Acórdão Nº 5002429-74.2021.8.24.0000 do Órgão Especial, 20-07-2022

Número do processo5002429-74.2021.8.24.0000
Data20 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoAcórdão
Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5002429-74.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO IZIDORO HEIL

AUTOR: Procurador Geral - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: Prefeito - MUNICÍPIO DE NOVA VENEZA - Nova Veneza RÉU: CÂMARA DE VEREADORES - MUNICÍPIO DE NOVA VENEZA - NOVA VENEZA

RELATÓRIO

A PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA, representada pelo COORDENADOR DO CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE - CECCON, e o PROMOTOR DE JUSTIÇA DA 11ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE CRICIÚMA, intentaram ação direta de inconstitucionalidade em face do Anexo VI da Lei n. 1.830, de 26 de junho de 2007, alterada pelas Leis n. 1.986/2009, n. 2.501/2015, n. 2.546/2017, n. 2.575/2017, n. 2.606/2018, n. 2.729/2019, n. 2.762/2019 e n. 2.859/2020, todas do Município de Nova Veneza.

Aduziram, em síntese, que: a norma questionada instituiu diversos cargos de provimento em comissão na estrutura administrativa municipal; "a criação de cargos de provimento em comissão ocupa posição de exceção à regra do concurso público como principal forma de acesso ao serviço público, destinando-se apenas a atribuições de chefia, direção e assessoramento, e desde que haja uma relação de inequívoca confiança entre nomeante e nomeado"; "A ausência de descrições das atribuições dos cargos públicos obsta o juízo de legalidade dos atos praticados pela administração através do cargo, pois não há lei anterior que lhes atribuam obrigações e prerrogativas, impedindo a população e os órgãos fiscalizadores de avaliar se o ocupante do cargo cumpre as suas funções, de aferir a sua eficiência ou mesmo de verificar eventual desvio de função do servidor"; "a falta de designação de atribuições impede ainda que se verifique a constitucionalidade da dispensa do concurso público, ou seja, da exceção ao princípio da impessoalidade da administração pública, o qual é autorizado tão somente para os cargos de direção, chefia e assessoramento e com necessário vínculo de confiança e fidelidade ideológica com a autoridade nomeante"; na existência de normas anteriores à legislação questionada que "porventura disponham as mesmas previsões aqui expostas em relação aos cargos ora impugnados, é imperioso que sejam afastados os efeitos repristinatórios, de modo a evitar o ressurgimento e normas que incorram nos mesmos vícios que deram ensejo à presente ação direta".

Pugnaram pela total procedência da ação, sustentando, a tal desiderato, violação aos arts. 16 e 21, incisos I e IV, da Constituição do Estado de Santa Catarina, que guardam consonância com os artigos 37, caput, e incisos II e V da Constituição da República.

Notificado, o Prefeito de Nova Veneza prestou informações, as quais foram ratificadas pela Procuradoria-Geral daquele Município (eventos 18 e 22).

O Presidente da Câmara de Vereadores não se manifestou (eventos 17 e 19).

Ato contínuo, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão, manifestou-se pela procedência dos pedidos (evento 25).

VOTO

O Procurador-Geral de Justiça, juntamente com o Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Controle de Constitucionalidade, detém legitimidade para a propositura da presente ação direta de inconstitucionalidade, pois amparado no art. 2º, III, da Lei Estadual n. 12.069/01.

