Acórdão Nº 5002083-22.2019.8.24.0024 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 15-10-2020

Número do processo5002083-22.2019.8.24.0024
Data15 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5002083-22.2019.8.24.0024/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: MARIA ORTENILIA FERREIRA (AUTOR) ADVOGADO: VANDERLI FRANCISCO GREGORIO (OAB SC033347) ADVOGADO: NERIANE OGNIBENE (OAB SC036127) APELADO: BANCO BMG SA (RÉU) ADVOGADO: MAIARA SOARES DALPIAZ (OAB SC036381) ADVOGADO: HENRIQUE GINESTE SCHROEDER (OAB SC003780)


RELATÓRIO


Maria Ortenilia Ferreira interpôs recurso de apelação cível (evento 20autos da origem) em face da sentença (evento 16, autos da origem), que, proferida pelo juízo da 1ª Vara da Comarca de Fraiburgo, julgou improcedentes os pedidos formulados na ação de de repetição de indébito cumulada com indenização por danos morais por ela ajuizada em face da instituição financeira apelada, Banco Bmg SA.
Cuida-se, na origem, de ação de repetição de indébito cumulada com indenização por danos morais aforada por Maria Ortenilia Ferreira, na qual pede o reconhecimento da inexistência de contratação de empréstimo consignado na modalidade de cartão de crédito, bem como a condenação da instituição financeira ao ressarcimento dos valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, e a condenação ao pagamento de danos morais, em razão da inexistência de contratação de reserva de margem consignada em seu benefício previdenciário, para contratação de cartão de crédito não solicitado.
No evento 3, autos da origem, foi concedida a gratuidade da justiça requerida pela demandante.
Devidamente citado, o BANCO BMG SA apresentou contestação (evento 10, CONT1, autos da origem), na qual arguiu, inicialmente, a regularidade da contratação realizada entre as partes. Afirmou, neste sentido, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito. Argumentou que, inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência da demanda. Juntou o contrato firmado com a parte autora, comprovantes de disponibilização dos valores sacados do cartão de crédito, bem como cópia das faturas do cartão impugnado.
Manifestação à contestação no evento 14 dos autos da origem, na qual a autora, rebatendo os argumentos da parte adversa, reitera os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.
Sobreveio sentença de mérito prolatada em 09-12-2019 pelo magistrado Luiz Renato Martins de Almeida da 1ª Vara da Comarca de Fraiburgo de Videira, que julgou improcedentes os pedidos formulados pela autora, o que se deu nos seguintes termos (evento 16, autos da origem):
DISPOSITIVO
DIANTE DO EXPOSTO, sentencio com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, inc. I, do CPC, e JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes últimos arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
A exigibilidade da verba sucumbencial devida ficará suspensa por 05 (cinco) anos, diante da gratuidade judicial concedida (CPC, art. 98, § 3º).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Caso haja a apresentação de apelação por qualquer uma das partes e considerando que não há exame de admissibilidade de recurso pelo Juízo de Primeiro Grau, desde já determino a intimação do recorrido para contrarrazoar, em 15 (quinze) dias úteis. Após, encaminhem-se os autos ao egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina (artigo 1.013 do Código de Processo Civil).
Oportunamente, arquivem-se os autos.
Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação (evento 20, autos da origem), em que sustenta, argumenta, em suma: (a) a invalidade do contrato firmado entre as partes. Neste sentido, informa que foi ludibriada pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada. Alega que, diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, tendo em vista que apenas pretendia a contratação de empréstimo e não fornecimento de cartão, o qual reitera jamais ter utilizado ou desbloqueado. Pugna, assim, pelo cancelamento da operação com a suspensão dos descontos em sua folha de pagamento, bem como a devolução da quantia que entende indevidamente cobrada. Defende, (b) a condenação da parte demandada ao pagamento de danos morais decorrentes do abalo sofrido em relação à suposta atitude fraudulenta e aos descontos irregulares perpetrados pela casa bancária., bem como (c) pugna para que seja reconhecida a abusividade da taxa de juros cobrada no ajuste em discussão. Requer o provimento do recurso com a reforma da decisão objurgada.
Não foram apresentadas contrarrazões.
Por meio de despacho vinculado ao evento 8, foi determinada a expedição de ofício para a(o) Sr(a). Superintendente Regional do INSS, requisitando o envio de cópias de extratos de pagamento e de consignações referentes ao benefício da autora os quais aportaram aos autos (evento 14).
Vieram os autos conclusos.
Este é o relatório

VOTO


1. Do exame de admissibilidade do recurso
Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).
Dito isto, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.
2. Da fundamentação
2.1 Do custo efetivo total
Neste ponto, pugna a recorrente pelo reconhecimento da abusividade da taxa de juros prevista no ajuste firmado entre as partes, ao argumento de que "Ressalta-se em relação aos descontos mensais, o fornecimento de cartão de crédito para empréstimo consignado, com Reserva de Margem Consignável - RMC no benefício previdenciário, tem a inserção de taxas de juros acima daquelas praticadas no mercado para operações de crédito pessoal consignado a aposentados e pensionistas do INSS, sendo práticas consideradas abusivas. [...] Contudo, é certo que a intenção da requerente era apenas a contratação de empréstimo consignado em benefício previdenciário e não de cartão de crédito, sendo que visível no contrato anexado à Contestação que a taxa de juros é abusiva, pois é de 3,69% ao mês, como pode ser verificado no Evento 10, CONTR2.Sendo assim, a prática é totalmente ilegal".
A tese, todavia, não merece conhecimento.
Isto porque, em sede da peça inicial, a autora debate apenas a regularidade da contratação, mas em momento algum impugna à taxa de juros contratada.
Assim, não tendo a autora em momento algum da inicial trazido à baila argumentos no sentido de impugnar o índice de juros contratados, a sentença sequer tratou de analisar a demanda sob o prisma ora debatido.
Frisa-se, assim, que, tendo a recorrente somente formulado tal impugnação em sede do presente recurso, por se tratar de inovação recursal, ausente o requisito da dialeticidade hábil a demonstrar o interesse no conhecimento da tese levantada.
Daí porque, nos termos do art. 932, III, do CPC/2015, o recurso não há de ser conhecido neste ponto.
2.2 Da (ir)regularidade da operação contratada entre as partes
Sustenta a autora, inicialmente em seu recurso, a invalidade da operação pactuada com a casa bancária, na medida em que teria sido por ela ludibriada, pois pretendia contratar unicamente empréstimo pessoal consignado, e não saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada.
Analisados os autos, verifica-se, todavia, que sem razão a parte demandante.
A princípio, necessário destacar que a própria autora, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).
As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):
Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.
[...]
Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime...

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