Acórdão Nº 5002136-93.2019.8.24.0091 do Terceira Câmara de Direito Público, 26-01-2021

Número do processo5002136-93.2019.8.24.0091
Data26 Janeiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão










Apelação / Remessa Necessária Nº 5002136-93.2019.8.24.0091/SC



RELATOR: Desembargador PAULO RICARDO BRUSCHI


APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: DIEGO DE OLIVEIRA BORGES (IMPETRANTE) ADVOGADO: LUANA DE OLIVEIRA BORGES (OAB SC033117) APELADO: Comandante Geral - POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis (IMPETRADO) APELADO: POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SANTA CATARINA (IMPETRADO)


RELATÓRIO


O Estado de Santa Catarina, qualificado nos autos e inconformado com a decisão proferida, interpôs Recurso de Apelação, objetivando a reforma da respeitável sentença prolatada pela MM.ª Juíza da Vara de Direito Militar da Comarca da Capital - Eduardo Luz, no "Mandado de Segurança" n. 5002136-93.2019.8.24.0091, impetrado por Diego de Oliveira Borges, igualmente qualificado, a qual concedeu a segurança e, por consequência, anulou as questões ns. 28, 30, 32 e 34, determinando a reclassificação do impetrante no certame. Sem custas e honorários.
Na inicial, o impetrante relatou ter prestado o concurso aberto pelo Edital n. 042/CGCP/2019, para admissão no Curso de Formação de Soldados da Polícia Militar (CFSD), insurgindo-se, no entanto, quanto ao fato de terem sido cobradas na prova objetiva questões que, a seu ver, não estavam previstas no conteúdo programático.
Asseverou que a inclusão de temas não exigidos em edital afrontaria princípios constitucionais, uma vez que a Administração, na formulação das questões de provas de concurso público, vincula-se às regras estabelecidas no instrumento convocatório.
Assim aduzindo, postulou a concessão de medida liminar para suspensão da pontuação relativa às questões ns. 28, 30, 32 e 34, garantindo-lhe a continuidade nas demais fases do certame, bem como sua anulação, eis que o conhecimento exigido para a resolução não constaria do edital de abertura de inscrições do referido concurso, postulando lhe fossem atribuídos, ao final, os pontos atinentes, reclassificando-o na lista de aprovados.
Pugnou, ainda, pela concessão dos benefícios da justiça gratuita e apresentou documentos.
Após emenda da inicial e parcial deferimento da liminar (evento 9), o impetrante interpôs agravo de instrumento, o qual restou posteriormente prejudicado, pela perda do objeto.
Devidamente notificada, a autoridade impetrada apresentou as informações requeridas, destacando que, em reunião extraordinária realizada com a banca do concurso, foi confirmada a validade das questões que o impetrante pretende reavaliar, anotando que, consoante decidido pelo Supremo Tribunal Federal, no tema de repercussão geral n. 485, "não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade" (evento 14).
O representante do Ministério Público deixou assente a desnecessidade de sua intervenção no feito.
Na sequência, o Estado de Santa Catarina requereu seu ingresso na lide (Evento 21).
Sobreveio, então, sentença na qual a Magistrada a quo concedeu a segurança postulada, sob o fundamento de que "as informações prestadas pela autoridade coatora no "evento14" não conseguiram derruir a ilegalidade das questões n. 28, 30, 32 e 34, porquanto ficou evidenciado nos autos a teratologia da cobrança das referidas questões no concurso público em exame".
Irresignado com a prestação jurisdicional efetuada, o Estado de Santa Catarina tempestivamente apresentou recurso a este Colegiado (evento 35). Em sua apelação, aduziu a inexistência de ilegalidade manifesta ou "erro material ou teratológico", salientando que a intervenção do Poder Judiciário em concursos públicos e processos seletivos, nos termos do consolidado entendimento doutrinário e jurisprudencial, se limita ao exame da legalidade, porquanto vedada qualquer outra interferência, em especial para aferir critérios de avaliação ou, de forma direta ou indireta, substituir a própria banca examinadora.
Neste contexto, salientou não extrapolarem as questões sub judice os limites previstos no edital, porquanto sem qualquer irregularidade no processo, com o que inexistente qualquer direito líquido e certo a ser amparado, razão pela qual pugnou pela concessão de efeito suspensivo ao recurso e, por consequência, a reforma da sentença, com a rejeição dos pedidos formulados na inicial.
Contra-arrazoado o recurso (evento 40), o apelado aplaudiu os fundamentos da sentença e rechaçou as disposições da apelação.
Ascenderam os autos a esta Corte.
Recebo-os conclusos.
Este o relatório