Nesta condição, atribui inconstitucionalidade material do Anexo VI da Lei n. 1.830, de 26 de junho de 2007, alterada pelas Leis n. 1.986/2009, n. 2.501/2015, n. 2.546/2017, n. 2.575/2017, n. 2.606/2018, n. 2.729/2019, n. 2.762/2019 e n. 2.859/2020, todas do Município de Nova Veneza, na parte em que cria os seguintes cargos: Intendente Distrital (2); Assessor Administrativo (1); Assessor de Imprensa (1); Supervisor Técnico (5); Assistente de Apoio Técnico II (15); Assistente de Apoio Técnico I (14); Assessor Jurídico de Gabinete (1); Supervisor Administrativo (1); Diretor do Departamento de Controle Interno (1); Diretor do Departamento de Administração (1); Diretor do Departamento de Tesouraria e Contabilidade (1); Diretor do Departamento de Pessoal (1); Diretor do Departamento de Tributação e Fiscalização (1); Supervisor Administrativo (1); Diretor do Departamento de Planejamento (1); Diretor do Departamento de Desenvolvimento Urbano (1); Supervisor Administrativo (1); Gerente de Atenção Básica (1); Gerente de Saúde Bucal (1); Diretor do Departamento de Saúde (1); Diretor do Departamento de Educação Infantil (1); Diretor de Departamento de Educação Fundamental (1); Diretor de Assistência ao Educando (1); Supervisor Administrativo (1); Diretor de Departamento de Cultura (1); Diretor do Departamento de Esportes (1); Chefe de Divisão Eventos Esportivos (1); Chefe de Divisão de Treinamento Esportivo (1); Chefe do Departamento de Turismo (1); Coordenador Especial (1); Coordenador Setorial I (3); Coordenador Setorial II (2); Supervisor Administrativo (1); Diretor do Departamento de Obras e Serviços Urbanos (1); Chefe de Divisão de Oficina e Garagem (1); Chefe de Divisão de Artefatos de Cimento (1); Diretor do Departamento de Estradas de Rodagem (1); Diretor do Departamento de Mecanização Agrícola (1). .

A Constituição Estadual de Santa Catarina, repetindo ideia contida na Constituição Federal, impôs à Administração Pública, em nível estadual e municipal, a obrigatoriedade de contratação de servidores mediante concurso público.

A regra, portanto, é a indispensabilidade de concurso público.

A exceção diz respeito ao provimento de cargos em comissão, de livre nomeação e exoneração. Tal forma de preenchimento do cargo excepcional está prevista nas Cartas da República (art. 37, II e V) e do Estado de Santa Catarina (art. 21, I e IV), in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; [...]

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento [...]



Art. 21. Os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei, observado o seguinte:

I - a investidura em cargo ou a admissão em emprego da administração pública depende da aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração; [...]

IV - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargos efetivos, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento; e (NR).

Considerando a norma constitucional tem-se que "[...] a criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais [...]" (ADI 5542, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 20/11/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-019 DIVULG 31-01-2020 PUBLIC 03-02-2020).

A nomeação ao cargo em comissão demanda, ainda, indispensável vínculo de confiança entre o ocupante do cargo e seu superior hierárquico. Com efeito, "A criação de cargos em comissão referentes a funções para cujo desempenho não é necessária a confiança pessoal viola o disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal. (STF, AI n. 309.399/SP-AgR, Primeira Turma, rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, j. 20.3.12).

O assunto é tão recorrente que a controvérsia relativa aos requisitos constitucionais para a criação de cargos em comissão foi apreciada pelo Supremo Tribunal Federal em regime de repercussão geral - RE 1041210/SP - (TEMA 1010). Segue a ementa do paradigma:

Criação de cargos em comissão. Requisitos estabelecidos pela Constituição Federal. Estrita observância para que se legitime o regime excepcional de livre nomeação e exoneração. Repercussão geral reconhecida. Reafirmação da jurisprudência da Corte sobre o tema. 1. A criação de cargos em comissão é exceção à regra de ingresso no serviço público mediante concurso público de provas ou provas e títulos e somente se justifica quando presentes os pressupostos constitucionais para sua instituição. 2. Consoante a jurisprudência da Corte, a criação de cargos em comissão pressupõe: a) que os cargos se destinem ao exercício de funções de direção, chefia ou assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais; b) necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado; c) que o número de cargos comissionados criados guarde proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de...

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