Acórdão Nº 5002409-34.2021.8.24.0081 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 18-08-2022

Número do processo5002409-34.2021.8.24.0081
Data18 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002409-34.2021.8.24.0081/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: ELIA MIOTTO SANSSANOVICZ (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 35), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Trata-se de ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c repetição de indébito e indenização por dano moral ajuizada por ELIA MIOTTO SANSSANOVICZ em face de BANCO BMG S.A, ambos qualificados nos autos.

A parte autora alegou, em resumo, que: a) firmou contrato de empréstimo com a parte ré, na modalidade consignação em folha; b) não tinha conhecimento de que, juntamente com o empréstimo, iria adquirir também um cartão de crédito com reserva de margem (RMC); c) a contratação realizada não foi a solicitada; d) os descontos mensais não abatem o saldo devedor, razão pela qual a dívida é "impagável"; e) tal prática seria ilegal e abusiva; f) o cartão nunca foi utilizado; g) os fatos geraram dano moral. Discorreu o direito e pediu a inversão do ônus da prova. Postulou a concessão de tutela de urgência antecipada para que a ré se abstenha de reservar margem consignável e empréstimo sobre a RMC. Requereu a declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito com reserva de margem consignável e a restituição dos valores descontados a título de RMC. Subsidiariamente, sendo comprovada a contratação do cartão de crédito, pediu a conversão do empréstimo em empréstimo consignado comum, sendo os valores já pagos utilizados para amortizar o saldo devedor. Por fim, requereu a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 20.000,00.

Recebida a inicial, foi deferido o benefício da justiça gratuita, indeferido o pedido de tutela de urgência e determinada a citação da instituição financeira (evento 10).

Citada, a parte ré apresentou contestação (evento 12), argumentando, inicialmente, (a) a necessidade de indeferimento da inicial em razão da ausência de interesse processual por inexistência de margem para contratação de empréstimo, (b) a inépcia da petição inicial por narrativa deficiente e (c) o ajuizamento reiterado de ações por advogados captadores. No mérito, asseverou que a parte autora efetivamente contratou um cartão de crédito com reserva de margem consignável e que não houve vício de consentimento do momento da contratação. Discorreu acerca da legalidade do saque, das diferenças entre cartão de crédito consignado e empréstimo consignado, da possibilidade de quitação integral da fatura, da não violação do dever de informação, da necessidade de manutenção dos descontos, da inexistência de dano moral, da impossibilidade de restituição em dobro, da impossibilidade de conversão do contrato em empréstimo consignado e do não cabimento da inversão do ônus da prova. Ao final, requereu a improcedência dos pedidos formulados na inicial e, subsidiariamente, pediu que a restituição de valores seja feita de forma simples, que seja permitida a compensação com a quantia recebida pela parte autora e que a indenização por danos morais não exceda R$ 1.000,00.

A parte autora apresentou réplica (evento 24).

Intimadas as partes para especificação de provas (evento 25), a autora postulou o julgamento antecipado (evento 33), enquanto o réu quedou-se inerte.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. MARCIANA FABRIS, da 1ª Vara da Comarca de Xaxim, julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 35):

ANTE TODO O EXPOSTO, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial.

Condeno a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, estes que fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado (CPC, art. 81 e art. 85, § 2.º). As obrigações ficam sob condição suspensiva de exigibilidade, pois beneficiária da justiça gratuita (artigo 98, § 3.º, do Código de Processo Civil).

P.R.I.

Da Apelação

Inconformada com a prestação jurisdicional, a Autora, ora Apelante, interpôs recurso de Apelação (Evento 41), no qual reedita os argumentos lançados à petição inicial, ressaltando que, após a celebração do contrato de empréstimo consignado, foi surpreendido com o desconto de reserva de margem consignável (RMC) de cartão de crédito.

Pugna a reforma da decisão recorrida, uma vez que a conduta perpetrada pelo Apelado é contrária às regras de proteção ao consumidor, por violar o direito à informação.

Argumenta que há prática abusiva do Apelado, a qual está comprovada pela ocorrência de onerosidade excessiva, pois as parcelas descontadas mensalmente do seu benefício previdenciário somente pagam os encargos do cartão de crédito, o que ofende a boa-fé contratual.

Por conta disso, pretende o reconhecimento da ilegalidade da contratação, com a consequente nulidade do pacto firmado entre as partes, com a condenação do Apelado a restituição dos valores indevidamente descontados mensalmente, na forma dobrada.

No que se refere ao dano moral, sustenta que o ato ilícito está configurado, diante da ilicitude praticada pelo Apelado, sendo o abalo moral, portanto, presumido.

Por fim, requer o provimento do recurso para julgar procedentes os pedidos deduzidos na exordial.

Das contrarrazões

Devidamente intimado, o Apelado apresentou contrarrazões (Evento 43). Aventa a necessidade de intimação da parte Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, requer a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Ascenderam os autos ao Tribunal de Justiça.

Após a distribuição, vieram-me conclusos para julgamento.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

II - Das contrarrazões

O BANCO BMG S.A requer a intimação da parte Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, pleiteou a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Sem razão.

No que se refere ao pleito de intimação da parte Autora para que esta informe o seu conhecimento acerca da propositura da lide, infere-se que tal medida não se revela plausível, notadamente pelo conteúdo genérico da narrativa, que não encontra abrigo em qualquer início de prova.

Conforme já decidiu este Tribunal, eventual desvirtuamento do interesse da parte Autora na propositura da demanda não pode ser reconhecido a partir de meras conjecturas, não cabendo ao juízo, sobretudo em segundo grau de jurisdição, investigar o ânimo da parte (Nesse sentido: Apelação n. 5030238-56.2020.8.24.0038, rel. Mariano do Nascimento, j. 04-02-2021 e Apelação n. 5007736-58.2020.8.24.0092, rel. Guilherme Nunes Born, j. 08-07-2021).

Salienta-se que o instrumento de procuração subscrito pela parte, cuja autenticidade não foi derruída, tem o condão de evidenciar a prévia ciência sobre o pleito vertido em juízo, bem como seu interesse na tutela jurisdicional vindicada.

Igualmente, não merece amparo o pleito de condenação do procurador da parte demandante nas penas de litigância de má-fé, especialmente em virtude de que a aplicação das indigitadas penalidades é dirigida às partes da relação processual instaurada, e não aos seus causídicos.

A propósito, entende-se que "o fato do procurador da parte autora ter ajuizado, supostamente, centenas de ações versando sobre os mesmos pedidos e causas de pedir, não o transforma, por si só, em causídico agressor. Isso porque se trata de seu ofício e, pelo visto, da matéria que, por ora, mais lhe condiz" (TJSC, Apelação n. 0301613-52.2019.8.24.0040, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 30-07-2020).

Em arremate, caso a instituição financeira entenda haver indícios de infrações disciplinares e condutas típicas, poderá buscar diretamente as Autoridades administrativas ou o respectivo órgão de classe competente, se assim julgar necessário (Apelação n. 5001121-83.2021.8.24.0038, rel. Tulio Pinheiro, j. 01-07-2021).

III - Do julgamento do recurso

Trata-se de Apelação Cível interposta por ELIA MIOTTO SANSSANOVICZ contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Dano Moral, com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada" ajuizada em desfavor do BANCO BMG S.A, ora Apelado.

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