Acórdão Nº 5002253-05.2021.8.24.0030 do Primeira Câmara Criminal, 24-05-2022

Número do processo5002253-05.2021.8.24.0030
Data24 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5002253-05.2021.8.24.0030/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

APELANTE: JONATHAS YAGO DEUS BARREIRA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

No Juízo da 2ª Vara da Comarca de Imbituba, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de David Ibairros Garcia, Ederson Luis de Avila Schinaider e Jonathas Yago Deus Barreira, pela prática, em tese, da infração penal contra a vida disposta no art. 121, II, III e IV, do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na peça acusatória (Evento 1 dos autos originários):

No dia 10 de maio de 2021, por volta das 15h, em via pública, na Rua Manoel Antônio de Souza, na Praia da Vila, nas proximidades do posto do Corpo de Bombeiros, neste Município, os denunciados Jonathas Yago Deus Barreira, Ederson Luis de Avila Schinaider e David Ibairros Garcia, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, munidos de vontade de ceifar a vida alheia, mataram a vítima Pedro Lucas Rosa Vargas.

No dia dos fatos, os denunciados e o ofendido, todos em situação de rua, encontravam-se na Praia da Vila, nas proximidades do posto do Corpo de Bombeiros, onde inclusive prepararam almoço.

Contudo, os denunciados, impelidos por motivo fútil, por acharem que a vítima pertencia a organização criminosa rival e por terem se desentendido por conta de bebida alcoólica, passaram a golpear Pedro Lucas Rosa Vargas com faca e garfo, causando-lhe treze ferimentos na região do tronco, além de ferimentos no punho direito e no antebraço esquerdo.

Nesse contexto, os denunciados cometeram o crime mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, pois, em união de esforços e com superioridade numérica, seguraram a vítima para que ela não pudesse escapar enquanto era golpeada.

Após a vítima já ter levado golpes de faca e garfo e estar caída ao chão, os denunciados tomaram banho de mar e, no retorno, arrastaram-na até uma vala em um matagal, onde os denunciados mataram a vítima com emprego de meio cruel. Isso porque o denunciado Jonathas Yago Deus Barreira, em conluio com Ederson Luis de Avila Schinaider e David Ibairros Garcia, que estavam no local e aderiram à conduta daquele, ocasionou ferimento de 14 cm na região frontal do pescoço da vítima, enquanto ela ainda estava viva, causando-lhe esgorjamento, que foi a causa efetiva de sua morte.

Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio sentença de pronúncia, submetendo os acusados a julgamento perante o Conselho de Sentença pelo suposto cometimento do delito descrito na peça vestibular, nos termos pretendidos pelo Órgão Ministerial (Evento 111 dos autos originários).

Realizado a sessão em plenário, o Conselho de Sentença reconheceu a materialidade e autoria delitivas, razão pela qual a magistrada presidente julgou procedente o pleito formulado na denúncia, com o seguinte dispositivo (Evento 349 dos autos originários):

a. CONDENAR o réu David Ibairros Garcia ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 21 anos e 4 meses de reclusão, no regime inicialmente fechado, pela prática do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos II, III e IV, do Código Penal;

b. CONDENAR o réu Ederson Luis de Avila Schinaider ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 21 anos e 4 meses de reclusão, no regime inicialmente fechado, pela prática do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos II, III e IV, do Código Penal;

c. CONDENAR o réu Jonathas Yago Deus Barreira ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 24 anos de reclusão, no regime inicialmente fechado, pela prática do crime previsto no art. 121, § 2º, incisos II, III e IV, do Código Penal;

Inconformado, o acusado Jonathas interpôs o presente recurso, sustentando, em suma, que a decisão é manifestamente contrária à prova dos autos, porquanto, a despeito do laudo pericial atestar a semi-imputabilidade, os jurados deixaram de aplicar a causa de diminuição da pena disposta no art. 26, parágrafo único, do Código Penal. Subsidiariamente, almeja a valoração do comportamento da vítima como circunstância judicial favorável. Ao arremate, busca o prequestionamento de dispositivo de lei federal e a fixação de honorários advocatícios (Evento 372 dos autos originários).

Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da sentença vergastada (Evento 385 dos autos originários).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Procurador Humberto Francisco Scharf Vieira, que se manifestou pelo conhecimento e parcial provimento do reclamo (Evento 10 destes autos).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2131526v10 e do código CRC adecbb4b.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIROData e Hora: 24/5/2022, às 15:3:44





Apelação Criminal Nº 5002253-05.2021.8.24.0030/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

APELANTE: JONATHAS YAGO DEUS BARREIRA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Jonathas Yago Deus Barreira em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Imbituba que, considerando o julgamento externado pelo Conselho de Sentença, julgou procedente a pretensão deduzida na denúncia e condenou-o à pena privativa de liberdade de 24 (vinte e quatro) anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do crime disciplinado no art. 121, § 2º, II, III e IV, do Código Penal.



1. Dos fatos

Consta da peça vestibular, em suma, que no dia 10-05-2021, por volta das 15h, os acusados, em comunhão de esforços e desígnios, ceifaram a vida do ofendido. Segundo o Parquet, os réus, movidos por motivo fútil, por presumirem que a vítima fazia parte de uma organização criminosa rival e por terem se desentendido em virtude de bebida alcoólica, efetuaram múltiplos golpes de faca e garfo no ofendido, provocando-lhe diversas lesões descritas no laudo pericial.

De acordo com a pretensão acusatória, depois do ofendido encontrar-se desfalecido ao solo, os acusados tomaram banho de mar e ao retornarem arrastaram-no até uma vala localizada em um matagal, ocasião em que, mediante meio cruel, causaram-lhe esgorjamento, resultando em ferimento de 14cm (quatorze centímetros) na região frontal do pescoço da vítima.

Por tais razões, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do apelante e dos corréus David Ibairros Garcia e Ederson Luis de Avila Schinaider, dando-os como incursos na sanção do art. 121, § 2º, II, III e IV, do Código Penal.

Devidamente instruído o feito, sobreveio sentença submeteu os acusados a julgamento popular em razão do suposto cometimento da infração penal contra a vida descrita na exordial acusatória.

Por força do julgamento externado pelo Tribunal do Júri, que reconheceu a materialidade e autoria delitivas, o recorrente foi condenado à pena privativa de liberdade de 24 (vinte e quatro) anos de reclusão.

Inconformado, o réu manejou a presente insurgência.



2. Admissibilidade

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame do mérito recursal.



3. Mérito

3.1 Da decisão manifestamente contrária à prova dos autos

A defesa sustenta que o veredicto do Tribunal do Júri é manifestamente contrário à prova dos autos, porquanto, a despeito do laudo pericial atestar a semi-imputabilidade, os jurados deixaram de aplicar a causa de diminuição da pena disposta no art. 26, parágrafo único, do Código Penal.

Argumenta, nessa toada, que o Ministério Público, na sustentação em plenário diante do Conselho de Sentença, pugnou a aplicação da minorante, e, ademais, a prova oral demonstra que o acusado estava incapacitado parcialmente de compreender o caráter ilícito dos seus comportamentos.

O pedido, adianto, merece provimento, embora em parte.

O princípio constitucional da soberania dos vereditos e, por consequência, a legislação processual penal, estabelecem a delimitação da atuação do Judiciário, sendo vedado ao juízo ad quem reformar o que foi decidido pelo Tribunal do Júri. Todavia, se a decisão for manifestamente contrária à prova dos autos, é possível que a Corte de Justiça revisora, somente nesse caso, anule o veredicto do Conselho de Sentença e submeta o acusado a novo julgamento.

De forma específica, relativamente à contrariedade do pronunciamento com o conjunto probatório do caderno processual, como é cediço, descabe valoração e sopesamento de provas, competindo ao Juízo ad quem apenas uma análise a fim de verificar se a deliberação do Conselho de Sentença encontra suporte nos autos, ainda que mínimo. Tal entendimento, naturalmente, visa preservar a decisão soberana proferida pelo Tribunal do Júri.

No que concerne à hipótese insculpida no art. 593, III, "d", do Código de Processo Penal, leciona a doutrina de Renato Brasileiro de Lima:

[...] para que seja cabível apelação com base nessa alínea e, de modo a se compatibilizar sua utilização com a soberania dos veredictos, é necessário que a decisão dos jurados seja absurda, escandalosa, arbitrária e totalmente divorciada do conjunto probatório constante dos autos. Portanto, decisão manifestamente contrária à prova dos autos é aquela que não encontra nenhum apoio no conjunto probatório, é aquela que não tem apoio em nenhuma prova, é aquela que foi proferida ao arrepio de tudo que consta dos autos, enfim, é aquela que não tem qualquer prova ou elemento informativo que a suporte ou justifique, e não aquela que apenas diverge do entendimento dos juízes togados a respeito da matéria. (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 9ª edição revista, ampliada e atualizada...

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