Acórdão Nº 5002140-13.2020.8.24.0054 do Primeira Câmara de Direito Civil, 19-05-2022

Número do processo5002140-13.2020.8.24.0054
Data19 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002140-13.2020.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: SIDNEI HANG (AUTOR) ADVOGADO: CALUTO JUAREZ ZANDONAI (OAB SC016907) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por SIDNEI HANG em face da sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Rio do Sul que, nos autos da Ação de Reparação de Perdas e Danos nº 5002140-13.2020.8.24.0054, aforada em desfavor de CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial (Evento 65, SENT1, e1).

Em suas razões recursais (Evento 71, APELAÇÃO1, e1), o apelante defendeu o descabimento de se "imputar a responsabilidade pelos prejuízos ao fumicultor/apelante por não ter adquirido um equipamento alternativo de gerador de energia" para não prejudicar a produção de fumo, vez que compete à concessionária o fornecimento de energia de forma contínua e sem interrupções.

Ressaltou que a própria concessionária reconheceu que foi negligente na prestação dos serviços, culminando nos prejuízo relatados na exordial e quantificado por profissional habilitado (Técnico em Agropecuária Fernando Grossklaus) e posteriormente pelo perito judicial.

Defendeu, dessa forma, ser incontroversa a interrupção do fornecimento de energia, cuja consequência foi a ocorrência de dano material a ser indenizado, atestado no laudo pericial, além do custo despendido com a confecção de laudo extrajudicial.

Requereu, ao final, a reforma da sentença e a condenação da ré ao pagamento de indenização pelos danos suportados, e a inversão dos ônus sucumbenciais.

Com as contrarrazões (evento 76, da origem), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, motivo pelo qual dele se conhece.

Ultrapassada a quaestio, o apelante sustenta, em síntese, que a falha no fornecimento de energia elétrica pela apelada acarretou-lhe danos materiais, os quais comprovados por meio do laudo técnico.

A parte apelada, a sua vez, sustenta que a interrupção ocorreu por breve lapso temporal, não ultrapassando um intervalo razoável, bem como que o infortúnio suportado pelo autor decorre de caso fortuito ou força maior.

O recurso, adianta-se, comporta provimento.

1. Da ocorrência do evento danoso

Ab initio, há que se ressaltar que o caderno processual indica não haver controvérsia acerca da ocorrência na interrupção de fornecimento de energia elétrica, tendo em vista que a própria apelada informou o fato na origem, ocorrido nos dias 25 e 31 de outubro de 2019, que as interrupções alcançaram 501 minutos, conforme Sistema Integrado de Manutenção e Operação (Evento 9, ANEXO2, E1), veja-se:

Dt. Início Dt. Final Tempo (min) Causa

25/10/2013 18:18 25 23:18 300 79 NÃO IDENTIFICADA

31/10/2019 31 09:18 201 2 ACIDENTAL

(...)

Neste particular, imperioso esclarecer que o tema enfrentado neste apelo já possui respaldo na jurisprudência desta Corte de Justiça que, em casos análogos, reconhece a responsabilidade objetiva da concessionária decorrente de interrupção de fornecimento de energia elétrica e os danos ocasionados em safra de fumo.

E desponta da hipótese a irrelevância do tempo de interrupção de energia elétrica quando o laudo apresentado nos autos, do contrário, atesta dos danos em questão, como se verá.

Em casos semelhantes, já julgou este Tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS AJUIZADA POR FUMICULTOR CONTRA CELESC. PARTE AUTORA QUE TEVE PREJUDICADA A QUALIDADE DE SUA PRODUÇÃO DE FOLHAS SECAS DE FUMO EM RAZÃO DE INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE PRONCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ.ALEGAÇÃO DE QUE INTERRUPÇÃO INFERIOR A TRÊS HORAS CONSECUTIVAS NÃO CAUSARIAM DANOS À PRODUÇÃO DE FUMO. INSUBSISTÊNCIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO SUPERIOR A CINCO HORAS. ADEMAIS, RESPONSABILIZAÇÃO OBJETIVA DA RÉ. CAUSA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE NÃO VERIFICADA. LAUDO PERICIAL ATESTANDO EFETIVO PREJUÍZO DO ATOR DECORRENTE DE ATO ILÍCITO DA REQUERIDA. DEVER DE INDENIZAR CARACTETIZADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE.REQUERIDA LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO. PEDIDO INDEFERIDO. CONDENAÇÃO EMBASADA EM PROVA TÉCNICA, PRODUZIDA POR PROFISSIONAL DE CONFIANÇA DO JUÍZO, QUE APUROU VALOR LÍQUIDO E CERTO. PRESCINDIBILIDADE DA LIQUIDAÇÃO.HONORÁRIOS RECURSAIS DEVIDOS.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0300284-63.2018.8.24.0032, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 15-04-2021 - grifou-se).

Ou seja, a jurisprudência deste Sodalício orientou-se no sentido de que o afastamento da obrigação de indenizar pela ruptura do nexo causal diante da ocorrência de evento imprevísivel não admite alegações simplistas no sentido de que a queda no fornecimento deu-se por conta de intempéries comuns à mudança climática cotidiana. Há necessidade de que se trate de eventos naturais incomuns, catastróficos e anormais, capazes de ocasionar prejuízos de larga extensão em residências, estabelecimentos comerciais, lugares públicos, etc, fatos não encontrados nos autos e que a Celesc não comprovou.

E a despeito da argumentação da concessionária no sentido de refutar a ocorrência de danos à safra de fumo do autor/apelante, a documentação carreada aos autos contraria fundamentadamente tal tese.

Urge destacar a diligência probatória do apelante que, tão logo à ocorrência das interrupções de energia e a constatação de prejuízos à safra fumícola, tratou de operar as medidas possíveis e ao alcance: contatar um profissional da área agrícola a fim de quantificar o prejuízo e atestar os fatos no intuito de buscar o ressarcimento posterior (Evento 1, LAUDO4, e1). E muito embora a documentação elaborada unilateralmente, a qual teve grande relevância para a perícia judicial, seja passível de impugnação motivada pela ré/apelada, estanão logou êxito em descontituir os fatos elencados na proemial, ônus que lhe incumbia (art. 373, II, do CPC).

Consequentemente, prevalece para fins de julgamento o levantamento pericial determinado pela origem, indicativo de dados verossímeis acerca da ocorrência de danos materiais indenizáveis ao apelado, veja-se (Evento 56, LAUDO1):

II - Cálculo do valor do fumo danificado no sinistro

Para fins de cálculo da quantidade de fumo danificado partiu-se dos valores apontados no laudo do Técnico Agrícola Fernando Grossklaus (disponível nos autos), ou seja, 2.100 kg (dois mil e cem quilos) em duas ocasiões: em uma estufa na primeira (700 kg); e em duas estufas na segunda (800 kg + 600 kg). As estufas periciadas têm capacidade para a secagem destas quantidades de fumo. A estrutura de maquinário (microtrator com carreta), mão-de-obra e instalações comportariam a colheita e secagem desta quantidade de tabaco. Admite-se, assim...

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