Acórdão Nº 5002418-31.2019.8.24.0092 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 15-10-2020

Número do processo5002418-31.2019.8.24.0092
Data15 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5002418-31.2019.8.24.0092/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU) ADVOGADO: SIGISFREDO HOEPERS (OAB SC007478) APELADO: ANTONIO CARLOS TERRA DO AMARAL (AUTOR) ADVOGADO: ALVINO GABRIEL DE NOVAES MENDES (OAB SC051633) ADVOGADO: ROBERTO CASECA DOS SANTOS (OAB SC043555) ADVOGADO: GREGORY PEDRO VIEIRA STANISZEWSKI (OAB SC043557)


RELATÓRIO


BANCO PAN S.A. interpôs recurso de apelação (evento 22) em face da sentença (evento 16), que, proferida pelo juízo da 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor na ação declaratória de nulidade de contrato com pedido de restituição de valores e de indenização por dano moral, para converter a operação de saque em cartão de crédito em operação de empréstimo pessoal consignado, condenando a instituição financeira demandada, ainda, à restituição/compensação de eventuais valores cobrados a maior em decorrência da contratação de operação não consentida pelo consumidor, bem como ao pagamento de danos morais à parte contrária.
Cuida-se, na origem, de ação declaratória de nulidade de contrato com pedido de restituição de valores e de indenização por dano moral aforada em 13-09-2019 aforada por ANTONIO CARLOS TERRA DO AMARAL contra BANCO PAN S.A., na qual sustenta, inicial, (1) a invalidade do contrato firmado entre as partes. Neste sentido, informa que foi ludibriado pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, operação com natureza e sujeita a encargos diversos, e superiores, aos do empréstimo pretendido. Destaca que o desconto do valor emprestado em sua folha de pagamento, limitado a 5% de seu rendimento líquido, acaba por tornar o valor recebido impagável, na medida em que apenas da conta dos encargos incidentes, não representando efetiva amortização, fazendo com que o consumidor, a despeito dos pagamentos efetuados, permaneça eternamente devedor do saldo contratado. Alega que, diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada, tendo em vista que apenas pretendia a contratação de empréstimo e não fornecimento de cartão. Pugna, assim, pelo cancelamento da operação com a suspensão dos descontos em sua folha de pagamento e a devolução da quantia que entende indevidamente cobrada. Defende, por fim, (2) a condenação da parte demandada ao pagamento de danos morais decorrentes do abalo sofrido em relação à suposta atitude fraudulenta e aos descontos irregulares perpetrados pela casa bancária.
No evento 3, foi concedida a gratuidade da justiça requerida pelo demandante.
Devidamente citado, o BANCO PAN S.A. apresentou contestação (evento 9), na qual defendeu, em suma, que houve a expressa contratação pelo autor, do contrato para utilização de cartão de crédito mediante consignação em pagamento, razão pela qual não são indevidos os descontos a título de reserva de margem consignável lançados em seu benefício previdenciário. Logo, por não serem indevidos os descontos, argumenta que não deve restituir valores ao autor, e tampouco indenizar-lhe pelo ocorrido. Pugnou pela improcedência da demanda.
Manifestação à contestação no evento 14, na qual o autor, rebatendo os argumentos da parte adversa, reitera os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.
Sobreveio sentença de mérito prolatada em 29-11-2019 pelo magistrado Silvio José Franco, da 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor, o que se deu nos seguintes termos (evento 16):
Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na inicial desta ação declaratória de nulidade contratual e inexistência de relação jurídica c/c repetição de indébito e danos morais movida por ANTONIO CARLOS TERRA DO AMARAL em face de BANCO PAN S.A. para:
a) adequar o contrato n. 708623604 à modalidade de empréstimo consignado, cujos juros remuneratórios devem observar a taxa média divulgada pelo BACEN, referente aos empréstimos concedidos aos aposentados/pensionistas à época da contratação, nos termos da fundamentação.
b) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais à parte autora, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que deverá ser corrigido pelo INPC, desde a presente data (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, contados da data da citação (artigo 405 do Código Civil).
c) determinar a repetição simples de eventual indébito ou compensação pela instituição financeira, desde que verificado pagamento a maior, a ser apurado por simples cálculo aritmético, corrigidos pelo índice da Corregedoria Geral de Justiça e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data da citação (artigo 405 do Código Civil).
Ante o princípio da sucumbência, considerando que a parte autora decaiu de parte mínima dos pedidos, com espeque no art. 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo, moderadamente, em R$ 2.000,00 (dois mil reais), nos termos do art. 85, §§ 2º e 8º do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitada em julgado, certifique-se e, após, arquivem-se os autos dando-se baixa na estatística.
Inconformada, a instituição financeira demandada interpôs recurso de apelação (evento 22), por sua vez, alega, em síntese, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito a única operação viável para a concessão do valor perseguido. Pugna pelo provimento do recurso com a reforma da decisão objurgada, sendo julgada totalmente improcedente a demanda de origem, com a inversão a responsabilidade pelo pagamento dos ônus sucumbenciais.
Contrarrazões no evento 26.
Os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça, vindo-me às mãos por sorteio.
Este é o relatório

VOTO


1. Exame de admissibilidade
Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).
Dito isto, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
2. Da regularidade da operação contratada entre as partes
Sustenta a instituição financeira recorrente, inicialmente em seu recurso, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de maneira clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito a única operação viável para a concessão do valor perseguido.
Analisados os autos, verifica-se que razão possui mesmo o banco recorrente.
A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).
As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):
Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)
§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.
[...]
Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de...

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