Acórdão Nº 5002081-79.2021.8.24.0057 do Quarta Câmara de Direito Público, 08-12-2022

Número do processo5002081-79.2021.8.24.0057
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002081-79.2021.8.24.0057/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: ANTHONY GABRIEL MELO EGER (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Santo Amaro da Imperatriz, Anthony Gabriel Melo Eger, representado por seu genitor, Marcos Eger, ajuizou ação de obrigação de fazer contra Estado de Santa Catarina.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença (Evento 99, 1G):

Anthony Gabriel Melo Eger, menor impúbere, devidamente representado por seu genitor, ingressou com a presente ação de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada em desfavor do Estado de Santa Catarina - na qualidade de gestor do plano de saúde SC Saúde -, sustentando, em síntese, que é beneficiário de plano contratado com a empresa ré e que é portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA) - Cid 10 F84-0.

Diante do seu quadro de saúde, necessita de diversos tratamentos, dentre eles a terapia ocupacional. Todavia, o requerido indicou as seguintes localidades para realização do tratamento: Içara-SC; Lages-SC; Concórdia-SC e Itajaí-SC.

Ocorre que o requerente reside em Rancho Queimado-SC, e todas as opções apontadas pelo réu são muito distantes de sua residência, violando a função social do contrato, assim como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, razão pela qual requer que a Terapia Ocupacional dê-se no âmbito da Grande Florianópolis.

Disse ainda que precisou iniciar o tratamento com seus próprios recursos, em clínica localizada na vizinha cidade de Palhoça, mas, no entanto, a família não tem condições de suportar respectivos custos sem prejuízo ao próprio sustento da família.

Assim, tendo em vista a urgência do caso, pleiteou, em sede de tutela de urgência, que o demandado custeie a realização da terapia ocupacional na clínica em que já vem realizando o tratamento ou que indique outro profissional ou clínica na região da Grande Florianópolis.

Ao final, requereu: a) a concessão da tutela antecipada; b) a confirmação dos efeitos da tutela, condenando-se o réu, em definitivo, ao pagamento das referidas sessões; c) a condenação do réu ao reembolso do valor de R$ 1.140,00 (um mil e duzentos reais), referente às sessões não ressarcidas; e d) a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Valorou a causa e juntou documentos.

Nos termos da decisão proferida no Evento 27, deferiu-se a tutela de urgência e determinou-se a citação do réu.

Citado (Evento 33), o requerido apresentou contestação (Evento 35) impugnando a concessão da Justiça Gratuita. No mérito, rechaçou os termos da exordial, sustentando não haver falha na prestação dos serviços contratados, uma vez que não é legítima a escolha, pelo próprio paciente, de tratamento alternativo. Sustentou, ainda, inexistir situação capaz de ensejar danos materiais ou morais, uma vez que não houve comprovação das respectivas despesas, bem como a negativa de fornecimento da prestação de saúde perseguida se deu com base nas normas do direito material vigentes, razão pela qual manifestou-se pela improcedência dos pedidos da exordial. Juntou documentos.

No Evento 41, a parte autora sustentou o descumprimento da liminar pelo réu, pugnando pela fixação de multa e ressarcimento dos valores já despendidos.

Determinou-se o bloqueio de valores junto às contas bancárias do requerido (Evento 43).

O requerido prestou informações no Evento 54.

Houve réplica (Evento 56) e manifestação ministerial no Evento 59.

No Evento 65 este juízo afastou a preliminar arguida pelo réu, saneando o feito e determinando a intimação das partes para indicarem as provas a serem produzidas.

O Estado de Santa Catarina informou não possuir provas a produzir (Evento 73).

A parte autora reiterou pedido de fixação de multa por descumprimento da liminar, bem como ressarcimento das despesas havidas com o tratamento pleiteado, ainda não coberto pelo requerido (Evento 75). Juntou documentos.

Manifestação ministerial no Evento 80.

No Evento 82 fixou-se multa em face do réu, bem como determinou-se a apresentação das alegações finais, o que foi cumprido nos Eventos 91 e 93.

O requerido prestou informações no Evento 92.

Manifestação ministerial no Evento 97.

Devidamente instruída, a lide foi julgada nos termos retro (Evento 99, 1G):

