Acórdão Nº 5002033-38.2019.8.24.0010 do Primeira Câmara de Direito Público, 29-11-2022

Número do processo5002033-38.2019.8.24.0010
Data29 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002033-38.2019.8.24.0010/SC

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA

APELANTE: JANE NEVES PEREIRA (AUTOR) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Jane Neves Pereira à sentença de improcedência do pedido formulado em ação condenatória ao pagamento de indenização por danos morais que move em desfavor do Estado de Santa Catarina, cuja parte dispositiva se transcreve (evento 22 na origem):

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado por Jane Neves Pereira contra Estado de Santa Catarina, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, que fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, na forma do art. 85, § 2º, do CPC, considerando o zelo dos profissionais, a relativa simplicidade da causa, o tempo de tramitação e a necessidade de produção de provas em audiência. A exigibilidade das verbas, no entanto, fica suspensa, porque a autora é beneficiária da gratuidade de justiça, na forma do art. 98, § 3º, do CPC.

Nas suas razões (evento 28), narrou que perdeu sua mãe vítima de um incêndio ocorrido na Rua Teodoro Bernardo Schlickmann, n. 642, São Francisco de Assis, Braço do Norte, em 26-3-2019, motivo pelo qual o corpo foi enviado ao IML para realização do exame de DNA. Pontuou que foi informada pelo órgão público que a liberação do cadáver levaria em torno de 4-6 meses, tendo em vista que somente um profissional tinha capacitação para a avaliação respectiva. Expôs que, por esse motivo, ingressou com ação judicial para expedição de alvará e consequente liberação do corpo (autos n. 0301085-11.2019.8.24.0010), pedido que embora negado em primeira instancia, foi acatado após interposição de recurso. Disse que somente conseguiu a liberação do corpo de sua mãe na data de 13-9-2019. Asseverou que a demora acarretou elevado grau de constrangimento, impedindo um sepultamento digno para a vítima. Reforçou que o art. 5º, VI, da Constituição Federal de 1988, constitui direito fundamental do cidadão a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e às suas liturgias. Pontuou que "o culto aos mortos, portanto, é constitucionalmente protegido em nossa legislação". Requereu a reforma da sentença e a procedência do pedido inicial.

Ofertadas contrarrazões (evento 32), o feito ascendeu a esta Corte e a douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela não intervenção (evento 9).

Vieram os autos à conclusão para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade. Passa-se à análise das suas razões.

A recorrente relatou no apelo que sua mãe, Agueda Neves Pereira, foi encontrada sem vida em sua residência no dia 26-3-2019, após um incêndio ocorrido no local; que o corpo permaneceu no IML aguardando a realização do exame de DNA, tendo em vista que o Estado de Santa Catarina possui apenas 1 (um) profissional que realiza esse tipo de exame; que, segundo informações obtidas com o Delegado de Polícia, o IML fez a coleta do material biológico, mas a previsão para o exame ser finalizado era de 4 (quatro) a 6 (seis) meses; e que ingressou com demanda judicial em 8-4-2019 a fim de obter a liberação do corpo com urgência, invocando o princípio da dignidade humana, a liberdade de consciência e de crença, o direito ao livre exercício de cultos religiosos, em especial o culto aos mortos, salientando que o ato de sepultar é de extrema relevância tanto para os familiares quanto para a falecida. Assim, alegou que houve desleixo do Estado de Santa Catarina no caso em apreço, pois ocorreu suposto esquecimento do corpo nos escaninhos do IML, e a recorrente necessitou buscar a intervenção do Poder Judiciário para liberação.

Na espécie, as partes se submetem ao regime jurídico de responsabilidade civil previsto no art. 5º, V e X, da CF/1988, bem como nos arts. 186, 187 e 927, ambos do Código Civil.

Sabe-se que, em tais casos, a Administração Pública está sujeita, em regra geral, a responsabilidade prevista no art. 37, § 6º da CF, ou seja, de caráter objetivo, in verbis:

Art. 37. [...]

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Sobre o dispositivo em comento pertinente é o ensinamento de Hely Lopes Meirelles:

O exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de...

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