Acórdão Nº 5002327-12.2021.8.24.0175 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 26-07-2022

Número do processo5002327-12.2021.8.24.0175
Data26 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002327-12.2021.8.24.0175/SC

RELATOR: Desembargador TULIO PINHEIRO

APELANTE: ADIRSO JOSE AMANDO (AUTOR) E OUTRO APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

No Juízo da Unidade Regional de Direito Bancário da Comarca de Florianópolis, ADIRSO JOSE AMANDO ajuizou ação revisional em desfavor de AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, objetivando a revisão dos Contratos de Crédito Pessoal ns. 1211710153 e 1211710145 (inicial no evento 1 e emenda no evento 18).

Os pactos em debate foram acostados aos autos (evento 18, contrato 2 e 3).

Recebida a inicial, Sua Excelência deferiu o benefício da justiça gratuita (evento 20).

Sobreveio contestação (evento 22).

Houve réplica (evento 32).

Após, no Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário, o MM. Juiz Tanit Adrian Perozzo Daltoe sentenciou o feito, de modo a julgar parcialmente procedente a demanda (evento 34), o que fez nos seguintes termos:

(...) ANTE O EXPOSTO, julgo procedentes os pedidos para nos contratos nº 1211710153 e 1211710145: a) limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado vigente à época da negociação, conforme fundamentação; e b) determinar a repetição simples de eventual indébito, corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do pagamento, acrescida a diferença verificada em favor do autor de juros de 1% ao mês a contar da citação. Os valores apurados deverão ser compensados/descontados do saldo devedor em aberto e, caso quitado o contrato, restituídos em parcela única.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas e dos honorários, estes arbitrados em R$ 1.500,00 (art. 85, § 8º, do CPC). (destaques do original).

Os embargos de declaração opostos pela parte autora (evento 39) foram acolhidos para complementar a sentença, de modo a arrematar que "não existindo prova da quitação da parte legítima do débito, permanece em mora o devedor com os consectários dela decorrentes" (evento 41).

Irresignada, a financeira ré apelou. Nas razões do seu recurso, pleiteou a manutenção dos juros remuneratórios conforme pactuados. Aduziu ser inviável a restituição de valores porque não se apossou de nenhum importe que conste na conta corrente da parte autora de forma indevida. Requereu a observância a possíveis irregularidades diante de ações judiciais ajuizadas em massa em face de instituições bancárias. Por fim, requereu a redução do montante arbitrado a título de honorários advocatícios (evento 49).

Também inconformada, a parte autora apelou. Em suas razões de apelo, pleiteou a restituição em dobro dos valores exigidos de forma indevida e requereu a descaracterização da mora, ante o excesso praticado pela casa bancária (evento 51).

Com as contrarrazões de ambos os apelados (eventos 58 e 59), subiram os autos a esta Corte.

VOTO

O recursos, adianta-se, serão examinados por tópicos.

Dos juros remuneratórios.

Assevera a casa bancária apelante que não há limitação legal à convenção dos juros remuneratórios, de sorte que devem ser mantidos tais como ajustados.

Com efeito, a jurisprudência vem admitindo variação acima da taxa média de mercado, desde que não iníqua ou abusiva, objetivando conservar a natureza do encargo. Nesta senda, merece transcrição trecho do voto da Eminente Relatora Ministra Nancy Andrighi, vazado na 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no REsp n. 1.061.530/RS, para os fins do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973:

(...) conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.

Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.

Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic - taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo.

Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros. Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro. Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).

As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).

A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.

Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa...

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