Acórdão Nº 5002466-92.2019.8.24.0058 do Terceira Câmara de Direito Público, 24-08-2021

Número do processo5002466-92.2019.8.24.0058
Data24 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5002466-92.2019.8.24.0058/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU) APELADO: MAICON CLEBER LINZMEYER (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de São Bento do Sul, Maicon Cleber Linzmeyer ajuizou ação acidentária contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, sustentando que, em virtude de acidente de trabalho ocorrido em meados de 2011, sofreu grave lesão em seu membro inferior direito, com lesão da fíbula distal e tíbia direita; que, em face da lesão, o INSS implantou o benefício de auxílio-doença por certo período, cessando seus efeitos em 21.10.2011; que, todavia, em decorrência da lesão suportada, encontra-se incapacitado para o exercício de suas funções, razão pela qual requereu a concessão do benefício de auxílio-acidente.

Citado, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contestou sustentando que não é devido qualquer benefício porque, de acordo com a perícia técnica, o autor não está incapacitado temporária ou definitivamente para o trabalho; que o benefício acidentário somente será devido se a perícia médica constatar a redução da capacidade laborativa do segurado.

Os argumentos expendidos na contestação foram impugnados.

Foi deferida a realização de prova pericial e nomeado o perito. O laudo foi juntado e as partes sobre ele se manifestaram.

Sentenciando, o digno Magistrado julgou procedente o pedido formulado na inicial, condenando o INSS ao pagamento do benefício de auxílio-acidente a partir do cancelamento do auxílio-doença, excluídas as parcelas atingidas pela prescrição quinquenal. Condenou-o, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor das parcelas vencidas (Súmula 111 do STJ).

O INSS apelou arguindo, inicialmente, a ausência de interesse processual de agir, frente à inexistência de requerimento do benefício na esfera administrativa, em face do transcurso do prazo de mais de 5 anos entre o cancelamento do benefício e o ajuizamento da ação. No mérito, disse que em decorrência da afetaçã, para julgamento pela sistemática de recursos repetitivos do Tema 862, o feito deve ser sobrestado até a decisão sobre a matéria.

Após o oferecimento das contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Da preliminar de ausência de interesse de agir

A matéria relativa à indispensabilidade do prévio requerimento administrativo, nas ações previdenciárias e acidentárias, para a configuração do interesse de agir, foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, com repercussão geral, quando do julgamento do Recurso Extraordinário n. 631.240/MG (Tema 350), de relatoria do eminente Ministro Roberto Barroso que firmou a seguinte orientação vinculante:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.

Extrai-se do acórdão que o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos da decisão proferida, afastando a exigência do prévio requerimento administrativo em alguns casos, entre eles a hipótese de quando o autor ajuíza demanda objetivando o restabelecimento de benefício ou concessão de outro benefício mais vantajoso ou sequencial. Veja-se:

"As principais ações previdenciárias podem ser divididas em dois grupos: (i) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão etc.); e (ii) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidade mais vantajosa, restabelecimento, manutenção etc.)".

Observa-se, então, que, em face da modulação, as ações protocoladas após o julgamento do RE n. 631240/MG (3.9.2014), obrigatoriamente devem vir acompanhadas do requerimento administrativo, pois as regras de transição aplicam-se apenas às demandas anteriores que ficaram sobrestadas.

E como o segurado ajuizou a presente demanda após o julgamento do recurso representativo, não se aplicam as regras de transição estabelecidas no julgamento do RE 631.240/MG. A determinação para que o autor seja intimado para dar entrada no pedido administrativo no prazo de 30 dias somente se aplica às ações ajuizadas até 03.09.2014 (julgamento do recurso extraordinário), de modo que, protocolada a presente demanda em período posterior, não se pode falar na aplicação da fórmula de transição instituída.

Nesse sentido retira-se do julgado:

PREVIDENCIÁRIO. REEXAME PARA JUÍZO DE ADEQUAÇÃO (ART. 1.030, II, DO CPC). PEDIDO DE RESTABELECIMENTO/CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL E EXTINÇÃO DO FEITO ANTE A AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO ATUAL. SUPOSTA CONTRARIEDADE AO POSICIONAMENTO FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUTOS DEVOLVIDOS A FIM DE QUE SE PROMOVA A INTIMAÇÃO DO AUTOR PARA DAR ENTRADA NO PEDIDO NO PRAZO DE 30 DIAS. DESNECESSIDADE. MEDIDA QUE SE APLICA SOMENTE ÀS AÇÕES AJUIZADAS ATÉ 03.09.2014. ACÓRDÃO EM CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DECISÃO REFERENDADA (AC n. 0305405-85.2016.8.24.0018, de Chapecó. Relator: Desembargador Sérgio Roberto Baasch Luz).

No caso dos autos, verifica-se que efetivamente não foi levado ao prévio conhecimento do ente previdenciário, por meio de requerimento administrativo, o atual quadro de saúde do obreiro.

Por isso, em suas razões recursais o INSS alegou a ausência de interesse processual do autor, porque não formulou prévio requerimento administrativo.

Sem razão o Órgão Previdenciário.

Primeiro porque, em sua contestação, o INSS sustentou a ausência de direito da parte autora ao benefício, o que significa que, tivesse ele sido requerido administrativamente, por certo teria sido negado.

Evidenciada a resistência da autarquia, em Juízo, ao pleito do segurado, considera-se presente a condição da ação relativa ao interesse de agir.

Nesse sentido não destoa a jurisprudência desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SINISTROS DE TRABALHO OCORRIDOS NOS ANOS DE 1998 E 2016. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO INSS. ALEGADA FALTA DE INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. PRETENSÃO RESISTIDA COM A APRESENTAÇÃO DE CONTESTAÇÃO DE MÉRITO. PERITO JUDICIAL QUE RECONHECEU A REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL DO DEMANDANTE. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO ACESSO À JUSTIÇA, DA EFETIVIDADE E DA ECONOMIA PROCESSUAL. APELO DESPROVIDO.(TJSC. Apelação Nº...

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