo o art. 370, promover diligências inúteis); e

"b) não há prova a produzir...

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