VOTO


Objetiva o Estado de Santa Catarina, em sede de apelação, a reforma da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados no presente mandamus e, como corolário, determinou a reclassificação do impetrante no certame relativo ao Edital n. 042/CGCP/2019.
Em prelúdio, registre-se que, nos termos do art. 1°, da Lei n. 12.016, de 07 de agosto de 2009, "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça".
Aliás, sobre o remédio constitucional sub examine, colhe-se da lição de José Afonso da Silva, o seguinte excerto:
"[...] dispõe a Constituição no art. 5º, LXIX: conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. [...] O mandado de segurança é, assim, um remédio constitucional, com natureza de ação civil, posto à disposição de titulares de direito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato ou omissão de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público" (in Curso de Direito Constitucional Positivo, 25ª ed., São Paulo: Malheiros, 2005).
Quanto ao procedimento a ser observado, regulado pela Lei n. 12.016/2009, leciona Paulo Hamilton Siqueira Jr. que:
"A petição, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, em especial o art. 282 do Código de Processo Civil, sendo apresentada em duas vias, e os documentos, que instruírem a primeira, deverão ser reproduzidos, por cópia, na segunda. A inicial indicará, ainda, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições (art. 6º da Lei n. 12.016/2009). Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: 1) que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de dez dias, preste as informações; 2) que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito; 3) que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica (art. 7º da Lei n. 12.016/09) (in Direito Processual Constitucional, 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012).
Aliado a isso, urge se registre a inviabilidade do Poder Judiciário substituir a banca examinadora para avaliar as respostas dadas pelos candidatos, excepcionando-se a eventual hipótese de sua intervenção nos casos em que houver manifesta ilegalidade, hipótese em que poderá, sim, exercer juízo de compatibilidade entre o conteúdo das questões aplicadas e as disposições originalmente contidas no edital.
A propósito, tal entendimento restou assentado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, ao decidir o Tema 485, no sentido de que "Os critérios adotados por banca examinadora de um concurso não podem ser revistos pelo Poder Judiciário".
Confira-se a ementa do precitado aresto:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. 2. CONCURSO PÚBLICO. CORREÇÃO DE PROVA.Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. Precedentes. 3. Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame. Precedentes. 4. Recurso extraordinário provido (RE n. 632853/CE, Relator: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 23/04/2015).
Do mesmo modo, o Superior Tribunal de Justiça mantém o entendimento de que ao Poder Judiciário não é dado substituir-se à banca de concurso para o fim de corrigir as provas prestadas pelos candidatos, veja-se:
DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. PROVA DISCURSIVA. CORREÇÃO. ILEGALIDADE NÃO EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que é vedado ao Poder Judiciário substituir-se à banca examinadora do certame para reexaminar questões de prova, sob pena de indevida incursão no mérito do ato administrativo, ressalvado o exame da legalidade dos procedimentos e a análise da compatibilidade entre o conteúdo das questões e o previsto no edital do certame. Precedentes: AgInt no RMS 36.643/GO, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 28/9/2017; AgInt no AREsp 237.069/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 30/3/2017; RMS 54.936/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 31/10/2017; AgInt no RE nos EDcl no RMS 50.081/RS, Rel. Min. Humberto Martins, Corte Especial, DJe 21/02/2017; RMS 49.239/MS, Rel. Min. Regina Helena...

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