Acórdão Nº 5002407-04.2022.8.24.0025 do Primeira Câmara Criminal, 15-12-2022

Número do processo5002407-04.2022.8.24.0025
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 5002407-04.2022.8.24.0025/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

RECORRENTE: NIERBSON GOMES AZEVEDO (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

No Juízo da Vara Criminal da Comarca de Gaspar, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Nierbson Gomes Azevedo, pela prática, em tese, da infração penal contra a vida prevista no art. 121, § 2º, I, III e IV, do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na inicial acusatória (Evento 1 autos originários):

No dia 10 de abril de 2022, por volta das 20h25min, na Rua Gerlindo Furlani, Centro, no município de Ilhota/SC, o denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO, com evidente vontade de matar, desferiu 40 golpes de faca contra a vítima Emerson Alexandre Vieira, atingindo-lhe nas regiões da cabeça, do tórax, mamária, esternal, escapular, lombar, do hipocôndrio esquerdo e nos membros superiores, causando-lhe traumatismo torácico, o que foi causa eficiente de sua morte, conforme Laudo Pericial Cadavérico n. 2022.04.02189.22.001-22 (anexo).

Segundo consta no incluso Inquérito Policial, o denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO e a vítima Emerson Alexandre Vieira se conheciam há aproximadamente 2 (dois) anos, pois haviam trabalhado juntos em um restaurante no município de Ilhota/SC, de modo que, durante o período de amizade, desentenderam-se diversas vezes, especialmente após a vítima descobrir que o denunciado estava interessado em sua companheira, Cintia Cátia Avila da Silva.

Assim, na data acima mencionada, por volta das 19h, a vítima, na companhia de sua companheira, Cintia Cátia Avila da Silva, bem como de seus dois filhos, deslocou-se para fazer um lanche no estabelecimento denominado Lipi Lanches, situado na estacionamento do pátio da Igreja, no centro da cidade de Ilhota/SC.

Na oportunidade, a vítima encontrou o denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO, ocasião em que iniciaram provocações e ofensas mútuas, momento em que o denunciado, em tom ameaçador, proferiu que voltaria ao local para se "acertar" com a vítima.

Posteriormente, quando a vítima já se encontrava em sua residência, situada na Rua Gerlindo Furlani n. 314, Casa 2, Bairro Vila Nova, no município de Ilhota/SC, o denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO, na posse de uma faca, passou a rondar o imóvel, o que foi percebido pela vítima, que imediatamente foi ao encontro do denunciado, instante em que este passou a golpeá-la.

Ato contínuo, o denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO fugiu do local a bordo de uma bicicleta.

O crime foi cometido por NIERBSON GOMES AZEVEDO por motivo torpe, uma vez que, momentos antes do crime, houve um desentendimento entre ele e a vítima na presença do sobrinho adolescente do denunciado, com ofensas à honra e provocações mútuas em razão de questões envolvendo a situação financeira deles e o interesse amoroso do denunciado em Cintia Cátia Avila da Silva, companheira da vítima, pois NIERBSON GOMES DE AZEVEDO não acreditava que a situação poderia ser resolvida legalmente, com a ação legítima das autoridades policiais.

Além disso, o denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO cometeu o crime mediante recurso que dificultou a defesa da vítima Emerson Alexandre Vieira, uma vez que agiu de forma repentina, sem que a vítima imaginasse que ele estivesse portando uma faca e o mataria.

O denunciado NIERBSON GOMES AZEVEDO ainda cometeu o crime com o emprego de meio cruel, haja vista que desferiu 40 golpes de faca na vítima, em diversas regiões do corpo, causando sofrimento físico excessivo e desnecessário.

Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio decisão de pronúncia, que acatou a pretensão acusatória para submeter o réu a julgamento Popular pelo suposto cometimento do delito de homicídio triplamente qualificado descrito na peça vestibular. A deliberação contou com o seguinte dispositivo (Evento 93 dos autos originários):

Pelo exposto, ante a prova da materialidade e os indícios suficientes de autoria, admito a acusação contida na denúncia e PRONUNCIO o acusado NIERBSON GOMES AZEVEDO para que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, pela suposta prática do crime previsto no art. 121, § 2º, I (motivo torpe), III (meio cruel) e IV (recurso que dificultou a defesa da vítima) do Código Penal.

Inconformado com o decisum, o réu interpôs o presente recurso, almejando, em suma, o afastamento das qualificadoras do motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima, porque não correspondem aos fatos praticados pelo acusado (Evento 109 dos autos originários). Pretende, ainda, a fixação de honorários à defensora dativa pela atuação nesta instância recursal.

Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 114 dos autos originários).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Dra. Procuradora Rosemary Machado Silva, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 14).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto por Nierbson Gomes Azevedo contra decisão do Juízo da Vara Criminal da Comarca de Gaspar que, ao julgar admissível o pedido formulado na denúncia, prolatou sentença de pronúncia, submetendo-o a julgamento perante o Tribunal do Júri em razão do suposto cometimento do delito contra a vida disciplinado no art. 121, § 2º, I, III e IV, do Código Penal.



1. Admissibilidade

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame do pleito recursal.



2. Mérito

A defesa postula, em síntese, o afastamento das qualificadoras do motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima (art. 121, § 2º, I, III e IV, CP), porque não correspondem aos fatos praticados pelo acusado, inexistindo substrato probatório apto a mantê-las.

No que se refere à motivação do crime, a defesa argumenta que a vítima e o réu possuíam desentendimentos pretéritos, sendo inviável relacionar o homicídio com sentimento de vingança, pois o acusado buscou resolver as diferenças, enquanto a vítima atuou em sentido oposto, tanto que no dia dos fatos, pouco antes da prática delitiva, ela teria proferido ofensas contra o réu.

Em relação ao meio cruel, aduz que a reiteração de golpes, por si só, não tem o condão de manter a qualificadora do meio cruel, porquanto não comprovado que a conduta criminosa impingiu excessivo sofrimento ao ofendido.

Por fim, concernente ao recurso que dificultou a defesa da vítima, sustenta que o fato de a vítima desconhecer que o réu possuía uma faca não é elemento suficiente para caracterizar a qualificadora, especialmente porque, no caso, a vítima optou, voluntariamente, por enfrentar o acusado.

Os pedidos, adianta-se, não merecem acolhimento.

De pronto, convém registrar que a insurgência manifestada no recurso interposto limita-se a impugnar as qualificadoras atribuídas na denúncia, não havendo discussão acerca da materialidade e indícios suficientes da autoria delitiva, as quais, diga-se, encontram-se devidamente comprovadas pelos elementos de convicção constantes nos autos, bem como inexistem vícios que devessem ser sanados de ofício, de modo que passo a analisar as teses aventadas.

Salienta-se que tal proceder encontra amparo no princípio do tantum devolutum quantum appellatum, que norteia o âmbito de cognição dos recursos no processo penal, não podendo o julgador agir de ofício para exercer atividade sem ter sido provocado, sob pena de proferir decisório ultra ou extra petita, ressalvadas as hipóteses de equívoco material ou flagrante ilegalidade, as quais não se verificam nos autos.

Relativamente à pronúncia, assim dispõe o caput e o...

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