Acórdão Nº 5002318-79.2019.8.24.0091 do Quarta Câmara de Direito Público, 18-02-2021

Número do processo5002318-79.2019.8.24.0091
Data18 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão










Apelação / Remessa Necessária Nº 5002318-79.2019.8.24.0091/SC



RELATORA: Desembargadora BETTINA MARIA MARESCH DE MOURA


APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: YAN FELIPE DA TRINDADE VASCONCELOS (IMPETRANTE) ADVOGADO: JANQUIEL DOS SANTOS (OAB RS104298) APELADO: POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SANTA CATARINA (IMPETRADO) APELADO: Comandante Geral - POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis (IMPETRADO) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP)


RELATÓRIO


Yan Felipe da Trindade Vasconcelos impetrou Mandado de Segurança contra ato dito ilegal do Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina aduzindo, em síntese, que prestou concurso para admissão no Curso de Formação, deflagrado pelo Edital n. 042/CGCP/2019, com o objetivo de fazer parte do quadro de praças da Polícia Militar de Santa Catarina. Alegou, em síntese, que sua classificação na prova objetiva foi prejudicada, na medida em que as questões de ns. 28, 30, 34, 37, 39, 41, 44, 49 e 50 teriam apresentado conteúdo que extrapolam o instrumento convocatório ou eram dúbias em suas respostas, caracterizando ilegalidade. Sustentou que, na esfera administrativa, seu recurso restou indeferido, razão pela qual é necessária a interferência do Poder Judiciário para afastar as ilegalidades/nulidades. Asseverou que a Administração está vinculada ao que consta do edital, não podendo cobrar além do que fora neste previsto. Afirmou que o presente tema já foi analisado por este Sodalício em diversas oportunidades, restando pacificado o reconhecimento da ilegalidade, quando há cobrança de conteúdo não previsto no edital. Requereu a concessão de liminar, com a anulação das supraditas questões, bem como a intimação do Impetrado para que apresente justificativas no tocante à avaliação da prova de redação, com a posterior reabertura do prazo para interposição de recurso administrativo, confirmando-se as medidas ao final, com a consequente revisão da pontuação e reclassificação do Impetrante, assim como sua convocação para a realização das demais etapas do certame. Pugnou pela concessão da ordem em definitivo, além dos benefícios da gratuidade da justiça. Juntou documentos (Evento 1 - Eproc 1G).
Indeferida a benesse da gratuidade da justiça, o Impetrante comprovou o pagamento das custas iniciais (Eventos 3, 7, 9 e 15 - Eproc 1G).
Em decisão interlocutória, o pleito liminar foi indeferido (Evento 18 - Eproc 1G). A respeito, o Impetrante interpôs Agravo de Instrumento, o qual foi julgado prejudicado, em razão de pedido de desistência.
Na sequência, o Estado de Santa Catarina requereu seu ingresso no feito (Evento 23 - Eproc 1G).
Nas informações, o Comandante-Geral da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina defendeu a legalidade do ato, sustentando que as aludidas questões contemplaram conteúdo previsto no edital. Alegou que as disposições editalícias foram integralmente cumpridas. Pugnou pela denegação da segurança (Evento 25 - Eproc 1G).
O Ministério Público, em parecer de lavra da Exma. Sra. Dra. Thais Cristina Scheffer, manifestou-se pela denegação da ordem (Evento 37 - Eproc 1G).
Posteriormente, o Impetrante reiterou a análise do pedido liminar (Evento 41 - Eproc 1G).
Sobreveio sentença, nos seguintes termos:
"[...] Diante do exposto, concedo em parte a segurança pleiteada pelo impetrante para determinar: a) a anulação das questões de n. 28, 30, 34 e 37; b) a reclassificação do impetrante no certame, observando-se os demais critérios editalícios, e, obtendo a aprovação em todas as etapas e estando dentro do número de vagas contidos no Edital n. 042/CGCP/2019, seja efetuada a sua convocação para o próximo Curso de Formação de Soldados.
Sem honorários, pois incabíveis na espécie (art. 25 da Lei n. 12.016/2009).
Custas processuais pro rata. A Fazenda Pública é isenta do pagamento de custas, por força de lei.
Sentença sujeita ao reexame necessário (art. 14, §1, da Lei n. 12.016/2009). [...]" (Evento 46 - Eproc 1G)
Irresignado, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, que não cabe ao Poder Judiciário interferir nos critérios de avaliação adotados pela banca examinadora, devendo limitar-se ao controle de legalidade do certame. Assevera, ainda, a validade das questões aplicadas na prova objetiva do concurso. Postula a concessão de efeito suspensivo ao apelo e, ao final, a reforma da sentença para rejeição dos pedidos formulados na exordial (Evento 55 - Eproc 1G).
Com contrarrazões (Evento 60 - Eproc 1G), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
Em decisão prolatada pelo Exmo. Sr. Desembargador Rodolfo Tridapalli (Evento 2) foi deferido o efeito suspensivo à sentença.
Em nova petição (Evento 15), requereu o Impetrante/Apelado o "adiantamento do julgamento do recurso de apelação interposto".
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. João Fernando Quagliarelli Borrelli, manifestando-se pela desnecessidade de intervenção no feito (Evento 16).
É o relatório