Diante do exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial por Anthony Gabriel Melo Eger, menor impúbere, devidamente representado por seu genitor, em face do Estado de Santa Catarina, na qualidade de gestor do plano de saúde SC Saúde, para:

a) confirmar os efeitos da tutela de urgência e determinar que o réu assegure o fornecimento das sessões de terapia ocupacional, conforme requisição médica, com profissional ou clínica localizada na região da Grande Florianópolis ou custeie o tratamento já iniciado pelo autor na Clínica Jéssica Souza Terapeuta Ocupacional LTDA, localizada na cidade de Palhoça-SC, sem prejuízo do adimplemento da coparticipação, sob pena de sequestro dos valores necessários a sua efetivação (Enunciado XI do Grupo de Câmaras de Direito Público do TJSC;

b) condenar o réu ao reembolso da quantia de R$ 2.072,00 (dois mil e setenta e dois reais), já descontada a coparticipação de 30% em relação aos procedimentos não ressarcidos ao autor, conforme comprovado no Evento 1 - Nota Fiscal 3 e 4 (R$ 700,00, em 12/07/2021, e R$ 440,00, em 17/06/2021), Evento 41 - Nota Fiscal 3 e 4 (R$ 420,00, em 28/11/2021, e R$ 560,00, em 08/10/2021) e Evento 75 - Nota Fiscal 2 e 3 (R$ 420,00, em 23/12/2021, e R$ 420,00, em 03/02/2022), com juros incidentes desde a negativa administrativa (23/06/2021 - Evento 1 - Outros 14) e correção monetária desde o efetivo desembolso (Súmula 43 do STJ).

Por fim, condeno a parte requerida ao pagamento de honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (art. 85, §2º, do CPC).

O Estado de Santa Catarina e os Municípios catarinenses são isentos das custas processuais por força do art. 33 da Lei Complementar Estadual 156/1997.

Sentença não sujeita ao reexame necessário, conforme art. 496, § 3º, I, do CPC.

Irresignado, o ente estatal recorreu. Argumentou que: a) não há cobertura do procedimento e/ou não há preenchimento dos requisitos regulamentares e adesão facultativa e voluntária ao plano; b) não há comprovação de urgência/emergência que autorize exceção a pagamento de serviços não credenciados no Decreto n. 621/11; c) não há norma a dar suporte ao pedido de indenização por danos materiais; d) quanto aos honorários, inviável a aplicação das regras gerais estabelecidas no art. 85, §3º, inciso I, do CPC sendo necessária a redução da verba (Evento 107, 1G).

Em síntese, requereu:

Por todo o exposto, o Estado de Santa Catarina requer o conhecimento do presente recurso, a concessão de efeito suspensivo e, posteriormente, a reforma da sentença para:

1 julgar o pedido em sua integralidade;

2 seja excluído da condenação o dever de indenizar os alegados danos materiais;

3 o arbitramento dos honorários advocatícios em valor fixo, não superior a R$ 1.000,00.

Pede-se, ainda, o prequestionamento dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais acima citados.

Conquanto cientificada (Eventos 109 e 110, 1G), a parte adversa deixou transcorrer in albis o prazo para oferecer contraminuta.

A Procuradoria-Geral de Justiça, apesar de devidamente intimada (Evento 11, 2G), se manifestou extemporaneamente pelo não conhecimento do reclamo, por ausência de enfrentamento do conteúdo da sentença (Evento 18, 2G).

É o relatório.

VOTO

A celeuma de origem versa sobre o fornecimento de tratamento (terapia ocupacional) de criança que apresenta diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (CID 10 F84), representada por seu genitor, beneficiário do Plano SC Saúde.

Sucede que, ao postular a cobertura do procedimento, o apelante indicou as seguintes cidades catarinenses para realização do tratamento: Içara; Lages; Concórdia e Itajaí. Contudo, são localidades distantes da residência do apelado, que reside em Rancho Queimado.

In casu, o juízo a quo encartou decisum de parcial procedência para determinar que a) o apelante assegure o fornecimento das sessões de terapia ocupacional, conforme requisição médica, com profissional ou clínica localizada na região da Grande Florianópolis ou custeie o tratamento já iniciado pelo apelado em clínica particular na cidade de Palhoça, e b) o reembolso da quantia despendida nos procedimentos não ressarcidos ao apelado (Evento 99, 1G).

Em suas razões insurgentes, o órgão federado argumentou que "o tratamento não consta no Rol de Procedimentos fornecidos pelo Plano SC-Saúde (de natureza pública, fechado)" e que "não há qualquer comprovação de que o tratamento perseguido pela parte recorrida se enquadre na modalidade de urgência prevista em regulamento".

Ainda, defendeu que o "Decreto 621/11, que regulamenta o Plano SC-SAÚDE, é expresso ao excluir dos procedimentos com cobertura as despesas decorrentes de serviços prestados por médicos ou entidades não credenciadas, salvo quando for atendimento de urgência ou emergência - Regulamento, Item 7.I".

Quantos aos danos materiais, acrescentou que não existe norma a dar suporte ao pedido de indenização, "por não ter preenchido os requisitos do Decreto 621/11, ao não ter comprovado qualquer urgência/emergência que autorizasse exceção a pagamento de serviços não credenciados, indevida a condenação do Estado ao ressarcimento material".

De pronto, importante esclarecer que a Lei n. 9.961/2000 criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, estabelecendo como sua competência a elaboração do rol de procedimentos de cobertura obrigatória.

O SC Saúde, por outro vértice, é categorizado como "plano de saúde de autogestão (ou plano fechado), o que significa que não opera em regime de mercado nem tem objetivo...

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