VOTO


1. Da admissibilidade
A sentença concessiva da segurança foi publicada na vigência do CPC/15, estando sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, por força do disposto no art. 496, inciso I, da Lei Processual Civil e no art. 14, § 1º, da Lei n. 12.016/2009, respectivamente:
Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público; [...]
Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação. § 1º Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau dejurisdição.
Presentes, pois, os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço da apelação e da remessa necessária, cuja análise se dará em conjunto.
2. Do mérito
Tratam-se de remessa oficial e de recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa Catarina contra sentença prolatada em Mandado de Segurança, que concedeu em parte a ordem pleiteada, para anular as questões de ns. 28, 30, 34 e 37 do concurso público deflagrado por meio do Edital n. 042/CGCP/2019 e, por conseguinte, determinou que a autoridade coatora atribuísse ao candidato/Impetrante, a correspondente pontuação, reclassificando-o no certame, observando-se os demais critérios constantes no edital.
A sentença, adianta-se, deve ser reformada e, por corolário, a segurança denegada.
Ab initio, é necessário ressaltar que o Supremo Tribunal Federal assentou, em sede de repercussão geral - Tema 485 - , que: "Não compete ao Poder Judiciário, no controlede legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos enotas a elas atribuídas", bem como que, "Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame." (g.n.)
Portanto, somente em situações excepcionais, de flagrante ilegalidade, isto é, "de evidente descompasso entre a questão impugnada e o conteúdo programático descrito no edital que rege o concurso público" (AI n. 5006237-24.2020.8.24.0000, Rela. Desa.Vera Lucia Ferreira Copetti, grifado no original), está o Poder Judiciário autorizado a proclamar a nulidade de uma questão de concurso, sob pena, inclusive, de afronta à independência dos poderes, preconizada na Constituição Federal de 1988:
"Art.2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário."
No caso sub examine, o Impetrante sustenta a nulidade das questões de ns. 28, 30, 34 e 37, sob o argumento de que seu conteúdo não estaria previsto no edital do concurso.
Contudo, razão não lhe assiste.
A propósito, as questões objeto da controvérsia foram analisadas diversas vezes por este Tribunal de Justiça, pelo que grassa nesta Corte o entendimento de que as aludidas questões possuem teor compatível com o conteúdo programático, sendo, portanto, válidas, com o que esta Relatora concorda plenamente.
Nesse sentido, há vários precedentes:
"APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CURSO. FORMAÇÃO DE SOLDADO DA PM. EDITAL 042/CGCP/2019. - ORDEM CONCEDIDA NA ORIGEM. (...) EDITAL. PROVA OBJETIVA. QUESTÃO N. 32. CONTEÚDO PREVISTO. ILEGALIDADE INEXISTENTE. AUTOCONTENÇÃO. PRECEDENTES. (...) No paradigma de repercussão geral, o STF excetuou a possibilidade de o Poder Judiciário proceder i) ao juízo de compatibilidade do conteúdo de questões de concurso com o conteúdo programático previsto no edital do certame e ii) ao juízo de teratologia, ou seja, erro grosseiro, no gabarito apresentado em face do conteúdo exigido na prova' (STF, Rcl 26.928/SE AgR, rel. Min. Dias Toffoli, j. em 17-8-2018) (...) SENTENÇA REFORMADA. RECURSO E REEXAME PROVIDOS" (TJSC, Apelação Cível/Remessa necessária n. 5013044-25.2019.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Rel. Des. Henry Goy Petry Júnior, Segunda Câmara de Direito Público, Data do julgamento: 29.07.2020) (g.n.)
"APELAÇÕES - CONCURSO PÚBLICO - POLÍCIA MILITAR - EDITAL 042/CGCP/2019 - PROVA OBJETIVA - QUESTÕES 28, 30, 31, 32, 37 E 40 - AUSÊNCIA DE ERRO FLAGRANTE - LIMITES À ATUAÇÃO JUDICIAL - AUTOCONTENÇÃO - SENTENÇA REFORMADA - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. (...) Se é necessário impedir que assumamos a recorreção das provas (uma espécie de extensão da banca examinadora), fixando gabarito, identicamente se deve debitar à Administração a atribuição de conferir se as respostas estão rentes ao padrão previamente exposto. 'Não compete ao Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a eles atribuídas', disse o STF, não se podendo criar compreensão que se afaste da essência do julgado. Além disso, ao interferir em resultados de concurso fora...

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